“Yoga não é uma religião”: Entrevista com a sócia-proprietária do Yoga Shala, Suêile Lima 

Repórter: Anna Maria Fonseca e Valdeíres Ferreira

Fotos: Acervo pessoal

 

A Liberté Yoga Shala, inaugurada em agosto de 2016 por duas parceiras que tinham como propósito levar bem-estar aos seus alunos, Suêile Lima, professora de yoga e formada em psicologia; e Lorena Nascimento, professora de yoga, formada em turismo e dança. Começaram a partir do amor pelo movimento, físico e mental, assim, nasceu o Liberté Yoga Dança e Terapia, que com o tempo tornou-se mais que uma ideia de proporcionar qualidade de vida e sim um projeto que se transformou no Liberté Yoga Shala, com foco exclusivo no yoga Hatha Vinyasa e Ashtanga.

Dois métodos descobertos a partir do amor pelo yoga. O Hatha Vinyasa yoga é o movimento atrelado à respiração e o Ashtanga yoga é a respiração juntamente com um conjunto progressivo de posturas que ajuda a desintoxicar e purificar o corpo. Esses métodos são utilizados por Lorena e Suêile no Liberté Yoga Shala, que trabalham o yoga baseando-se em uma filosofia de vida, em como o yoga atua na vida das pessoas, pois naturalmente vai ocorrendo a desintoxicação de elementos que trazem um mau ao corpo.

As parceiras têm como objetivo concretizar o plano de abrir franquias, expandindo seu negócio em outras cidades. Para as proprietárias e professoras de yoga em Imperatriz – MA, as práticas estão em constante evolução e é necessário que os movimentos sempre sejam aperfeiçoados conforme suas evoluções, por isso o espaço que antes possuía aulas de dança, agora trabalha apenas com o yoga, para que haja um melhor aproveitamento das práticas exercidas.  O Yoga Shala possui um público majoritariamente feminino, pois conforme Suêile Lima na cidade de Imperatriz, ainda há preconceito em homens praticando yoga.

Mesmo trabalhando corpo e mente, ele também traz benefícios que ajudam no tratamento de transtornos mentais como ansiedade, depressão e ajuda no tratamento de doenças crônicas. Além de proporcionar qualidade de vida, pode ser praticado por qualquer pessoa, independentemente da idade e do físico, pois segundo Suêile Lima “o yoga é para todo mundo, nós temos alunos que são transplantados, cardíacos, renais, tem pessoas com problemas musculares que ficam de cabeça para baixo, então tudo isso é uma questão de adaptação e de conhecer quem você é.”

 

A seguir, confira a conversa de uma das proprietárias, do Yoga Shala, com o Imperatriz Notícias.

 

Imperatriz Notícias: O yoga baseia suas premissas éticas no hinduísmo? Há alguma relação do yoga praticado no Yoga Shala com essa religião?

Suêile Lima: Yoga não é religião, não tem nada a ver.  Algumas religiões podem se beneficiar dos conhecimentos, das práticas que são feitas dentro do yoga, até porque o yoga não é só prática física, ele envolve muito mais do que isso. O Liberté Yoga Shala não tem nada a ver com uma religião. O que nós temos é a ligação com a tradição do yoga, da filosofia de vida, acho isso bem importante, porque fica um pouco disso, a maioria das pessoas acham que o yoga é religião, e fica atrelado especificamente a uma religião e principalmente ao Hinduísmo. Então, é uma coisa que a gente sempre desmistifica bastante, yoga não é religião, é uma filosofia de vida. E qualquer outra coisa pode utilizar isso, religiões, medicina, que podem se beneficiar.

“Todo mundo acha que todo praticante de yoga tem obrigatoriedade de ser vegano, ser vegetariano, ser todas as nomenclaturas que as pessoas têm usado ultimamente. Não tem nada a ver uma coisa com a outra, não existem proibições, não existem regras, não existem preceitos para que você pratique ou seja um praticante de yoga”

 

IN: O yoga possui éticas práticas que proíbem a violência a qualquer ser vivo para que no final haja purificação completa do ser. Vocês incentivam os alunos a seguirem práticas como o veganismo que possui a mesma ideologia da não violência contra os seres vivos?

SL: Todo mundo acha que todo praticante de yoga tem obrigatoriedade de ser vegano, ser vegetariano, ser todas as nomenclaturas que as pessoas têm usado ultimamente. Não tem nada a ver uma coisa com a outra, não existem proibições, não existem regras, não existem preceitos para que você pratique ou seja um praticante de yoga. Nada e nenhuma dessas questões definem se você é bom ou mau. Vamos levar em consideração o que tem dentro da filosofia do yoga, é por base o que nós chamamos de Yamas e Niyamas, são preceitos éticos com a sociedade moral e com você mesmo, com o ser humano. Dentro dos Yamas, que é a base, nós temos Ahimsã que é a não-violência, mas a não-violência não é simplesmente, “ah, eu não mato nenhum animal, então eu sou o cara”, não. A não-violência abrange mais do que isso, é você aprender ter um respeito com você, com aquilo que você acredita, com quem você é, com as suas limitações, é você respeitar em primeiro lugar quem você é, a partir daí você começa a respeitar aqueles que estão ao seu redor. Realmente, o não se alimentar de animais também envolve uma Ahimsã, a não-violência, mas isso não é uma obrigatoriedade, são escolhas. E na verdade são ideias que você vai ampliando no seu ser, aos poucos você vai compreendendo e você é totalmente livre. Agora eu não quero comer nenhum tipo de animal porque eu estou tentando praticar essa não-violência, mas não são obrigatoriedades, é muito melhor que você respeite o ser como um todo, principalmente você, do que apenas seguir padrões sociais que são impostos.

 

IN:  “The Universe Within” ou “O Universo Dentro” é um lema que representa como o Yoga Shala trabalha o autoconhecimento nos praticantes do yoga. Qual a relação dos exercícios de posturas do yoga com o autoconhecimento do “Universo Dentro”?

SL: Toda a relação, na verdade. O sutil precede o denso, então não tem como você acessar um autoconhecimento, o seu interior, se você não passa pelo grosso, se você não passa pelo corpo. Então, às vezes as pessoas chegam para praticar e não conseguem nem tocar nos pés, isso não tem nada a ver com flexibilidade física, tem a ver com mental, com a história de vida, com pesos, com couraça que essas pessoas carregam ao longo da vida, ao longo de um tempo, tudo isso vai se incrustando no corpo. Para você acessar o que todo mundo procura no yoga, as pessoas falam “ah porque yoga é relaxante”, mas para você chegar nisso precisa passar por toda aquela couraça que foi formada ao longo da vida, por toda aquela estrutura rígida que fica ali cravado no seu corpo. Para acessar esse autoconhecimento, precisa passar por todo esse processo. E todo ser humano é um universo por si só, por isso a gente trabalha com “The Universe Within”, que é “O Universo Dentro”, e não adianta você querer olhar para o mundo aí fora, e querer saber altas coisas, se você não consegue olhar nem para o seu próprio mundo, se não consegue parar os monstros e ao mesmo tempo não consegue se vangloriar, dar limites, até porque onde há luz, há trevas e está tudo bem.

IN: Quais métodos ajudariam as pessoas a expandir sua consciência, evoluir e viver uma vida mais autêntica? Quais os exercícios do yoga e as práticas que ajudam as pessoas a chegar nessa evolução?

SL: Esse caminho, em busca da evolução é um pouco súbito. Estamos sempre em processo de evolução, todos os dias que vivenciamos é um processo de evolução, cada detalhe, cada respiração que você dá é uma evolução. O yoga trabalha com vários aspectos da filosofia de vida, não temos apenas a prática de Asanas, posturas, que é o que a maioria das pessoas veem, que são as práticas que todo mundo acha lindo e maravilhoso, mas não apenas isso, existe todo um trabalho de Pranayama, que são trabalhos com a respiração, que é a base de tudo. Existem também vários trabalhos que envolvem a alimentação, ingestão, e não só dentro do yoga, mas dentro de toda essa tradição milenar, que se chama Vinis, mas também existe o trabalho com Mantras, que são sonorização em que acaba facilitando o processo de identificação. Existem várias coisas que podem ser feitas, a caminho de um melhor ser humano, talvez eu não usaria evolução, mas a caminho de descobertas, para você mesmo e depois para os outros.

IN: A organização mundial da saúde já detectou, em um relatório de 2018, que o Brasil é o país com maior número de pessoas com ansiedade. A prática do Yoga pode ajudar a prevenir e combater a ansiedade. O espaço Yoga Shala desenvolve aulas terapêuticas para pessoas ansiosas? Quais os métodos que o yoga se baseia que podem ajudar no tratamento da ansiedade?

SL: O yoga por si só já é uma terapia e eu falo porque eu sou psicóloga, trabalho diretamente com isso e acredito nesse movimento e vejo a resposta. Então não é uma aula específica, porque o yoga por si só já é terapêutico, não existe a necessidade de diferenciar essas pessoas, o yoga é para todos sem exclusão, na verdade é um processo de inclusão, todo ser humano é ansioso por natureza, claro que em alguns momentos da vida isso se torna um pouco patológico no sentido de quantidade, de não entrarmos em contato com quem nós somos, mas não existe isso de ter aula terapêutica específica, o yoga trabalha com todas essas questões. No Shala chegam várias pessoas com essa queixa de “ah, eu sou ansioso, eu estou sofrendo de depressão e quero fazer yoga”, eles são pessoas que vão aprender a respirar como qualquer outra, que vão trabalhar esse processo de respiração e passando pelo corpo ele pode se beneficiar muito mais, porque é um caminho que vai além do físico, então a gente trabalha com esses aspectos.

Lorena (azul) e Suêile são sócias no espaço que oferece yoga em Imperatriz

 

IN: Com a pandemia, transtornos como ansiedade e depressão foram engatilhados em algumas pessoas, e como você explicou o yoga por si só já é terapêutico, mas existem algumas práticas específicas para auxiliar mais ainda nesses tratamentos, para retirá-los dessa zona de ansiedade e depressão?

SL: Não é o yoga que vai tirar essa pessoa dessa zona, é a própria pessoa que vai escolher sair ou não. O yoga é uma ferramenta como várias outras que existem, mas nenhuma delas vai fazer por você o que você mesmo pode fazer, então é uma responsabilidade muito grande jogar para o yoga “ah eu tô fazendo yoga eu não vou ficar ansioso”.  Eu como uma profissional que trabalha nessa área não sei bem se foi a pandemia que trouxe à tona essas questões, o que trouxe à tona essas questões é que as pessoas ficaram mais tempo com elas mesmas, então se assustaram com quem elas são e não estão sabendo lidar com isso, porque a sociedade cobra uma perfeição do ser humano. Então que ser humano perfeito eu seria, se eu olho para mim e digo “ótimo, realmente eu sou ansioso eu sou mais nervoso”. A pandemia só ajudou as pessoas a olharem para si e isso é muito assustador, porque a gente não faz isso, as pessoas mal conseguem se olhar no espelho, imagina olhar para dentro e descobrir que existem sombras e que está tudo bem. Então o yoga nesse quesito é mais uma ferramenta e como toda ferramenta ele não vai fazer o trabalho sozinho, é preciso que você persista, que acredite em si mesmo, porque o mais difícil é você dar o primeiro passo, depois você consegue observar o caminho e consegue ver que há limitações e você precisa de paciência para lidar com essas limitações.

 

IN: As pessoas chegam para praticar yoga e com o tempo já estão no ritmo, praticando as posições nas aulas. Você consegue ver uma mudança nas pessoas, de quando ele chega para quando ela já está no ritmo? Qual a principal mudança, em questão de seu caráter, como ela se sente?

SL: A principal mudança que a gente vê é criar espaço, vai quebrando essas barreiras físicas e criando espaço. Quando cria espaço, você consegue olhar mais ao seu redor, consegue respirar para ter certas atitudes, consegue olhar para si próprio com mais paciência, amor e tudo isso vai “respingar” na vida cotidiana. O que eu vejo muito nos nossos alunos e até em nós mesmos, pois somos eternas alunas, a gente está sempre buscando com nossos professores. Inclusive, uma dica para as pessoas que vão procurar o yoga, toda vez que for procurar o yoga pergunte quem é o professor do seu professor, todo professor precisa ter um professor de yoga, ele precisa estar em constante aprendizagem, por que são seres humanos, não somos perfeitos, então porque não está sempre abrindo espaço para o novo, para novas concepções. Então, a maior mudança que eu vejo é essa, são espaços criados, para que a gente possa olhar para o mundo de uma forma diferente. É gratificante ver quando os alunos chegam falando, “nossa, depois do yoga, tudo mudou”, e realmente, tudo muda. O yoga em si, é uma meditação em movimento, e as pessoas separam, elas falam “meditação e o yoga”, gente o yoga é meditação.

 

IN: Por que você trouxe para o seu espaço esses dois métodos Hatha Vinyasa e Ashtanga? Porque você escolheu eles e não outros?

SL: Eu conheci a Lorena através da dança afro e a gente se tornou bem amigas, eu era aluna dela de afro e depois a gente abriu um grupo de dança afro aqui em Imperatriz, foi bem em uma época que eu queria abrir um consultório em outro lugar, ela estava querendo dar aula de dança em outro. Então a gente juntou as ideias e fomos abrir um espaço, na época eu estava bem doida do juízo e ela estava começando a dar aulas de yoga. E fui experimentar e fazer aula de yoga com ela também, nunca mais parei, todo dia eu fazia aula, então na época foi o meu rivotril. Inclusive eu emagreci 14 quilos praticando yoga, na época eu nem estava pensando nisso, mas como minha prática estava ficando intensa meu corpo foi se acostumando. Logo, a Lorena conheceu uma professora de Hatha Vinyasa, Camila Reitz, foi fazer uma formação com ela e logo depois abrimos o espaço, fomos praticando o Hatha Vinyasa, logo em seguida eu fui fazer a formação também em hatha vinyasa. A professora Camila foi quem fundou esse método, então nós tivemos acesso à fonte, ela é uma professora de muito renome, respeito e tem um carinho com a tradição, não é uma pessoa que quer ser o “bambambam professor”. Dentro disso a Lorena conheceu o Ashtanga yoga com uma aluna de Hatha Vinyasa, ela falou que era aquilo que ela queria para vida dela e consequentemente me carregou junto e aí a gente começou, realmente eu vi que no Ashtanga yoga eu me encontrava mais, pela forma como é dada as aulas, pela forma da prática, não que eu não goste do Hatha Vinyasa sou apaixonada, tanto que a gente manteve aqui, mas a minha prática e a da Lorena pessoal é a do Ashtanga. E nós resolvemos manter os dois métodos no espaço para tentar abraçar várias características e as personalidades das pessoas.

IN: Mantra é uma forma de meditação que usa um som, uma palavra ou uma frase. Quais mantras são mais utilizados nas aulas? Qual a importância e benefício do mantra no yoga?

SL: Que legal vocês falarem do mantra, até porque existe um preconceito em torno disso, por essa razão as pessoas não entendem o que está sendo dito e elas acham que também tem a ver com religião. Mantra é uma forma de meditar, sonorização é uma forma de alcançar níveis mentais e cerebrais que esse tipo de som consegue muito mais que outros tipos, é tanto que a linguagem usada no mantra é o sânscrito, e se você cantar o mantra traduzido para o português parece que ele perde a profundidade e o sentido, então isso é muito importante porque o som faz toda a diferença nesse processo. Lá no nosso espaço, cada método de aula no yoga tem um mantra que eu acompanho, um mantra universal que a gente fala que é um som de conexão entre o intelectual e o emocional, é como se fosse uma conexão entre a razão e a emoção, é como se fizesse uma ponte que é o Om, que é bem conhecido, mas no Hatha Vinyasa tem alguns mantras de abertura que a gente usa, que é o guru mantra, é um mantra de reverência ao mestre, mas não ao outro e sim ao mestre e guru que existe dentro de você, você pode ser um guru, você tem capacidade de olhar para os seus passos e inserir luz ali naquele caminhar, então a gente usa muito esse mantra. No Ashtanga yoga existe o mantra inicial que é um agradecimento a toda a linhagem de professores, agradecimento a quem criou o método e um agradecimento do método como um antídoto para o veneno que a sociedade implanta no ser humano, é uma forma de desintoxicar e limpar esses venenos, seja por um dia mau vivido ou emoções mau vividas   e também existe o mantra final que é de paz, ele deseja paz para todos os seres, ele é bem bonito.

IN: O yoga ajuda no tratamento de doenças crônicas como hipertensão. Como que o yoga auxilia nesse tratamento?

SL: O yoga, principalmente o método que a gente trabalha, o Vinyasa, é o que a gente chama de respiração junto com o movimento. Então todos os males da população tanto físico quanto mental acontece porque a gente não sabe respirar, uma pessoa que é hipertensa, olhando os aspectos emocionais, é uma pessoa que segura bastante as emoções e o corpo vai sofrendo com esses acúmulos, e por isso algumas pessoas ficam mais propensas a desenvolver hipertensão, diabetes, câncer, enfim uma série de questões porque a gente não sabe respirar e respirar é vida. Quando você respira de verdade, você consegue colocar tudo para fora, você consegue vivenciar cada emoção, porque tristeza é bom, raiva é bom, angústia é bom, tudo isso é bom e a gente precisa sentir, essas pessoas fogem e acumulam esses sentimentos, então tudo isso vai adoecendo o corpo. Dentro da prática do yoga, principalmente nessa prática física de postura, você vai entrando em contato com esse universo que você não conhece e vai ter a oportunidade de escolher o que você quer fazer, então dentro do yoga uma principal ferramenta que existe é a respiração, a gente aprende a respirar, aprende a ouvir o que o corpo está dizendo, aprende a se comunicar com esse corpo, com essas emoções, aprende a lidar com elas, então o yoga ajuda nessa forma. Por isso que eu falo que o yoga é para todo mundo, nós temos alunos que são transplantados, cardíacos, renais, tem pessoas com problemas musculares que ficam de cabeça para baixo, então tudo isso é uma questão de adaptação e de conhecer quem você é.

 

BATE BOLA

 

IN: O que é o yoga para você?

SL: Yoga para mim é vida.

IN: Qual o seu melhor lugar para relaxar?

SL: Dentro de mim.

IN: Qual sua cor favorita?

SL: Azul.

IN: Qual sua posição de yoga favorita?

SL: Kurmasana.

IN: Qual sua aula preferida no Yoga Shala?

SL: Aula da Lorena de Ashtanga.

IN: Qual sua comida favorita?

SL: Risoto que a Lorena faz.

IN: Uma música preferida?

SL: Simples assim- Lenine.