“Venho de escola pública, sempre estudei em escola pública”: entrevista com João Gomes,  o doutor mais jovem do Brasil

Lyandar Gomes e Sthefany Gomes

 

Doutor e Mestre em Ciência dos Materiais pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), graduado em Química pelo Instituto Federal do Ceará (IFCE), João Gomes de Oliveira Neto nunca quis pouco em sua vida profissional. Vindo do interior do Ceará, em 2017, o doutor mais jovem do Brasil ganhou uma bolsa mestrado e se mudou para Imperatriz.  Saiu de casa com a ajuda da família, decidido a alcançar suas metas, João levou consigo foco, disciplina e determinação.

Aos 24 anos de idade o pesquisador defendeu a tese do seu doutorado no dia três de novembro de 2022 e teve como linha de pesquisa “Obtenção e caracterização das propriedades físico-químicas de saís duplos sulfatados para uso em dispositivos ópticos e termoquímicos”. Nela João sintetiza cristais inorgânicos e nesses cristais ele caracteriza as propriedades estruturais, vibracionais, eletrônicas e térmicas. Depois faz um teste para verificar se são aplicáveis em dispositivos ópticos, como: centros luminescentes, filtros de luz UV, entre outros.

Em entrevista ao Imperatriz Noticias, João Gomes falou sobre sua trajetória nos estudos em meio aos desafios da educação nacional. Relata também seus futuros planos de ingressar em um pós-doutorado.

 

Imperatriz Notícias: Como você se sente sendo o doutor mais jovem do Brasil?

João Gomes: A ficha ainda não caiu. É mais um título para os meus amigos. Nunca me atentei a esse número. Só procurei ser um Doutor diferenciado no quesito de aproveitar e em produzir. Dar algum retorno na sociedade, porque acho que esse é nosso papel: estudamos para retribuir com algo. Como consequência veio eu sendo o mais jovem do Brasil e me sinto feliz, porque é o símbolo de uma grande conquista para os meus pais, amigos. Porém, às vezes tenho a impressão de que não posso errar que tenho que andar na linha e isso me causa certo medo. Mas a vida é um combate, né?

N.: Quando você começou a ter essa rotina de se policiar a ter mais foco nos estudos?G.: Eu não vou saber exatamente, como eu falei, nunca fui nerd, mas sempre fui organizado em relação aos meus estudos, sempre tratei como prioridade, desde o fundamental. Desde pequeno, já visava o que eu queria depois e normalmente, o depois exigia notas altas, bom desempenho. Então o que eu pudesse fazer pra atingir essas metas, eu faria.

N.: Como foi para você em relação ao acesso à educação? Tendo em vista que em nosso país a educação deixa muito a desejar.G.: Sim, a educação do nosso país deixa muito a desejar. Eu vim do interior do Ceará e ter acesso a uma graduação que é muito bem avaliada pelo MEC, com um corpo docente com cerca de 95% de doutores. Eu considero uma educação muito boa e de qualidade, se você fizer uma pesquisa vai ver que a maior parte dos estudantes que entram no ITA e vão para fora, são os do Ceará. Então, apesar da educação ainda ser muito precária, o meu acesso foi bom. Venho de escola pública, sempre estudei em escola pública e isso me fez alcançar muitas oportunidades ao longo da minha vida.

N.: Como é sua relação com sua família, eles sempre te incentivaram a estudar?G.: Sou filho de pais analfabetos. Minha família sempre me motivou a estudar. Meu pai queria que eu fosse agrônomo, minha mãe cardiologista. Confesso que eles não eram muito a favor de eu ser professor, mas sempre deixaram claro que o que eu escolhesse, me apoiariam. Para mim eles são meus ídolos, minhas inspirações e eu espero poder dar retorno da mesma forma que eles contribuíram para o meu crescimento.

N.: Como você manteve o foco, levando em conta os desafios da juventude?

G.: Sou uma pessoa normal. Jogo vôlei, malho, gosto de sair, não bebo, mas acompanho os amigos em barzinhos. Vejo vários vídeos de viagens, salvo, porque quero fazer todos. Como sei que sou pobre, ser pobre é como se fosse uma âncora para mim, me motivo a estudar para ser bem sucedido e ajudar minha família. Isso me ajuda a manter o foco. E depois da pandemia, após tantas mortes, estar vivo me faz pensar que tenho que contribuir para a sociedade de alguma forma.

N.: Depois de tudo, você está onde quer? Ou almeja mais?

G.: Nessa vou ser sincero com vocês, eu acho que sim. Como ser humano todo mundo tem aquele sonho que as pessoas acham graça, que acham bobagem. Mas são esses super sonhos que acabam motivando a gente. Não estou onde eu queria, porque eu queria ser ator da Netflix, um cineasta da Marvel, da DC Comics. Só que infelizmente, é bastante complicado em relação a vários fatores. Mas em relação a minha situação profissional e carreira acadêmica, eu sou muito feliz. Depois de não ter conseguido isso de ator e tal, por outro lado sempre gostei de estudar e nunca estudei por obrigação. E eu almejo muito mais, não quero parar e nem vou. Sou novo ainda, dá pra aproveitar muita coisa.

N.: Qual a sua dica para jovens e adolescentes, algo que te ajudou bastante e que você gostaria de ter ouvido?

G.: Eu era muito aéreo. Só descobri no terceiro semestre que existia Bolsa de Iniciação Científica. Os alunos que se destacam têm a oportunidade de pleitear essa bolsa e para mim isso caiu de paraquedas. A partir daí, me apaixonei pelo curso. E algo que recomendo para todo ser humano é fazer terapia. Às vezes a gente se importa com muita coisa, quer desistir por causa de uma nota baixa… então, a terapia deixa sua mente forte e alguém com a mente forte, consegue superar qualquer coisa. E meu conselho final seria pedir para os jovens traçarem suas metas, objetivos, se manterem focados, firmes e fortes.

N.: Quais os planos futuros?

G.: Agora eu quero fazer um Pós-Doutorado, estudar para concurso e também queria muito trabalhar no turno noturno dando aula em Universidade particular. A fim de se manter no Maranhão, mas vou deixar para ir atrás em janeiro.