Medo impede mulheres de registrar denúncia sobre violência obstétrica em Imperatriz

Texto de Ana Letícia

 

 

 

 

O medo de sofrer represálias e ter de ser atendida novamente pelos profissionais denunciados impede as mulheres de Imperatriz de denunciar maus tratos no atendimento durante a gravidez. Esta é a opinião da delegada Sylvianne Lenira, a Delegacia Especial da Mulher (DEM) de Imperatriz. Segundo ela, embora acredite que existam casos, não recebeu nenhum tipo de denúncia de mulheres que tenham sofrido violência obstétrica por aqui.

A violência obstétrica é quando alguns profissionais de saúde tratam mal uma parturiente, com agressões verbais, ou ações que a coloquem  em situação desconfortável, como privar a gestante de ter um acompanhante, métodos de aceleração do parto, procedimentos cirúrgicos desnecessários, deixar de oferecer medicamentos para dor, entre muitas outras. “Hoje, evidências mostram, cientificamente falando, que as emoções positivas ou negativas de uma mãe grávida, vão repercutir sobre o desenvolvimento de seu concepto, ou seja do feto”, explica Itamar Fernandes.

Experiência dolorosa

A pedagoga Soraima Santos sentiu na pele o que é a violência obstétrica. Ela conta que sentiu fortes dores e sangramento em suas 8 semanas de gestação. Acabou perdendo o filho e mais tarde descobriu que havia uma chance de ter desenvolvido o bebê. Logo ao chegar no hospital, foi atendida bruscamente pela enfermeira, que perguntou o que ela estava sentindo. Ela relatou as fortes dores e sangramentos e foi logo repreendida pela profissional, que a acusou de tomar medicação para perder o filho. Ela usou a frase ‘essas rapariga enche o rabo de remédio, aí chegam aqui chorando’”, lembra.

Ao ser examinada, o primeiro médico que a atendeu lhe contou que Soraima já estava com oito semanas e não tinha gerado nenhum feto, e que ela deveria realizar a curetagem. Foi só depois de tomar a medicação para dilatar e expelir o que viria a ser o feto, que a médica da noite lhe contou algo crucial. “Ela disse que tem casos que com mais semanas pelo menos três ou quatro semanas a mais seria possível diagnosticar se realmente eu teria condições de gerar o bebê”, conta a mulher.

A pedagoga conta que na época era muito jovem e não conhecia seus direitos, e como passou pelo problema sozinha, acabou não denunciando as agressões que sofreu. “Eu não tinha noção, não tinha conhecimento de que eu estava passando por uma violência”, justifica.  Para ela, não basta ter uma boa estrutura, é necessário o cuidado dos profissionais para com a paciente, um olhar mais humano. “Tem hospitais que são bem equipados, têm uma boa estrutura, mas falta humanização. E você encontra poucas pessoas que ainda mantem esse perfil na medicina”, protesta.

Violências pré e pós

O problema pode acontecer antes, durante e depois do parto. A pedagoga Fabianna Mistty conta que foi vítima de violência obstétrica na primeira gravidez. Na sala do pré-parto, Mistty presenciou enfermeiras gritando com outras pacientes, usando termos pejorativos:“tá vendo? Na hora de fazer é bom né?”, e eram rapidamente repreendidas pelas enfermeiras mais experientes: “mulher, para, tá sendo um momento difícil, tu já teve menino, tu sabe” e elas replicavam: “Ah mas eu não tive essa frescura toda não”, e assim as enfermeiras ficavam se questionando na frente das próprias pacientes.

Pouco depois de dar à luz a seu primeiro filho, a pedagoga passou por um momento constrangedor ao ouvir um comentário de seu médico. “Então ele disse: ‘acabou com as partes da mãe dele’ e todos ficaram sorrindo. Na hora eu não levei tanto em conta. Foi constrangedor, mas na hora foi um alívio porque eu estava sentindo dor, só depois eu fui parar pra pensar nisso”, lamenta.

Mistty não chegou a denunciar nenhum dos profissionais, mas hoje em dia faria diferente, e que é importante, além de procurar saber e entender quais são seus direitos, garanti-los e fazer valer, colocar em prática.

Um olhar mais humano

Para a enfermeira da Casa da Gestante de Imperatriz, Adonira Santos, o passo mais importante no relacionamento com a paciente é o saber olhar e ouvir. “Claro, você tranquilizando a mãe, automaticamente o bebê também fica mais calmo, porque a agitação dela, a preocupação dela, a pressão dela aumentando, e qualquer alteração orgânica automaticamente vai influenciar no bebê”, conta a enfermeira.

Como denunciar

As denúncias podem ser feitas na Delegacia Especial da Mulher (DEM), pelo telefone através dos canais Violência Contra a Mulher – 180 e disque-saúde – 136. Outra opção é que a vítima procure a Defensoria Pública, ainda que o atendimento médico tenha sido feito em um hospital privado.