Jogos analógicos na atualidade: as transformações nos meios digitais

Da origem dos jogos analógicos ao mercado lucrativo dos games

 

Por Janayna Sousa, Maria Eduarda Anchieta, Rayane Castro e Saiury Lima

                                                          Jogos digitais e analógicos. Fotos: Rayane Castro

 

Os jogos analógicos apresentam seus primeiros registros aproximadamente em 5000 a.C., no Oriente Médio, nas regiões do Egito e Mesopotâmia. Os jogos já eram citados através de regras e significados pertencentes a esses povos, baseados em determinações estratégicas e principalmente como forma de entretenimento ou até mesmo sorte. No Brasil, a cultura indígena criou um jogo denominado como “jogo da onça”, com traços muito semelhantes ao jogo de damas, com a captura de peças e o impedimento de movimentação adversária.

Tabuleiro egípcio antigo do jogo Senet de 3.100 e 3.500 a.C. Foto: site lost-token.

A difusão dos jogos analógicos ocorreu em grande escala com a Revolução Industrial, no século 19. Novas versões e modelos foram fabricadas com foco na escolha que as pessoas mais consumiam, como por exemplo, os jogos de xadrez.

Além das adaptações físicas como o design e novas versões, o desenvolvimento tecnológico possibilitou a entrada dos jogos analógicos ao meio digital no ano de 1990. O aumento das versões virtuais expandiu durante a pandemia da COVID-19, devido ao distanciamento social imposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo com dados fornecidos pelo site “Chess.com” (site conhecido por possibilitar o aprendizado para as pessoas que tem interesse em jogar os respectivos jogos de tabuleiro), em 2021 o número de acesso era de 300.000 a cada semana. Após as adaptações e atualizações dos games, os números registraram ainda mais acessos por fornecerem possibilidades de interações com pessoas em todos os lugares do mundo ou até mesmo robôs. Sites semelhantes ao “Chess.com” obtém cada vez mais espaço no cotidiano dos indivíduos.

 

Qual versão de jogos é melhor: analógico ou digital?

A resposta para essa a questão é relativa, já que ambos apresentam características únicas e uma não toma o espaço da outra. Embora os jogos de tabuleiro também oferecerem histórias, onde o jogador é lançado em um novo mundo, é uma experiência diferente dos jogos digitais.

Jogadores na Savepointitz. Foto: Arquivo Pessoal.

Jogos aproximam pessoas e ajudam a criar um ambiente descontraído e divertido, perfeito para “escapar” da realidade cotidiana. O foco de uma luderia (estabelecimento para prática de jogos de tabuleiro), é criar um mundo onde as pessoas possam interagir e se sentirem mais livres. É possível observar esses comportamentos na luderia Savepointitz, em Imperatriz. Para o proprietário desse estabelecimento, Guilherme Souza, “o universo dos jogos é apaixonante, é maravilhoso. Eu prefiro algo mais interativo, eu gosto de ver as pessoas não só jogando, mas conversando e se divertindo”.

Luderia Santo Ludo. Foto: Rayane Castro.

A luderia Santo Ludo, localizada em São Luís, denomina seus clientes de aventureiros e os proporciona jogos que englobam qualquer idade e gênero. Os funcionários do local, Hugo da Silva e José Inácio enfatizaram que a preferência por jogos analógicos no estabelecimento serve para aproximar as pessoas e liberar a criatividade durante os jogos, algo que os digitais não proporcionam devido a todas as ações serem programadas.

 

A relação entre os jogos e jogadores

Com o passar dos anos os games foram inclusos nas vidas das pessoas, adquirindo vários aspectos como uma opção de trabalho, terapia pessoal e até mesmo aprendizados que estimulam a parte cognitiva e motora do ser humano. Para o professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), membro do grupo de pesquisa “Games, Gambiarras e mediações em rede”, José Carlos Messias Santos Franco, os jogos ajudam na capacitação e tem o poder de possibilitarem a interação entre os indivíduos. O grupo de pesquisa desenvolve um projeto direcionado para a educação, orienta que existem jogos que ajudam no aprendizado. “Temos o objetivo de inspirar as pessoas a utilizarem a tecnologia não apenas para jogar, mas também para melhorar a formação”, explica o professor.

Muitas pessoas usam os jogos como terapia, um modo de encontrar paz e tranquilidade. É o caso do funcionário da luderia Santo Ludo, Hugo da Silva, um jogador ativo. Ele explica que os jogos fazem parte da sua vida como uma válvula de escape, “é onde eu posso entrar no universo que acho que domino e isso é confortável para mim”, afirma Hugo.

Nessa relação entre os jogos e jogadores surge a seguinte questão: Jogar é algo negativo ou positivo? Conforme mencionado, jogos aproximam pessoas. Porém, esse não é seu único benefício, como também não camufla seu lado negativo. O ponto negativo acontece quando o jogador não possui um retorno financeiro ou prazeroso, e isso interfere na vida pessoal e profissional do indivíduo. Segundo José Inácio, que também é um jogador ativo, “às vezes jogar acaba vindo tão forte que se torna um vício”.

Por outro lado, a parte positiva se encontra no momento em que o jogador passa a tirar proveito daquele hobby, e o jogo passa a ser uma fonte de renda. Isso se confirma devido aos dados de gamers que cresceram nos últimos dois anos (2020 e 2021), período da pandemia. A pesquisa da SuperData de 2021 apresenta que o setor de games cresceu 12% durante esses dois anos, o que gerou uma receita de 126,6 bilhões de dólares para o mercado global.

 

O resultado econômico do setor de games

Ao longo dos anos os jogos analógicos tiveram diversas mudanças, e uma delas é o preço cobrado pelo material. Jogos de tabuleiro tinham valores bem menores, se comparado aos preços vistos atualmente. A inflação atingiu até os jogos que eram mais acessíveis, como xadrez, dama e ludo. Esses são jogos antigos e mesmo assim a busca por eles ainda é constante. O mesmo tabuleiro de xadrez pode ser encontrado por R$180 ou por R$280 reais, dependendo da escolha do estabelecimento comercial. Eles se mantiveram atuais, foram integrados ao meio digital como parte do entretenimento online.

No ambiente digital são utilizadas muitas estratégias para lucrar com os games, como a criação de diferentes tipos de personagens, uma característica própria de cada um, determinado “poder” que só aquele personagem é capaz de ter, uma roupa diferente, entre outras possibilidades. Tudo isso é um meio lucrativo para as empresas, pois para obter cada um desses itens é cobrada uma taxa ao jogador.

“Os jogos estão cada vez mais pesados e a indústria vem buscando atrair os jogadores a gastar com extras por meio de maiores e frequentes inovações” detalha Gyovanna Ketly, 18 anos, jogadora amadora. Essas inovações propostas são motivações para os jogadores comprarem cada vez mais dentro das plataformas. Empresas como a Garena e Epic Games, responsáveis pelos jogos FreeFire e FortNite, respectivamente, utilizam desses meios para obtenção de mais capital.

A 8ª edição da Pesquisa Game Brasil (PGB) realizada 2021 apontou um aumento de 75,8% de pessoas que começaram a jogar durante o período pandêmico. Com os jogos on-line há uma facilidade de se conectar a qualquer momento em um jogo, criando a possibilidade de jogar sozinho e respeitar o distanciamento social imposto pela OMS.

De acordo com o site “O olhar digital”, 63% dos brasileiros gastam dinheiro em jogos online e isso se deve ao fato do público ter o desejo de melhorar suas performances nas competições e para customizarem seus avatares. Porém, 81% dos entrevistados para a pesquisa afirmam que optam pelos jogos gratuitos, mas esses games permitem compras dentro do aplicativo para a melhoria e aprimoramento dos personagens, o que induz os jogadores a comprarem.

“Os jogos que você paga conteúdo dentro, às vezes são coisas que você nem precisa, mas que eles colocam para ser uma interface pessoal, algo próprio seu e você acaba pagando”, declara o jogador amador, Nathaniel Crisostomo, 19 anos. Com os valores cobrados pelas empresas ele reforça, “o que você gasta de dinheiro em quantidades exorbitantes para tentar conseguir algo que você pode não conseguir, porque o jogo é sorte, é algo que não vale a pena”. Devido aos gastos dentro dos jogos, Nathaniel considera que seu perfil no game Genshin Impact poderia valer mais de mil reais, demostrando o quanto se pode gastar nesse meio, sendo por hobby ou por vício.

 

A presença feminina nos jogos digitais

A participação feminina no mundo dos games vem crescendo de forma gradativa. Segundo a 8ª edição da PGB em 2021, 51,5% dos jogadores era do sexo feminino. A entrada das mulheres nesse setor teve repercussão negativa entre alguns amantes de E-sportes (competição de jogos virtuais), porque era um espaço predominante do sexo masculino. O machismo enraizado reverbera nas atitudes dos jogadores e desenvolvedores de jogos com relação as mulheres.

A imperatrizense Gyovanna Ketly faz parte do mundo dos jogos desde os 6 anos de idade. Aos 9 anos já estava inserida no universo dos jogos digitais. Damas, xadrez e dominó são os jogos analógicos que ela costumar praticar. A jogadora relata preconceito as mulheres no ambiente de jogos virtuais. “No meio digital, até mesmo quando há duas pessoas que jogam mal, quando são homens os comentários são específicos à baixa habilidade da pessoa, mas quando é uma mulher há muita diminuição, como se mulheres nunca jogassem bem ou só atrapalhassem. Além de comentários incômodos e ofensivos quando descobrem que você é uma mulher”, afirma Gyovanna.

Gyovanna Ketly jogando League Of Legends. Foto: Arquivo pessoal.

A inserção das mulheres iniciou quando elas percebem que os jogos não deveriam ser direcionados somente aos meninos. Ao se inserirem nesse universo, as mulheres buscam se destacarem no setor com suas habilidades e tem as mesmas intenções que as do sexo oposto, vencer uma partida de jogo seja ela individual ou em grupo.

Participantes do gênero feminino como Nyvi Estephan, 30 anos, jogadora de E-sportes e apresentadora brasileira, estão fazendo história e abrindo portas de reconhecimento para o público dos games, na rede de TV e em aplicativos de streaming, gerando conteúdos e apresentando as habilidades femininas.

 

Reportagem especial produzida para a disciplina Técnicas de Entrevista e Reportagem (2021.2), ministrada pela professora Nayane Brito.