Funcionários descrevem como cuidam do Cemitério Campo da Saudade

Sepulcrário atrai muitos visitantes no Dia de Finados, mas rotina é diária

Camyle Macatrão

Grandes árvores, mausoléus refinados, covas abandonadas, flores e velas. É assim a atmosfera do cemitério Campo da Saudade, um dos locais mais antigos de Imperatriz (MA), com 42 anos de fundação. Ocupa um quarteirão inteiro, com 40 quadras tomadas por túmulos e um fluxo anual de 1,6 mil corpos sepultados, sendo um dos principais pontos de referência do bairro Santa Rita. “O número de pessoas enterradas aqui é incontável. Tem algumas covas com até sete enterradas no mesmo local’’, afirma Valdecir Marques, há 15 anos administrador dos cemitérios públicos do município.

Devido à idade do cemitério, muitas covas e túmulos estão deteriorados. A falta de zelo da família com os espaços de seus mortos é um dos principais fatores. Além disso, muitos adolescentes invadem o local para utilizar drogas ilícitas e álcool. “Pegamos covas que os parentes não pagam pra zelar ou não cuidam, e lavamos, capinamos, limpando os arredores do túmulo”, relata Francisvânia do Nascimento, zeladora do local.

Devido ao tempo e ao descuido, covas estão deterioradas (Crédito: Camyle Macatrão)

O cemitério possui uma equipe de aproximadamente 36 funcionários regulares, contando com coveiros, zeladores, secretária, entre outras funções. Porém, às vésperas do Dia de Finados, a prefeitura contrata mais 40 pessoas para limpar e organizar o espaço. “Começamos a limpeza em meados de agosto. Lavamos os túmulos, varremos o local, colocamos estrume nas plantas. Por volta de três dias antes do dia 2 de novembro, os familiares começam a vir visitar seus entes queridos’’, informa Francisvânia.

DIA DE FINADOS

O feriado gera um movimento de cerca de 20 mil pessoas, que visitam seus amigos e familiares falecidos. A prefeitura fecha a rua principal para que os ambulantes e os familiares possam transitar tranquilamente pelo local. A comerciante de coroas de flores, Neneca Raimundo, trabalha há aproximadamente 20 anos próxima ao cemitério e conta que, devido à alta demanda, durante o Dia de Finados teve que expandir seu comércio para as cidades vizinhas, como Açailândia e Governador Edison Lobão.

O cemitério lota de visitantes todos os anos durante a data, devido à forte relação estabelecida com a comunidade do bairro. “Muitos moradores têm parentes enterrados lá, meu avô mesmo está enterrado lá. Alguns senhorzinhos costumam jogar baralho na frente do cemitério. Às vezes até alguns funcionários participam”, diz Tiago da Silva, 28 anos, farmacêutico e residente no Santa Rita.

Manutenção do cemitério fica ao cargo de 36 funcionários (Crédito: Camyle Macatrão)

PANDEMIA

Durante o período da pandemia da Covid-19, o Campo da Saudade reduziu os números de enterros. Não foi possível realizar cerimônias religiosas no cemitério devido ao decreto municipal n°, de 15 de março de 2020, que sentenciou em seu artigo 1º, que todos os mortos pela doença seriam enterrados de caixão fechado no cemitério Bom Jesus e não seriam velados. “Foi muito doloroso para as famílias e para nós funcionários, ver os parentes se despedirem de seus entes queridos por uma tela de celular, a 40 ou 50 metros do corpo”, relembra o administrador Valdecir Marques. Após o auge da pandemia, os corpos voltaram a ser velados no Campo da Saudade, sem mais critérios do motivo da morte.

O cemitério Campo da Saudade fica aberto todos os dias, das 7h às 18h e não fecha para feriados, mesmo com a equipe reduzida. O administrador do cemitério  ressalta a importância de um tratamento respeitoso para com o público, independente do dia ou horário. “Chegou a hora de ir, tem que ter alguém ali pra receber e ser bem cuidado. Geralmente as pessoas, quando vêm ao cemitério, é porque acabaram de perder um um pai, um filho ou uma mãe. E nós temos todo o cuidado do mundo para não magoar ainda mais essa pessoa e sermos respeitosos, porque quando perdemos um ente querido fica uma ferida na alma”, ressalta Valdecir Marques.

Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística, chamado Meu Canto Também é Notícia. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar histórias jornalísticas em seus próprios bairros. Essa é a primeira publicação oficial de todas, todos e todes.