Ensino superior na pandemia: impacto e readaptação

Texto: Monik Hevely

Foto: Arquivo pessoal da fonte.

A rotina de ensino e aprendizagem vivenciada por alunos e professores das instituições de ensino superior público e privado também se desfez. Em 18 março de 2020, o Ministério da Educação autorizou que as aulas presenciais fossem suspensas e substituídas pelo modelo de aulas remotas. A sala de aula, a lousa e o pincel tornaram-se digitais.

No Mapa do Ensino Superior 2020, o Brasil consta com cerca de 8,4 milhões de matriculas no ensino superior presencial e a distância (EAD), sendo que cerca de 21,3% são registradas na região Nordeste e 2,2% no Maranhão. Dessa forma, devido à pandemia de Covid-19, cerca de 6,3 milhões de estudantes de faculdades e universidades do país tiveram as aulas suspensas, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Abalo

No princípio havia quem achasse que a suspensão das aulas não fosse demorar. Jorge Oliveira 64 anos, professor na Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (Uemasul), com 27 anos de docência, conta que depois de todo esse período de experiência, em 2020 “foi pego de calça curta”. Diniz, como prefere ser chamado, é também pesquisador e dedica parte de seu tempo ao campo da pesquisa. Dessa forma, como professor de química, um dos seus vários projetos está ligado ao cultivo de plantas, no entanto, a pandemia interrompeu bruscamente as atividades, causando-lhe atrasos e perdas. “Tive um momento que falei com o zelador para olhar minhas plantinhas, e quando as vi amarelando, bateu uma frustação”, pontua.

Marcos Matos (48), professor e vice-reitor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), conta que a decisão foi inesperada. “Isso não é educação a distância. O ensino a distância é aquela educação que foi planejada para ser a distância. No nosso caso, nós fomos jogados nesse formato de ensino. Tanto professores quanto alunos, vêm de cultura de ensino presencial e, de uma hora pra outra, temos que abandonar, temporariamente, essa cultura”. Na visão do vice-reitor, essa foi a única alternativa que as universidades brasileiras tiveram para continuar com as atividades acadêmicas no período atual. “Tomamos um baque, mas nos organizamos e nos estruturamos para que pudéssemos atender ao calendário acadêmico”

Alterações

O ensino remoto, adotado por 95,6% das universidades federais do país, de acordo com o portal Coronavírus-Monitoramento das Instituição de Ensino, mudou a rotina dos professores drasticamente. Cerca de 90% dos docentes brasileiros não tinham experiência com esse modelo de ensino antes do isolamento social, como aponta a pesquisa do Instituto Península. Essa situação foi constatada também pelos estudantes, conforme relata o discente Rafael Bandeira, 25 anos, estudante do oitavo período do curso de agronomia na UFMA. Apesar de o ensino remoto ser “uma atividade inovadora”, seu curso necessita de aulas externas e, para ele, “as práticas realizadas em campo somam um aprendizado que nenhuma teoria é capaz de substituir”. Bandeira também menciona não ter uma boa internet e um ambiente adequado para o ensino.

Quanto a esse aspecto, Allison Oliveira, 37 anos, professor do curso de licenciatura em geografia na Uemasul, se diz “totalmente contra o retorno virtual”, pois para ele, o modelo remoto pode ser injusto com boa parte dos alunos, já que esses estudantes não dispõem de um ambiente propicio para o estudo. “Não tem mesa, estudam numa cadeira de macarrão com o celular, com gente passando”, ressalta.

Para Oliveira, a chegada da Covid-19 deixou “todos no escuro”, e ele ressalta que o efeito da pandemia nele e nos demais professores da instituição foi uma “loucura, um frenesi. Desestruturou a rotina de trabalho”. Esta opinião é compartilhada por Thiago Silva, 34 anos, professor e diretor no curso de administração na Uemasul e na Unidade de Ensino superior do Sul do Maranhão (Unisulma), em Imperatriz: “A gente sabe que tem muitos alunos que conectam, mas não assistem à aula”, lamenta. Pois, diferentemente das salas de aula, onde é possível que o professor tenha um controle sobre a participação dos alunos, na nova rotina, essa articulação fica bem mais difícil.

Jadyna Parrião, 23 anos, estudante de farmácia bioquímica na Faculdade de Imperatriz (Facimp), também condena essa ação de má-fé por parte de alguns alunos. “Muitos só se conectam a aula”. A acadêmica conta que as atividades remotas fizeram com que ela pensasse em trancar o curso, porém, depois concluiu que “seria um tempo perdido”. Mas diz que espera ansiosamente o retorno presencial: “Espero que volte logo”.

Silva, ao ser questionado sobre as dificuldades do processo de ensino e aprendizagem do ensino remoto, menciona que um dos principais obstáculos é a qualidade da internet. “Infelizmente nós estamos em uma região em que a gente não é provido de uma boa conexão, muitas pessoas não tem acesso”. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a rede só está presente em 61,4% dos domicílios maranhenses.

Isabela Sousa 19 anos, estudante de psicologia na Unisulma, está tendo aulas no modelo híbrido, no qual é previsto o revezamento entre o ensino presencial e o remoto. A aluna menciona que, apesar das aulas remotas serem bem proveitosas, “as aulas on-line não se comparam às presenciais”. Além de existerem problemas de conexão, barulhos e distrações do seu ambiente residencial.

Perspectivas

Heber Aguiar, 33 anos, professor do curso de pedagogia na Faculdade de Educação Santa Terezinha (Fest), menciona que, no momento, a instituição de ensino que leciona optou pelas aulas presenciais, mas com uma nova configuração e com as medidas exigidas pela Vigilância Sanitária. Aguiar teve receio da retomada presencial. “Não só tive medo, como ainda tenho. Mesmo com algum medo, acredito que essa crise ainda seguirá por um tempo e que os trabalhos devem ser retomados com novas configurações, como a instituição em que trabalho fez, tem feito”. O professor comenta que o medo que sentiu “se deveu pela saúde de todos presentes na instituição durante as aulas. De modo particular, havia o medo em relação à minha saúde e posterior da minha filha”, pois sua esposa está grávida.

Quanto ao ensino remoto, adotado pela faculdade no início da pandemia, o professor pontua que o sistema tem que acompanhar o tempo. “Somos muito tradicionais e, consequentemente, resistentes a outras modalidades de ensino. O que esse tempo de pandemia tem mostrado para os professores é que para o ensino, há muito mais que o quadro e o giz, ou o pincel e a lousa branca… Eu, ainda que jovem, sou muito voltado à modalidade presencial, mas tenho aprendido que existem outras maneiras eficazes de ocorrer o ensino-aprendizagem”.