Como uma mãe, a umbanda cuida e acolhe os que precisam

A ialorixá Leia Maria Alves é responsável por 29 filhos espirituais – Foto: Kelly Costa

Por Lucas Medeiros

“A umbanda é a oportunidade de manifestar o ensinamento de Jesus Cristo, o mestre Jesus veio ao mundo e não pregou a religião. Ele pregou o amor e disse, amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei”, explica Celso Santos da Silva, 43 anos, que é umbandista há 15. A ialorixá Leia Maria Alves, 39 anos, que teve o primeiro contato com a religião através dos pais, vê nela a oportunidade de praticar o bem. “Tenho a umbanda como uma salvação, não falo na questão da mudança de plano espiritual, mas em como ela me faz ter fé, eu amo religião porque ela me faz crer que tudo pode acontecer se praticarmos o bem para o próximo.”

A umbanda foi construída com influências de diversas religiões, como africanas, indígenas, europeias e ocidentais. Esse sincretismo religioso torna os rituais repletos de simbolismos, cores e artigos que compõem o ambiente e tornam os terreiros locais aptos não só para receber seus frequentadores, mas também, as entidades que os regem. Existente a mais de um século, a forma como é representada a anunciação da religião, é por meio de um jovem de 17 anos chamado Zélio Fernandinho de Moraes, que recebeu o espírito do Caboclo das Sete Encruzilhadas em uma sessão espírita no dia 15 de novembro de 1908 na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro.

 

Celso Silva realiza giras e media sessões espirituais como médium – Foto: Kelly Costa

Os centros de umbanda são os locais onde acontecem as cerimônias de culto aos orixás. As reuniões são comandadas por um pai ou mãe de santo, mas também podem ser mediadas por médiuns. Diferente dos pais e mães de santo, eles não incorporam as entidades, apenas se conectam com a energia delas para utilizar durante os rituais ou em processos de cura. É como conta Celso Silva. Ele é casado com a mãe de santo Juliette Silva, que é responsável pelo Terreiro de Sant´Ana, no qual eles atuam em conjunto. “Todos nós somos sensitivos em um determinado grau. Eu sou médium, não sou pai de santo, uma vez que eu me conecto à energia da entidade, mas eu não incorporo. Então existe essa graduação dentro da religião, você começa a se desenvolver espiritualmente e vai conseguindo exercer determinadas funções, se conectar a diferentes entidades e assim por diante”, explica Celso.

Em ambientes que podem ser fechados ou abertos, são realizados os cultos onde acontecem uma maior aproximação entre o plano físico e espiritual por meio de orações, cânticos e recebimento das entidades. Para cada manifestação espiritual existe uma característica. Quando alguém começa a cantar uma música específica, aquele som representa determinado espírito que, em algum momento irá riscar seu ponto na gira.

Ao som constante do maracá (instrumento de origem indígena), as pessoas que possuem uma conexão espiritual mais forte, começam a incorporar entidades que em certos momentos, fumam um cachimbo de ervas ou bebem chá, e em outros, falam com as demais pessoas da roda em forma de cumprimento, as abençoando ou realizando limpezas espirituais. O ambiente é repleto de velas, e imagens das entidades, sejam pintadas nas paredes, ou representadas em estátuas. Os participantes fixos costumam utilizar, em sua maioria vestimentas brancas, mas esta característica pode ser mudada de acordo com o que será celebrado. Acessórios como cordões e guias também fazem parte do vestuário, mas não de todos.

A religião é amor, caridade e respeito – Foto: Kelly Costa

 

As guias são apenas para os participantes que já possuem um grau de espiritualidade mais desenvolvido e precisam delas para se proteger, como conta Celso. “As velas, guias e imagens são fundamentos dentro da religião. A guia é a tua proteção ela fecha o teu corpo contra aquela energia para que você não seja acometido por ela. A vela é a representação não só da umbanda, mas também de outras religiões, como na católica, a vela é representação da luz”, afirma o médium.

Perseguida e atacada pela sociedade desde o seu surgimento, a umbanda tem como característica muito forte a presença de pessoas que pertencem a diversas tribos da sociedade. Com forte influência africana, a comunidade negra é predominante na religião, mas não somente ela. A comunidade LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Transexuais, Queer, Intersexo e Assexuais) tem encontrado nesse sistema de crenças um lugar onde são recebidos e aceitos, e podem exercer sua fé de forma livre, sem a necessidade de mudar quem são. Desde frequentadores, até pais e mães de santo, todos podem ser pertencentes à religião em todos os níveis espirituais, já que a busca não é por pessoas com um perfil único, mas sim por aqueles que precisam e querem desenvolver sua espiritualidade. “Como espíritos encarnados, a umbanda procura desenvolver a tua espiritualidade, a sua sexualidade, se você é heterossexual ou homossexual, não é levada em conta dentro da religião. Todas as pessoas são amparadas e abraçadas independente da sua condição sexual, inclusive um pai de santo pode ser homem, pode ter a mãe de santo que é hétero como pode ter também o pai de santo homossexual”, explica o médium Celso Silva.

“Alguns colegas de trabalho ou amigos, às vezes fazem aquelas piadinhas, só que a gente absorve, né? Até mesmo, porque hoje em dia nós estamos respaldados por lei”, é como explica o médium e presidente da Associação dos Terreiros de Cultura e Religião de Matriz Africana (Astercma) Clauber Roberto Silva dos Santos, 43 anos. Ele, que é servidor estadual, casado e tem um filho pequeno, diz que nunca sofreu nenhuma resistência por parte de sua família e que a intolerância religiosa é sim uma realidade, mas que não o faz perder a esperança de que um dia as pessoas terão maior conhecimento e empatia sobre as religiões de matrizes africanas.

Como mãe e filho espiritual, o médium Clauber e a mãe de santo Leia, juntos criaram a associação que luta pelos direitos e respeito dos terreiros – Foto: Kelly Costa

Esperança essa que o motiva como atual presidente da associação a sempre lutar pela quebra de preconceitos e melhoria na vida das pessoas. “Eu não gosto de nenhum tipo de preconceito, o que me fez levantar a bandeira da associação juntamente com a madrinha mãe Leia foi justamente isso. Eu via aqui que muita gente não tinha força, que não conseguia resolver um problema, não conseguia ir na delegacia prestar um boletim de ocorrência, pessoas que não tinham o que comer. Então querer ajudar, sendo uma associação é bem mais forte, tem um peso maior e a gente consegue ajudar muito mais”, conta Clauber Santos, que há dois anos é fiel do terreiro de Santa Bárbara da mãe de santo Leia.

As giras acontecem para celebrar e cultuar os orixás da religião – Foto: Kelly Costa

Os orixás na umbanda

Na cultura da umbanda, os orixás e as entidades ancestrais habitam outro plano espiritual. Algumas das principais representações são:

Oxalá: O orixá mais importante, é o criador da humanidade. Seu símbolo é o branco e sua qualidade é a sabedoria. No sincretismo, é Jesus Cristo.

Oxóssi: Orixá da caça, identificado com as matas, os animais e as plantas. Seu símbolo é o arco e flecha. No sincretismo, é São Sebastião.

Xangô: Orixá da justiça e do trovão. O símbolo de Xangô é o machado e, no sincretismo, é identificado como São Jerônimo.

Iemanjá: Orixá feminina das águas salgadas, Iemanjá é a Rainha do Mar. Sua cor é o azul claro e o branco. É identificada como Nossa Senhora.

Ogum: Orixá guerreiro, associado à metalurgia, à luta e ao trabalho. Seu símbolo é a espada. No sincretismo, é o São Jorge.

Oxum: Orixá feminina das águas doces, associada à maternidade, à fertilidade, à beleza e ao amor. Seu símbolo é o ouro. É identificada como Nossa Sra. da Conceição.

Iansã: Orixá feminina dos raios, tempestades, trovões e vendavais. Seu símbolo é o raio. No sincretismo, é Santa Bárbara.

Exu: Orixá mensageiro, dono das encruzilhadas e guardião das entradas. Seus símbolos são o tridente ou o ogó (bastão de madeira). No sincretismo, é Santo Antônio.

Fonte: Site Toda Matéria

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