Aniversários, natal, ano novo e nossos lutos

Aniversários, natal, ano novo e nossos lutos

Por Pedro Ítalo

 

Esse talvez deve ser o seu primeiro natal ou réveillon sem alguém que você ama ou até mesmo o primeiro ano que irá passar sem aquela pessoa que te fazia o maior bem só de estar, alí, ao seu lado. O luto é um dos sentimentos que talvez mais faça reverberar explosões de emoções dentro da gente, já que ele não é uma linha tênue, mas sim uma montanha-russa em que dependente do dia, ele possa estar lá em cima ou lá embaixo. 

 

Principalmente no primeiro ano de luto ele tende a ser o mais marcante, pois passar pelas primeiras datas importantes como, o primeiro aniversário, natal, páscoa, ano novo sem a pessoa que partiu, podem trazer dores e sentimentos difíceis de gerir. Quem já passou pela experiência de perder alguém costuma sentir essas ausências durante esses momentos de confraternização que podem trazer uma melancolia junto.

 

A pedagoga, Rosana Pereira, de 42 anos, perdeu a mãe há 23 anos, após ela falecer devido a uma Dengue Hemorrágica, e não apenas o primeiro ano de perda foi o mais difícil, mas também até os dias de hoje a dor do luto nunca foi embora. “Eu perdi a minha mãe quando eu tinha 16 anos, ela estava internada em um hospital em uma outra cidade, e eu fui até o posto telefônico para ligar pro hospital pra saber como ela estava, no que eu ligo a moça do hospital atende e me falou que ela não estava mais na enfermaria pois ela já tinha falecido”. Conta Rosana.

 

Rosana e a mãe moravam sozinhas em uma casa na cidade de Capinzal do Norte, a 260 km da capital maranhense, as duas viviam cuidando uma da outra após os irmão mais velhos de Rosana se casarem e irem ter a suas próprias vidas. “Eu sou a mais nova de seis irmãos, e a gente vivia na roça, então todo mundo vivia trabalhando. Quando meus irmãos casaram e foram morar na casa deles foi o momento em que eu tinha a minha mãe só pra mim, e a gente fazia tudo juntas, mas foi um tempo muito curto pq logo Deus tirou a minha mãe de mim”, diz a pedagoga com os olhos marejados.

 

As duas eram muito apegadas uma na outra e quando a sua mãe, Josefa, contraiu a doença e veio a falecer foi o momento mais doloroso da vida de Rosana e até hoje é uma ferida que nunca cicatrizou e sempre no mês de janeiro, quando ela fazia aniversário, e no dia das mães, são os momentos em que a ferida criada pela perda volta a trazer a dor de volta. “Nossa, se eu pudesse eu apagava essas duas datas do calendário, por que é muito doloroso chegar o aniversario dela e o dia das mães e eu não poder ligar para parabenizar ou até mesmo ir até onde ela, só pra dar um abraço”, conta ela com os olhos marejados de lágrimas. 

 

“O meu primeiro ano de luto foi o mais difícil pois era nós duas em tudo e de repente eu me vi sozinha naquela casa. Passar o aniversário dela, o natal, a páscoa, o ano novo, no primeiro ano foi muito difícil e é até hoje. Mesmo depois desses 23 anos eu só queria passar essas datas, nem que fosse uma vez ao lado dela de novo”. Complementa.

 

Assim como Rosana, o pedreiro Cladony Farias, de 49 anos, também passou pela mesma dor de perder a mãe. “Minha mãe morreu há um ano e nove meses e eu sinto que até hoje ainda estou de luto”, conta Cladony. A sua mãe se chamava Felícia e morreu com 100 anos de idade, de velhice. Cladony mora em Imperatriz e sua mãe morava na cidade Santo Antônio dos Lopes, ele veio embora para cá após o nascimento de seu filho, há 20 anos atrás, com o sonho de conseguir emprego para cuidar da família. Os dois moravam juntos e após ele sair de casa, ela ficou morando sozinha, mas estava aos cuidados dos outros irmãos de Cladony. 

 

“Eu precisei sair de casa para criar e ter meu filho e vim para Imperatriz procurar uma oportunidade de poder criar ele, nisso consegui trabalho aqui e eu só conseguia visitar a minha mãe uma vez por ano, que é quando eu pegava férias.” Conta Cladony. 

 

Ele relata que o sonho da mãe era viver aos 100 anos de idade, para fazer uma grande festa reunindo todos os filhos, netos, bisnetos a família toda, como bem desejado ela conseguiu, mas meses depois Felícia morreu devido a idade. “Ela morreu depois de conseguir realizar esse grande desejo dela e isso das coisas que me conforta. Mas eu sinto que até hoje eu ainda não superei o luto pela perda dela, ainda hoje tem dias que é difícil levantar da cama.” Conta

 

“Acho que o que me faz ter mais dor em relação a perda dela é a questão da distância que fiquei da minha mãe. Os anos que eu passei longe dela depois que eu fui embora e as poucas vezes que eu fui visitar ela, seja a causa do por que a morte dela ainda dói tanto”, complementa com dor e tristeza nos olhos. 

 

Passar esses anos todos sem o convívio diário com a mãe como costumava ser antes, trouxe para a Cladony uma dor de arrependimento no luto, dor essa que faz com que ele não comemore mais nenhuma data importante, pelo menos neste primeiro ano de luto em que a ferida causada pela perda ainda está bem recente. “Não tem muito sentido pra mim essas datas, antes eu já não ligava muito, agora não vai importar mais, eu me lembro dela nesses momentos, por que ela era muito religiosa, mas comemorar não faz mais sentido”, conta. 

 

Assim como Cladony e Rosana, passar pelo luto sendo ele recente ou não é um desafio que muitas pessoas que já perderam entes queridos passam. 

 

O luto e suas fases 

 

O luto é entendido pelos psicólogos como uma reação à uma impactante perda. E, ao contrário do que muitos podem pensar, o luto não está relacionado apenas à morte. A psicóloga Bruna Viveiros, conta que o processo do luto também pode se caracterizar como o processo em que um sujeito perde algo. “O luto a gente não vivencia apenas quando perdemos alguém, mas também quando nos mudamos de cidade, o término de um relacionamento, ou seja, o luto é uma passagem de coisas que tem haver com uma quebra de círculos e de vínculos, que trazem esse sentimento”, conta a psicóloga.  

 

Além disso, o luto da perda de alguém traz à tona também as cinco fases do luto que muitas pessoas devem conhecer e já ter passado, que são negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. “Essas cinco palavras são bem conhecidas e muita gente acha que elas são uma regra do luto passar por essas fases e nessa ordem, mas não, algumas pessoas podem, sim, passar por elas, nessa ordem ou não e outras talvez nem passem por essas fases, por que depende de cada ser humano.” Diz Bruna. 

 

Segundo a psicóloga, o primeiro ano de perda, para muitas pessoas, é mais difícil por ser o primeiro ano de readaptação. “Nesse primeiro ano é o momento em que a pessoa está aprendendo novamente a viver sem o ente querido, ele tende a ser mais difícil por sairmos de algo que estava na nossa rotina todo dia, muda nosso modo de ser e dessa nova forma de readaptação”.  

 

Nos momentos festivos do ano são os instantes em que mais traz a sensação de melancolia pela pessoa que se foi não estar do nosso lado, Bruna explica que esses momentos festivos tendem a doer mais, por ter aquele desejo de ter aquela pessoa conosco e nós temos o hábito de compartilhar momentos com quem amamos e quando nos vemos sem essa pessoa para compartilhar essa festividade a dor aparece e até mesmo a vontade de comemorar essas datas vai embora, pois se doi é por que um dia já foi amado e o luto é apenas mais uma palavra para falar de amor.