Ambulantes do bairro Bom Sucesso complementam o movimento da feira local

Vendedores independentes relatam suas vivências e inseguranças da profissão

Renata Sousa

“Atendimento na porta? Ave-Maria! É bom demais”, comentou Marizete da Silva Sousa, uma das várias donas de casa, moradoras do bairro Bom Sucesso, que contam com o privilégio de ter a “feira sobre rodas” na porta de suas residências. Há mais de 20 anos Besaliel Dedicio de Oliveira, 62 anos, dono do tal carrinho, oscila entre ser vigilante noturno e comerciante de frutas e verduras. Marizete aprova: “É só coisa boa, de primeira qualidade”. Em um bairro marcado por uma grande feira, Besaliel e outros ambulantes se reinventam para concorrer com essa grande disputa.

Apesar de ser uma necessidade, e não uma escolha, pois ainda não conquistou a aposentadoria, o comerciante entrou no ramo com o objetivo de complementar a renda de casa, e se diz muito satisfeito com a profissão. “O melhor de ser ambulante é que a gente faz o horário. Tem dias que a necessidade obriga, mas tem dias que a gente se segura”, explica Besaliel. Ele trabalha de quarta à sábado, e tem como única reclamação, a concorrência que sofre com a feira e os comércios locais.

Besaliel de Oliveira: “O melhor de ser ambulante é fazer seu horário” (Crédito: Renata Sousa)

Por ter um contato direto, conhecendo o seu endereço, inevitavelmente gera-se uma cumplicidade, compaixão e amizade entre vendedor e cliente. Besaliel vende à vista e à prazo, entendendo a necessidade do freguês, conforme o conhecimento de cada índole. “Recebo certinho. Tem uns que dá dificuldade um pouco, às vezes confunde, mas no geral, eu recebo”. Uma das clientes, que virou amiga, e que usufrui dessa confiança, é a própria Marizete. “Ele vende fiado pro bairro todo. Se pagar direito, ele vende. Ele é patrimônio aqui do nosso bairro”, disse a freguesa, enfatizando a história e significância do trabalho do comerciante para a comunidade.

Desconfiança

Em contraponto, há aqueles como Joaquim Almeida, de 74 anos. Ele trabalha na área há mais de 40 anos, não vende fiado e muito menos aceita Pix, pois tem medo de ser “engabelado” novamente. O trabalho começa cedo. Joaquim prepara a salada de frutas e sai com o carrinho para pontos específicos da avenida Industrial, de segunda à sexta. E aos domingos, permanece na Feira do Bom Sucesso, juntamente com a sua esposa. Ao contrário de Besaliel, ele conseguiu conquistar a aposentadoria, porém o dinheiro da salada também não serve para custear as contas.

E apesar dos copos variarem de R$ 2 a R$ 6, há dias Joaquim não consegue vender toda sua mercadoria, devido a um desacerto de horários. Ele pressupôs, por intuição, que os clientes o buscariam na “hora quente”, que é como se refere ao horário do meio-dia às 14 horas. Mas brinca ao ser questionado se o “horário frio” é o melhor.  “O horário bom é quando você tem dinheiro e quer comprar. Pode chovendo, mas você compra”.

Joaquim Almeida trabalha em pontos fixos específicos (Crédito: Renata Sousa)

Embora haja uma insegurança por partes dos ambulantes, com a disputa com a feira local, existem clientes como a Ana Paula Silva, 24 anos, que discordam desse pensamento. Ela aponta uma característica que a feira não possui, e que ela enxerga como vantagem, que é a de locomoção. “Se a gente não vai até a feira, ela vem até a gente. Facilita a nossa vida, se a compra acabou, não precisa se preocupar em sair de casa”. Mas, a cliente também não minimiza a significância que a feira tem para os moradores. “Tem uma energia. Você encontra conhecidos, conversa, come uma coisa, uma salada – a do Joaquim – se distrai… faz bem”.

Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística, chamado Meu Canto Também é Notícia. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar histórias jornalísticas em seus próprios bairros. Essa é a primeira publicação oficial de todas, todos e todes.