Uma conversa com Ita Portugal, escritora imperatrizense com mais de 36 mil seguidores no Facebook

Texto de Letícia Holanda

 

Com mais de 36 mil seguidores no Facebook, a escritora imperatrizense Ita Portugal é dona de uma sensibilidade profunda na escrita de seus textos. Pouco conhecida por seus conterrâneos, ela é seguida na sua Fanpage pela atriz global Carol Castro e pela jogadora de basquete Hortência. Após a visualização de seus textos na internet, surgiram leitores e pedidos para que esse material fosse transformado em livro, que resultou em duas publicações “Certas Incertezas” e “Homens, Mulheres, Amores” com mais de 500 livros vendidos no Brasil e no exterior. Os livros de Ita estão disponíveis nas livrarias Saraiva,Cultura e Travessa.

Natural de Mirador do Maranhão, onde passou sua infância e adolescência com a família e os oito irmãos, Itaneide Alves Bezerra,como é seu nome de batismo,sempre se destacou por sua desenvoltura com a escrita e desde os 15 anos de idade escreve frases, textos, versos que encantou e encanta a todos que leem. Itaneide começou no mundo da escrita por meio das cartas, quando tinha 18 anos de idade. Sua mãe precisava mandar as correspondências para seus parentes, e era Ita quem se encarregava da função de escrevê-las. A partir daí, não parou mais.

Nessa entrevista, ela se mostra uma mulher sensível por trás do título de escritora, os caminhos que passou até assumir a sutileza da escrita na sua vida. Aqui ela compartilha sua vivência, tanto com as palavras, quanto em relação ao reconhecimento que teve de outras pessoas com seu trabalho, e as divide com os leitores.

Ita Portugal, escritora de Imperatriz com fãs por todo o país
Ita Portugal, escritora de Imperatriz com fãs por todo o país

Letícia Holanda (L.H): Você tem mais de 36 mil seguidores no Facebook. Foi a partir daí que seus leitores viram a necessidade de ir além das redes sociais. Como foi o começo e esse processo de sair do mundo virtual para as páginas dos livros?

Ita Portugal (I.T): Quem fez meu nome nas redes sociais foi uma amiga do Rio de Janeiro, ela começou pegando minhas frases e a fazer uns cartõezinhos pra postar, ficavam muito bonitinho visualmente. Quando eu me dei conta, as pessoas começaram a compartilhar e a seguirem. De repente me deparei numa página da internet com dois milhões de seguidores. Tinha lá uma frase minha com 125 mil compartilhamentos, isso me estimulou muito a continuar escrevendo. Criei a página no Facebook, depois uma pessoa chegou pra mim e falou que eu poderia mandar editar meu material. Então comecei a procurar meio receosa em achar o material ruim, uma editora que fizesse o trabalho de edição e divulgação. Indicada por um amigo escritor, fiz a edição dos meus dois livros pela editora Buqui do Rio Grande do Sul. Vendi todos os 300 exemplares do primeiro livro. A própria editora fez todo o processo de espalhar a indicação dos livros para as livrarias. Todo o trabalho foi uma publicação independente, eu paguei, mandei publicar e depois comecei a vender. Eu não tive retorno do ponto de vista financeiro, mas eu sei que meu livro hoje está na Saraiva, livraria Cultura e na livraria da travessa.

(L.H): A partir de qual momento você efetivamente decidiu assumir a carreira de escritora?

(I.T): Eu sou uma pessoa que gosto de escrever. Eu assumi a escrita desde o meu primeiro livro. Sempre escrevi, mas nunca tinha assumido essa verdade na minha vida. Eu gosto do que faço, embora eu não seja essencialmente uma escritora. Se todo mundo gostar do que eu escrevo, ótimo, eu vou amar, vou ficar feliz, vou sentir que estou fazendo algo de bom para o outro, agora se acontecer de ninguém se identificar, vou continuar escrevendo da mesma forma. Eu não escrevo para ser uma escritora, escrevo para aliviar, falar comigo, por isso que sou conhecida mais pelos meus textos do que pela pessoa.

(L.H):Sente vontade de fazer parte da academia Imperatrizense de letras?

(I.T):Eu tenho contato com a academia, meu irmão é da academia, mas assim, requer um pouco de tempo pra você se envolver com os projetos. Nunca tive vontade de entrar pra fazer parte do grupo, respeito e considero excelentes profissionais, academia faz um belo trabalho, mas nunca parei para pensar em fazer parte da academia.

 (L.H): Há uma profunda identificação entre seus textos e o público leitor que te acompanha. Você acha que isso te diferencia de outros escritores?

(I.T): Eu sou cronista, eu tenho um estilo, eu disse que não sou escritora, mas a gente acaba seguindo um estilo, eu não sei fazer poesia, rimas, não sei combinar letras, frases, métricas, realmente eu não sei. Eu escrevo sobre sentimentos, eu me defino como uma pessoa que gosta de escrever sobre sentimentos, amor, que não necessariamente seja amor entre homem e mulher, amizade, perdão,relacionamentos, sobre a convivência humana, decifrar o ser humano.

(L.H): Você demonstra em seus livros uma sensibilidade muito grande quando fala da relação humana. De onde vem essa sensibilidade?

(I.T): Da minha observação com relação ao mundo, das pessoas, minha convivência com os outros, das experiências de viagens, morei em Goiânia, Mato Grosso do Sul, em São Paulo.Venho de um casamento, sou divorciada, do relacionamento com meus dois filhos, colegas de trabalho e das leituras que faço. Às vezes eu passo um mês para produzir um texto, outras vezes em 15 minutos eu faço um, isso depende muito da situação. Eu escrevo quando estou com vontade, quando eu sinto que tem alguma coisa me inquietando. Geralmente eu não reviso meus textos, porque quando eu volto para revisar às vezes eu mudo quase tudo que escrevi. Então eu escrevo assim, de momento, hora, minuto e de situação.

(L.H): Dos seus escritos, qual é aquele texto que mais teve aceitação do seu público?

(I.T): Tem um texto que se chama a “Última Temporada do Medo”.Foi um texto que muita gente gostou, fala sobre o medo, medo da superficialidade, das coisas que não têm valor, medo de você estar comprando os sentimentos do outro.  Quando eu falo de sentimento homem e mulher, do encontro e desencontro humano, relacionamento, da forma que as pessoas se relacionam, mesmo que seja uma relação de amor, ódio, tristeza, angústia, dor, sofrimento, espera, saudade, são textos que as pessoas gostam.

(L.H):Para quem você escreve?

(I.T): Eu escrevo pra mim, eu escrevo porque eu preciso. Falar aquilo que eu sinto e penso. Se atinge as pessoas, se tiver aplausos, muito bem, isso significa que eu consegui me comunicar. Se não existirem esses aplausos, eu vou refletir e procurar melhorar. Eu escrevo para marcar meu espaço no mundo, para decifrar meus sentimentos, para conhecer o ser humano, pra tentar entender o outro, eu escrevo para dizer que eu estou viva, escrevo porque eu desejo, quero e necessito.

(L.H): Como explica a Ita Portugal voltada para a crônica, sentimento e o amor pelas coisas simples?

(I.T): Eu, como todo ser humano, sonho muito, eu sonho com uma humanidade melhor, um dia melhor, com o outro melhor, eu sonho em me tornar uma pessoa melhor. Então eu escrevo com a esperança de que escrevendo eu possa melhorar a cada dia também.

 

(L.H): Sabemos que grande parte dos escritores brasileiros não vive somente da escrita.  Como você vê a realidade de valorização e dificuldades desses profissionais?

(I.T): A arte no Brasil em si é uma área muito complicada e pouco valorizada, a arte alimenta a alma, o ego, os sonhos, muitas vezes as pessoas não estão tão preocupadas com isso.  A mídia tem um poder muito grande de fazer o nome de uma pessoa, muitas vezes você depende de uma mídia, para dizer que você é bom. Então pra você ter reconhecimento no Brasil hoje, é muito complicado, até porque nós não temos uma memória, uma cultura de valorização da arte. Talvez por conta disso eu não tenha pretensão de viver de arte e nem de fazer arte para humanidade, eu faço arte pra mim, para suprir minhas necessidades, por isso que eu escrevo.

(L.H):Na sua formação como escritora, quais aqueles autores que você sente que marcaram sua vida?

(I.T): Gabito Nunes com o livro “Ao Norte de mim mesmo” foi o primeiro, ele escreve muito sobre o encontro humano. Martha Medeiros, Ana Jácomo e Adélia Prado têm uma sensibilidade tremenda pra falar de amor, Estela Florêncio que fala muito sobre relacionamento. Manoel de Barros,um poeta que fala sobre a natureza de uma forma linda e Paulo Leminski, um crítico literário. São esses que eu considero como professores da literatura.

(L.H):Qual o papel do escritor brasileiro hoje?

(I.T): Despertar o interesse para a leitura, formar leitores, a consciência, marcar o seu espaço na sociedade. Transmitir alegria, esperança, conhecimento, falar para o outro, descrever e decifrar o outro. Fazer uma leitura da realidade.

 

Confiram um trecho de  “Última Temporada do Medo”

Tenho medo. Tenho medo da acidez humana, que desacredita na bondade. Medo de quem duvida dos sentimentos mais simples e procura assim complicar a vida com uma coleção de teorias vazias e obsoletas. Medo das pessoas que mastigam silenciosamente sua ira, enquanto olham com reprovação para os sonhos dos outros. Das mãos fechadas por avareza e que desaprendeu a beleza da carícia. De ser tomada pelas dúvidas de quem fica sentado no caminho esperando a vida acontecer. De quem não comete erros, não corre riscos, não possui a ousadia dos dias coloridos que insistem em exagerar. Tenho medo daqueles que se calam porque não sabem argumentar. Da grandeza do homem que insiste em diminuir todos os outros.  Dos que escolhem pelo que agrada ao olho em oposição ao que a alma sente.