Praça do Pioneiro: o lugar dos jovens em Açailândia

Praça só fica vazia quando os jovens não a invadem

Texto e foto: Brunna Tavares.

Pela manhã, no centro de Açailândia no Maranhão, a Praça do Pioneiro, a mais antiga da cidade, parece vazia mesmo com o fluxo constante de pessoas. Provavelmente por nenhuma delas parar para olhar as árvores e ouvir os pássaros, ou admirar a fonte toda elaborada no centro do local. Ou sentar nos bancos para botar o papo em ordem com aquele vizinho que toma o mesmo caminho rumo a mais um dia de trabalho logo cedo. Ninguém tem tempo para isso, então a praça se torna apenas parte do caminho que essas pessoas tomam todos os dias, sem olhar para os lados ou para cima, nem mesmo em frente. Com a cabeça baixa, todos seguem rumo a suas responsabilidades, alienados em seus deveres.

Mas essa realidade muda um pouco quando, de repente, a praça é tomada por estudantes das escolas que ficam nas proximidades (CE Prof. Antônio Carlos Beckman e EM Roseana Sarney). Geralmente no final das aulas, ao meio-dia, os grupos de amigos se juntam para conversar, brincar, ou lanchar. Acabam tornando o lugar em um emaranhado de conversas paralelas que, olhando de fora, parecem ser todas iguais e ao mesmo tempo totalmente diferentes. É possível ver que esse barulho devolve vida e cor ao local, que há minutos atrás parecia monótono e sem graça.

Animação

Os estudantes não param de falar um só segundo: como foi a aula, o que o professor disse ou deixou de dizer, qual a opção que cada um marcou na questão dois da prova – o que gera uma discussão por causa da divergência nas respostas – é assunto que não acaba mais. Mesmo debaixo do sol ardente de meio-dia, a sombra das várias árvores abriga os estudantes e a boa companhia dá ânimo às conversas.  “Geralmente eu vou pra praça depois da aula, fico sentada nos bancos conversando com os amigos e tal, tipo, se todo mundo sair junto”, conta Giovanna, 16 anos, estudante de uma das escolas próximas da praça. Ela acrescenta que quando as turmas não são liberadas em paralelo, o destino costuma ser diferente. O encontro na praça depende do cronograma da escola.

A divisão dos grupos pela praça é cômica: um toma conta do palco, outro de um ou dois bancos, alguns ficam deitados na grama debaixo das árvores, é como uma sala de aula e suas “panelinhas”. Quem olha de fora poderia pensar que esses jovens nem mesmo se conhecem ou são da mesma escola, se não notasse o uniforme.

A Praça do Pioneiro é a mais antiga de Açailândia, nasceram praticamente juntas. Foi inaugurada em abril de 1981, como homenagem ao então governador João Castelo e ao senhor João Mariquinha, considerado um dos desbravadores e moradores pioneiros da cidade. Sempre foi cercada de árvores e decorada com uma fonte gigante bem no centro, além do palco na lateral. A primeira fonte da praça foi aterrada, mas por ser tão importante para os frequentadores foi reconstruída recentemente. Essa praça faz parte do cotidiano e das histórias de todas as famílias e jovens açailandenses.

Todos que se sentam na praça, não só estudantes, parecem estar sempre esperando algo. Um menino mais velho sentado nas muretas que rodeiam a fonte, com fones de ouvido e cabeça baixa. Uma senhora encostada no palco, de braços cruzados e batendo o pé, parece apressada. Um pipoqueiro esperando clientes. Uma garota sentada em um banco distante que não para de olhar para os lados. Um hippie deitado com um dos braços sobre os olhos, esse não parece esperar por nada.

Educação física

Algumas vezes por semana o barulho dos jovens chega mais cedo nas manhãs da praça. Esses são os dias de educação física do Beckman, que por não ter quadra de esportes, muitas vezes organiza as aulas de educação física no local. Na maioria dos dias da semana só é possível ver muitos estudantes no lugar no fim das aulas, mas nos dias de educação física, o barulho, a vida e a cor que os jovens trazem ao espaço são triplicados. As conversas e risadas dos dias normais são substituídas por gritos, ou os papos mais escandalosos, por pulos e bolas batendo nas mãos e no chão. É pura confusão.

Famílias que vão passear com o cachorro, levar as crianças para andar de patins ou pedalar, têm de desviar dos alunos correndo para pegar a bola que saiu da “quadra” improvisada, antes que caia na rua. As crianças que estão lá só de passagem acabam brincando também na aula de educação física, que nem é delas. E o barulho só aumenta, até que é possível ouvir o sino da escola tocar, o que insinua que a aula acabou. Com o puxão imaginário que é o apito do professor, a vida, a cor e o barulho são tirados da praça, e só restam os passos lentos dos alunos voltando para a escola e as conversas baixas.

Mas o silêncio não dura muito, logo os estudantes estão de volta, com suas mochilas e suas conversas, agora menos escandalosas, todos preparados para irem para casa, mesmo que não demonstrem estar muito animados com isso. É muito mais gostoso ficar ali conversando, comendo e se divertindo com os amigos. É um lugar para se criar lembranças. Todos os jovens de Açailândia têm alguma história da praça pra contar, inclusive Giovanna “Eu tenho muitas lembranças daqui, da praça. Muita coisa daqui me traz lembranças desde o ensino fundamental. Essa é a importância da praça pra mim, é tipo algo mais sentimental mesmo”.

Ponto de referência

A praça é dos jovens nos dias normais e até mesmo em ocasiões especiais, quando o local serve de sede para eventos, shows e peças de teatro. É aí que os jovens tomam conta do lugar de vez. Todos os bancos, e até o que não é banco se enche de jovens, que podem estar lá para prestigiar o que quer que esteja acontecendo no palco, ou só para curtir a presença dos amigos.

Também é ponto de encontro e ponto de referência. “Vamos nos encontrar na Praça do Pioneiro” e “é perto da Praça do Pioneiro” já são frases prontas entre os moradores de Açailândia. Ranniely, 15 anos, conta que costuma marcar de se encontrar na praça com todos os amigos para de lá ir seguir ao seu verdadeiro destino. “Pra todo mundo é um lugar neutro, não fica nem perto nem longe demais, é um ponto de encontro muito bom”.

Quando dá a hora de ir embora, é possível ouvir uma onda de “tchau’s”. Os jovens se despedem de seus amigos enquanto viram as costas rumo às suas casas. E a praça novamente se torna lugar de passagem para aqueles que, agora, voltam de suas responsabilidades matutinas, ou seguem rumo a seus deveres vespertinos. Mesmo que nunca esteja mergulhada em um silêncio completo, a praça passa a ter a calmaria de uma esquina, onde poucos param, mas inúmeros passam.