Intolerância política na internet é crime contra a honra

Juizado Criminal aponta crescimento em 20% dos casos, na cidade de Imperatriz, entre 2016 e 2018

Repórteres: Evellyn Lima e Mayra Luz.

Crimes contra a honra que ocorreram em redes sociais tiveram aumento de mais de 20% em Imperatriz entre 2016 e 2018, crescendo de 28,3% para 48,72%, conforme dados do Juizado Criminal. O clima esquentado das eleições de 2018 pode ter colaborado, porque as agressões físicas e verbais entre os eleitores foram uma das marcas do pleito desse ano. No entanto, o desrespeito já era detectado também como prática em parte da população dois anos antes. Em 2016, uma pesquisa realizada pela plataforma Comunica Que Muda, revelou que, dos dez principais tipos de intolerância, a de maior frequência no Brasil é a política.

Os casos de intolerância política, que resultam em agressões verbais na internet,  podem ser enquadrados como crimes contra a honra. Porém, é importante ressaltar que o número de crimes contra a honra não inclui somente aqueles realizados por motivação política. Mas outros crimes também foram cometidos por motivação política, como o de ameaça. O ator Whallassy Oliveira, de Imperatriz, conta que foi ameaçado após fazer uma postagem em seu perfil pessoal de uma rede social. “Fui ameaçado de morte por duas pessoas que são da mesma família, são irmãos, na verdade. Eu fiz uma publicação no meu Facebook falando que achava errado a mistura de política com religião. Após essa publicação, eles começaram a fazer pressão psicológica em mim, me ameaçaram de morte no privado e o irmão da pessoa me ameaçou de forma clara e de forma pública na minha própria publicação”, detalha. “Eu fiquei extremamente irritado com a situação, me senti coagido, desprotegido, impotente e péssimo”.

O ator se sentiu pressionado  a não poder exercer o seu direito à liberdade de expressão, mas, apesar disso, ele não prestou queixa em nenhuma delegacia. Ao invés de recorrer diretamente à polícia, ele contou aos seus amigos próximos sobre as ameaças, para caso ele sofresse algum ataque físico ou até mesmo assassinato, as pessoas pudessem indicar os agressores virtuais como suspeitos à polícia.

Denúncia registrada

Já o estudante de Direito, Bruce Carvalho, de Teresina, também foi atacado em uma rede social, após ter discordado de uma visão a respeito da “dívida histórica” proposta por um eleitor do Partido dos Trabalhadores (PT), que o insultou lhe chamando de fascista. O caso foi registrado como crime contra a honra. Bruce relata que não conhecia o seu agressor virtual, mas que sabia o que poderia fazer em relação ao acontecimento. “Já sabia quais medidas tomar. Ser chamado de fascista é uma injúria, crime contra a honra, tipificado no código (penal). Infelizmente a sociedade não conhece seus direitos, para evitar que cenas como essa ocorram”.

A princípio, os policiais não levaram a sério a denúncia do estudante. Disseram que era algo sem relevância. “Eu acho que o escrivão nunca tinha parado para olhar um caso semelhante a este. E ele me perguntando ‘Por que você vai fazer isso?’. Eu respondi: porque é meu direito e ninguém tem direito a ofender minha honra, me chamar de uma ideologia assassina, que eu sou contra. Eu luto contra essa ideia de fascismo e a pessoa simplesmente vem me xingar de fascista por eu não concordar com a ideia de dívida histórica. Então, expliquei a situação e o código, o artigo para ser enquadrado e, no final, ele acabou fazendo a queixa”.

Dificuldade da polícia

Promotor Alessandro Brandão em palestra com estudantes: polícia dever ser capacitada para atender as vítimas

O promotor de Justiça do Ministério Público em Imperatriz, Alessandro Brandão, que também é moderador da página “Se Liga Na Internet”, a qual promove esclarecimento a respeito das consequências de ofensas nas redes sociais, reconhece a dificuldade em tratar desses crimes ocorridos em ambiente virtual na polícia. “A nossa legislação ainda está se adaptando a esses novos crimes. Então, de fato, acredito que haja não uma falta de levar a sério, mas talvez uma falta de estrutura e até de treinamento para investigação desses crimes”. Veja mais detalhes sobre o registro dos casos, entre 2016 e 2018, a seguir:

Segundo ele, as instituições que investigam os crimes, ainda se veem com dificuldade de apurar agressões à honra cometidas na internet, especialmente quando feitas através de mensagens anônimas, por perfis falsos. “É preciso que o Estado invista mais no treinamento dessas instituições, precisa que o Estado invista em instrumentos mais eficazes de investigar esse tipo de crime, que é uma realidade nova”. O promotor  de justiça explica que coibir a intolerância política na internet não é censurar os usuários:

 

Em Imperatriz existe uma Promotoria Especializada de Controle Externo da Polícia, que é justamente para averiguar notícias de eventuais problemas nesses casos quanto à atuação da polícia. “A pessoa então que presta uma ocorrência de vítima de ofensa pelas redes sociais e que eventualmente reparar uma demora anormal na apuração dos fatos, pode procurar o Ministério Público da 7ª e 8ª Promotorias Criminais de Imperatriz, que exercem o controle externo da atividade policial, para que os promotores averiguem o que está acontecendo, se está havendo alguma omissão, algum retardo injustificado, ou se é mesmo a dificuldade de se apurar esses tipos de crime”, esclarece o promotor.  Veja baixo em quais redes sociais os casos aparecem com mais recorrência:

Na tentativa de combater essas e outras agressões, o Observatório de Intolerância Política tem sido lançado em diversos estados brasileiros, incluindo o Maranhão, onde a iniciativa foi tomada através da Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE-MA), Defensoria Pública da União no Maranhão (DPU-MA) e da Ordem dos Advogados do Brasil Maranhão (OAB-MA).O observatório registrou os casos até o final do mês de outubro.

* Reportagem produzida para disciplina Jornalismo Político, do curso de Jornalismo/UFMA Imperatriz. Foto de abertura: reprodução. Infográficos: MPE/DPE/AMPEM.