Imperatriz, uma cidade de muitas culturas: desafios e alegrias dos imigrantes

Mais de cem estrangeiros residem em Imperatriz

Texto: Gislei Moura

879.505. Essa é a quantidade de imigrantes registrada no Brasil entre os anos de 2000 e 2015, segundo pesquisa feita pelo Observatório das Migrações em São Paulo. Os estudos mostraram que, ao contrário do que se pensa, os estrangeiros têm dado prioridade para morar em cidades do interior do país. Essa estatística se comprova com os dados do Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em Imperatriz, o qual indicou que residem no município 106 estrangeiros e 37 naturalizados brasileiros.

O recorte do livro “O cortiço” de Aluísio Azevedo evidencia que a imigração no Brasil não é uma realidade atual, mas sim parte das raízes da história brasileira. “Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele dia a dia, hora a hora, reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e surdo de crisálida. (…) E assim, pouco a pouco, se foram reformando todos os seus hábitos singelos de aldeão português: e Jerônimo abrasileirou-se”. Assim como o personagem do livro, o português Jerônimo, vários outros chegam ao país e permitem-se transformar pela cultura e costumes locais.

“Eu bebi da água do Rio Tocantins, tentei fugir algumas vezes e voltar. Mas sempre acabava aqui”. É assim que o estadunidense David Bailey define sua história com Imperatriz. Ele, que chegou ao país ainda criança, contou que hoje já está bem acostumado à cultura, tendo inclusive se casado com uma brasileira. Atualmente, seus pais e alguns irmãos moram na cidade, onde realizam trabalhos missionários, além de administrarem uma escola de línguas.

Como ele, muitos outros vêm para a cidade com diferentes motivações. Seja para melhorar a qualidade de vida, para empreender ou até mesmo se refugiar de guerras. Imperatriz tem acolhido pessoas de diversas nacionalidades, absorvendo culturas, mas também transmitindo conhecimentos por meio da interação entre brasileiros e estrangeiros, que já é bastante comum no cotidiano do município.

Entretanto, ainda que seja acolhedora, os imigrantes enfrentam algumas dificuldades, tanto externas quanto internas. A exemplo o preconceito, muitas vezes velado, ou a saudade da terra natal. Desse modo, ser um imigrante em terras maranhenses tem sido não só uma aventura, mas também crescimento diário para aqueles que procuram nelas o refúgio.

Mar de rosas… ou nem tanto?

Na terra da miscigenação, estrangeiros convivem com o preconceito velado

O Brasil é conhecido mundialmente por ser hospitaleiro e receptivo. Talvez seja por isso que é a escolha de muitos que deixam seu país. Porém, nos últimos anos não aumentou apenas o número de imigrantes, mas também o de casos de xenofobia. Em 2015, o total de denúncias no Disque 100 da Secretaria dos Direitos Humanos chegou a ser 633% maior que no ano anterior. Por que isso acontece? Não há explicação plausível para atitudes preconceituosas, mas, muitas vezes o conflito surge por medo de perder espaço no mercado ou só mesmo para “tirar graça” com quem não entende a língua portuguesa.

“Sinto preconceito regularmente, mas agressão jamais ou demonstração. Mas o Brasil é assim, é país que te aceita com muita facilidade, mas tem certo preconceito. Brasileiro acha, por ser um país de poucas oportunidades. Tem, mas não é para todo mundo. Então, quando chega alguém de fora e produzindo alguma coisa, ele acha que tirando alguma coisa dele. Não vejo como um preconceito maldoso, mas uma reação”, interpreta o iraniano Kurosh Darakhshan, conhecido como “Iran”, de 45 anos. Ele vive no Brasil há 25 anos, sendo os dois últimos em Imperatriz.

Além dele, Bailey também vivenciou situações desconfortáveis, mas tentando levar sempre para o lado positivo. “Teve uma situação engraçada em que fomos para Amarante e como estávamos falando em inglês, algumas pessoas pensavam que não entendíamos e xingaram a gente. Quando fomos embora a gente disse ‘tchau, prazer em conhecer’, e eles ficaram surpresos”, lembrou.

Em geral, o preconceito se dirige mais a pessoas que vêm de países africanos. “Eu passei por isso no Rio Grande do Sul, quando senta no ônibus, ninguém senta do seu lado. Aqui também (em Imperatriz), mas só lá essa situação. Algumas pessoas pergunta: ‘você prefere seu coro (cor)?’, e digo ‘é claro que prefiro meu coro’”, contou o senegalês Bili Boiam, de 24 anos.

Mas, ainda assim, todos concordam que a cidade tem um ambiente mais tranquilo e respeitador que em outros lugares. Fato que contribui para que o Brasil ocupe o 51º lugar no ranking de aceitação a estrangeiros, em pesquisa da consultoria Gallup, realizada entre 2016 e 2017, ficando à frente de países como Rússia, Israel, Polônia e Grécia. Para os entrevistados, ainda que aconteçam algumas situações desagradáveis, Imperatriz é boa para morar e as pessoas respeitam, são acolhedoras e receptivas.

“Em São Paulo eu casei com uma moça brasileira e nós ganhamos filho. E São Paulo não é lugar aconselhável para criar filho, não é que é lugar ruim, mas outros cria filho nosso. Então, como minha mulher era daqui e minha sogra podia estar presente, nós pensamos ‘que tal nós vamos para Imperatriz?’, porque aqui é bom para criar filho”, contou Iran sobre os motivos que o atraíram para a cidade. Outro que se sente em casa é o sírio Nidal Hanna Boutros, de 30 anos. “Tem coisa bom, tem coisa ruim. Eu gostei, de Imperatriz eu gostei demais. Parece com minha cidade lá na Síria, pequeno e tem tudo”, contou.

Ou seja, ainda tem muito a ser melhorado, é necessário que sejam implementadas políticas públicas mais eficientes, já que somente 1% dos casos de xenofobia vão a julgamento. E em Imperatriz não há órgãos oficiais de apoio aos imigrantes. Porém, na contramão das cidades grandes, que registram a maior parte dos casos de preconceito contra estrangeiros, os cidadãos têm respeitado e convivido bem com as diferenças, seja nos costumes ou na língua. Há um esforço para que os que chegam de fora se sintam bem recebidos.