Entrevista: prefeito com o maior índice de votos no Maranhão fala sobre pandemia, pretensões e rivalidades políticas

Repórteres: André Sousa e Tiago Leitão

Fotos: Assessoria de Imprensa Lahesio Bonfim

O médico Lahesio Rodrigues do Bonfim, 42 anos, tinha como grande sonho, desde criança, se tornar prefeito de uma cidade. Natural de Marcos Parente (PI), ele foi eleito prefeito da pequena São Pedro dos Crentes em 2016. De lá para cá coleciona manchetes em veículos de imprensa, sendo conhecido como o prefeito que doa o próprio salário para a construção de casas populares no município. Em 2020 ele foi reeleito para mais 4 anos de mandato com 90,11% dos votos válidos. Um recorde no Maranhão.

Lahesio (PSL) é um dos maiores apoiadores ao atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Estado, e faz oposição ao governador Flávio Dino (PCdoB). Pré-candidato ao governo do estado nas eleições do ano que vem, o político tem posicionamentos polêmicos, mas bem definidos, com relação ao tratamento dado pelas autoridades à pandemia. Ele diz que o aporte financeiro dos adversários deve ser o seu maior obstáculo na corrida eleitoral que se aproxima.

A pandemia da Covid-19 surpreendeu as autoridades de saúde no mundo todo. Até mesmo as metrópoles mais bem preparadas, com médicos, insumos e aparelhos de primeira linha, acabaram colapsando e demonstrando fragilidade diante de um vírus que se espalha facilmente. Então como um município pequeno enfrenta um problema de saúde pública mundial? São Pedro dos Crentes tem hoje 4.651 habitantes. Segundo o último boletim epidemiológico, são 304 casos confirmados da doença e 3 mortes. O município não registra nenhum óbito por coronavírus há 7 meses.

Em suas redes sociais, o prefeito reforça que a tranquilidade na pequena cidade se dá por conta das medidas preventivas que as autoridades locais de saúde tomam. Em entrevista concedida ao Imperatriz Notícias, o prefeito falou sobre como a cidade tem encarado a pandemia, explicou declarações dadas a outros veículos de imprensa, reforçou o desejo de chegar ao governo do estado e defendeu seus ideais políticos.

1 – Imperatriz notícias: No dia 9 de março o Brasil registrou 1.954 mortes em um único dia, ocasionadas pelo vírus Covid-19. Esse número representa quase metade dos 4.6 mil habitantes do município o qual você é prefeito. Como uma cidade pequena lida com a pandemia?

Lahesio Rodrigues do Bonfim: A gente procurou transmitir naturalidade para o povo. Não trazer o medo. Eu acho que o principal foi transmitir tranquilidade ao povo. Não dizer que eles não deviam tomar nenhuma medida, é… Para se protegerem contra o vírus, mas nós transmitimos a tranquilidade de que existia uma saída. Como médico, eu aproveitei da relação médico – paciente para dizer ao povo: existe uma saída, vamos nos prevenir. E o povo acreditou. Tanto é que há sete meses que nós não temos uma morte e a mais de duas semanas que eu não tenho um caso novo. Nunca mandei ninguém pra UTI na minha cidadezinha e o povo fica tranquilo. Graças a Deus existe um ambiente de tranquilidade na minha cidadezinha. Mesmo com tantas mortes.

“Olhe, nós temos o básico e ao mesmo tempo ele é bem utilizado. Nós temos um hospital de 20 leitos, então isso daí dá confiança para o povo. Um hospital de 20 leitos, bem equipado, com medicamento”

2 – IN: O que você diria que está ao seu alcance, como líder político na sua cidade, na hora de combater uma crise na saúde como a que todos estamos passando?

LRB: Olhe, nós temos o básico e ao mesmo tempo ele é bem utilizado. Nós temos um hospital de 20 leitos, então isso daí dá confiança para o povo. Um hospital de 20 leitos, bem equipado, com medicamento. Então é um povo que tem um prefeito que a mais de quatro anos nunca deixou faltar um equipamento hospitalar. Ele [o hospital] tem Ultrassom, Raio X, eletrocardiograma, ele tem a medicação. Então isso passa um ambiente propício para que o povo não venha se desesperar, ponto. Isso é um fato. E no mais, nós temos um preparo, como médico, o povo também tem essa confiança que é o diferencial da minha cidadezinha. Então, aquela medicação que se usa numa UTI, então eu não entregaria um munícipe a um tubo, pronto! Isso é uma tese que eu gravo, eu tenho comigo. Então eu tenho essa como uma tese, então tudo que um precisaria na pandemia, eu tenho na minha cidadezinha. Então é tranquilo também por isso. [Alguém pode dizer] “Há mais na tua cidade não tem um respirador”, realmente não tem respirador. Eu sou especialista em UTI e eu digo que não precisa de um respirador. Pronto! Ao contrário de todo o Brasil, é isso, é a minha posição. Então a minha cidadezinha tem tudo que se precisa para se fazer o combate ao coronavírus. Tudo o que precisa tem na minha cidadezinha.

3 – IN: Em uma entrevista o senhor falou que a intubação de pacientes é prejudicial a quem está em estado grave nas UTIs. Você ainda mantém essa opinião?

LRB: Então vamo lá! Quando se estuda um medicamento para dizer que ele é eficaz, ele precisa apresentar ao menos 50% de eficácia. Não é isso que diz? 50% de eficácia. Hoje no Brasil morrem dois a cada três que são intubados. Ou seja, sete pacientes em cada 10 ainda estão morrendo ao serem intubados. Ou seja: a eficácia não chega a 30%! Se a eficácia não chega a 30%, como é que você me diz que o tubo é alguma coisa que vai salvar vidas? Não. Ele [o tubo] vai só tentar manter o paciente vivo até que as drogas façam efeito. Agora se você me dissesse que os corticoides usados dentro de uma UTI fazem o efeito. Aí eu acredito e assino embaixo. O turbo é só pra manutenção da vida até que o medicamento faça efeito. Eu acho que a gente deveria ter investido muito mais no medicamento do que em compra de tubo.

4 – IN: O senhor tem a pretensão de se candidatar ao governo do estado nas próximas eleições. O que você faria de diferente em relação ao atual governo?

LRB: Eu não teria medo de ir contra a maré, eu teria feito diferente. Assim como o STF disse que, hoje o estado, o município, tem autonomia para gerir a sua saúde na pandemia. Então o que eu faria? Eu faria diferente, eu usaria as minhas atribuições como eu fiz. Olhe, pronto, eu sou um exemplo vivo do que eu fiz diferente. Eu fiz totalmente diferente do governo do estado. Eu não fui montar uma UTI, que eu não tinha dinheiro pra isso e nem pedi dinheiro pra isso. Eu tenho um hospital pra isso, mas não montei uma UTI. Eu não fui comprar um respirador de 700, de 300 mil, de 200 mil, de 100 mil, de 70 mil. Eu investi em quê? Em medicamentos que possam prevenir o estado grave do Covid. Pronto, eu faria diferente. Isso eu faria diferente. Agora, a orientar o povo a tomar medidas preventivas do Covid, eu orientei também. Eu orientei: ó, usem máscaras, façam isso, façam aquilo. Mas aí, a justiça disse: abram tudo e vão fazer comício, vão aglomerar. O povo perdeu o medo. Aí eu não tenho mais, qual é a moral que eu tenho pra dizer pro meu povo agora? A justiça me tirou o moral.

5 – IN: O senhor foi reeleito na sua cidade com mais de 90% dos votos válidos. O que você acredita que foi determinante para que se tivesse tamanha aprovação?

LRB: Olhe, o trabalho foi fundamental. Enquanto os outros políticos, os outros prefeitos, tem aquela coisa na cabeça de que eles devem trabalhar só no último ano porque a memória do povo é curta. Eu não. Eu fiz um caminho inverso: eu trabalhei em 2017 como prefeito, em 2018, em 2019 e em 2020. Então o povo chegou e disse assim: para quê mudar de prefeito, se o prefeito está trabalhando, se todos os anos ele trabalhou? Credito a votação ao meu trabalho. O trabalho foi eficiente. Você vê um hospitalzinho de 20 leitos numa cidade pequena de cinco mil habitantes. Mas que tem um raio X que funciona, que tem uma ultrassom que funciona, que tem um eletrocardiograma que funciona, que tem um centro cirúrgico que funciona – que a mulher engravidou e vai parir na sua cidade; que o homem tem uma hérnia, mas vai tirar na sua cidade; o útero tá doente? Vai fazer uma histerectomia na sua cidade. Então isso dá o quê? Faz com que o povo sinta-se bem representado. Mudar pra quê? Então a votação foi expressiva pelo trabalho.

“Eu queria três desejos: 3 escolas, 1 ginásio poliesportivo e 4 quilômetros de asfalto. Aí eu transformava a minha cidade na coisa mais linda do mundo”

6 – IN: O senhor ficou conhecido em todo o país por doar o salário para a construção de casas populares. Por que tomou essa decisão?

LRB: Olha, era uma coisa, um desejo que quando eu me tornei prefeito, era um sonho de vida. Então eu disse: quando eu for prefeito eu quero ser O prefeito e não só mais um. Eu queria realizar meu sonho de vida como prefeito em um mandato apenas. Então, eu sou uma pessoa bem sucedida, eu nasci num lar bem humilde, mas bem humilde mesmo. Então, hoje eu tenho como ganhar o meu pão sem precisar ser prefeito. Eu sou médico, eu tenho minha profissão, eu tenho um concurso público federal. Então eu podia muito bem pegar esse salário e fazer uma casinha todo mês. E você dizer assim: ah, mas o prefeito, então se reelegeu porque ele tem atitudes populistas? De forma alguma! Se fosse por isso o Assis [prefeito de Imperatriz] não tinha tirado 28% dos votos, tinha se reelegido com 28% dos votos. Porque eu vi bairro que tem mais de mil casas construídas, três mil casas construídas. Eu construí só 60 casas no meu primeiro mandato, mas construí só com o dinheiro da prefeitura, não foi com o Minha Casa, Minha Vida. Mas não foi por conta da atitude populista. Olhe, eu tenho números: nós tiramos o IDEB, você como jornalista, você sabe, a única coisa que muda um povo é a educação. E nós tiramos a educação do patamar do IDEB 113º posição, pra 2º do Maranhão, em três anos! Então existe todo um conteúdo, uma gestão pública, um bom uso do dinheiro público. Um prefeito que consegue, mesmo tendo o 3º menor orçamento do estado, consegue dar um 14º salário aos professores, por quê? Porque eles desenvolveram um bom trabalho durante o ano, sabe? Eu consigo dizer que sou o prefeito que mais fez salas de aula em todo o estado do Maranhão com recursos próprios. Eu consigo dizer que fui o prefeito que mais fez casas populares com recursos próprios em todo o Maranhão. Então, nós temos números que falam a favor da nossa gestão. Esse é o grande diferencial.

7 – IN: Quais você acredita que serão os seus maiores obstáculos na campanha ao governo do estado?

LRB: Eu sou pequeno, né? Eu sou um prefeito da 3º menor cidade do Maranhão, então eu sou um homem de poucos bens materiais. Eu sei do meu potencial como gestor, como político, mas o estado, o aporte financeiro do estado, dos meus adversários, talvez seja o mal maior hoje em dia é o aporte financeiro dos adversários, né? Eu não tenho um aporte financeiro e infelizmente ainda hoje neste país, ainda se faz política com dinheiro, né? E muita das vezes com dinheiro público. Eu vou enfrentar dois senadores da república, um vice-governador, um governador. Então, eu vou enfrentar, eu sou prefeito e vou enfrentar dois senadores, um vice-governador e um governador. Então o maior entrave, o meu maior desafio é superar o poder financeiro dos meus adversários.

8 – IN: Há alguns dias atrás o senhor divulgou um vídeo questionando o governador Carlos Lula a respeito da quantidade de vacinas aplicadas em São Pedro dos Crentes. Como o senhor explica essa situação?

LRB: Olha, é muito simples, eu tenho provas e provas são fatos e contra fatos não existem argumentos. Quando eu fiz esse vídeo eu tinha as minhas razões, porque eu fui no sistema e olhei no sistema. O sistema do estado diz que o São Pedro dos Crentes recebeu até aquele dia 278 doses de vacina e a gente tinha recebido 304 doses. Então é um sistema desatualizado. Aí você pergunta: não é vocês que alimenta o sistema do estado? Não. Quem alimenta o sistema do estado é a própria secretaria estadual. A minha orientação é alimentar o portal do Ministério da Saúde que é quem tá me concedendo as vacinas. Então o MS me dá a vacina e me orienta a prestar conta no site do Ministério da Saúde. E aí eu vi, que quando ele me fez aquela acusação, eu fui pra dentro do sistema, fui para os meus vacinadores e aí eu vi. Nós vacinamos cinco pessoas com mais de 100 anos, aí quando eu fui olhar no site do governo do estado, que estava desmoralizado por si só, porque eu tinha recebido 304 doses e lá só tinha 278. Eu já sabia que estava desatualizado. E aí quando eu fui olhar no site do governo do estado, só tinha uma pessoa com mais de 100 anos vacinada. E no nosso sistema, no sistema do MS nós já tínhamos cadastrado e vacinado há mais de meses cinco pessoas. Então por si só eles não têm a moral pra discutir números comigo porque eles não têm atualização. Se você dissesse assim: eu quero fazer a minha postagem com provas. Eu te mando. Eu te mando o cadastro que eu fiz das cinco pessoas que foram vacinadas, com o dia certinho, mês, o dia e o mês que foram vacinadas, cinco pessoas com mais de 100 anos. E te mostro o site do governo estadual, que eu fiz o “print”, e lá só tinha uma pessoa com mais de 99 anos vacinada no município São Pedro dos Crentes. Moral da história: o sistema do governo do estado é desatualizado ou então eles não atualizam a página da minha cidadezinha pra me perseguir. Eu não sei o que tá acontecendo. Eu sei que nós estamos com a razão. Eu já tinha vacinado naquele dia quase 90% das vacinas que me deram. Então, se alguém tem razão, esse alguém sou eu. Tanto é que na mesma semana eles mandaram a vacina. Eles não deixaram de mandar a vacina.

9 – IN: Você declara ter um posicionamento político oposto ao do atual governador do estado, Flávio Dino. Você acha que isso prejudica a relação da administração municipal com a estadual?

LRB: Olhe, quando a gente faz oposição tem que saber por que faz oposição. Eu tenho meus motivos. Eu votei no Flavio Dino [atual governador do Maranhão] duas vezes na minha vida: votei quando ele perdeu e votei na primeira vez que ele ganhou. Depois eu fui no Palácio [dos Leões] e ele quis me dar uma aula de gestão, ME HUMILHOU. Ninguém sabe disso. Ele [Flavio] já me humilhou dentro do Palácio dos Leões, às 6h30 da tarde no dia 29 de junho de 2017. E a gente nunca esquece. Além de ser político, eu sou homem e eu tenho meus princípios. Não é porque eu sou político que eu tenho que largar os meus princípios e jogá-los de lado. Então naquele dia eu decidi que seria adversário. Mas por ser adversário, eu nunca deixei faltar nada pro meu povo. Ele deu ambulância pra 216 cidades, só faltou dar ambulância pra minha cidadezinha. Das 217 cidades ele deu pra 216 municípios. E eu posso reclamar? Eu posso reclamar, por assédio. Eu sofri um assédio moral pode-se dizer isso. Porque o cara [Flavio Dino] que dá 216 ambulâncias pros outros municípios e não dá pra mim, ele tá me assediando, ele tá me perseguindo. E se fosse outro, podia tá aí piores, ter processado, isso e aquilo, mas não. Como ele [Flavio Dino] faz sempre com o Bolsonaro quando ele acha que tá sendo assediado pelo Bolsonaro. Eu não. Eu encarei como se fosse um adversário e, como adversário, eu tenho qual é o meu lugar e o meu lugar é esse. Tá com mais de três anos e seis meses que eu nunca recebi um incentivo só, um centavo. Até junho de 2017 eu ainda recebia 60, 70 mil reais pra gerir o meu hospital de 20 leitos. Depois daquele dia [a humilhação] eu nunca mais recebi 70 mil reais pra gerir o meu hospital. Eu recebo 9.800 reais pra gerir um hospital de 20 leitos e dinheiro do Governo Federal. Mas nem por isso eu reclamo. E nem por isso eu deixei faltar de fazer as coisas no meu município.

10 – IN: Mesmo com um discurso liberal com relação ao funcionamento do comércio e o uso de máscaras o senhor não liberou a realização de eventos na cidade e comunicou a decisão através das redes sociais. Essa medida não vai à contramão do seu discurso?

LRB: Não. Não é porque eu tenho bons números que eu vou ser irresponsável. Olhe, aglomerar na minha concepção significa: se eu faço uma vaquejada, vai vir vaqueiro de todo o estado, vai vir vaqueiro talvez de todo país. Porque está tudo fechado nesse país, arrumaram uma vaquejada que vai dar um prêmio de 50 mil reais! Vai vir vaqueiro do Pernambuco, vai vir vaqueiro de São Paulo, vai vir vaqueiro de todo país. Tá todo mundo fechado. Todos os circuitos de vaquejadas tão fechados. Então eu não posso, não é porque eu tenho bons números que eu tenho que ser irresponsável, eu não posso ser irresponsável. Eu tenho que cuidar do meu povo, da minha população. Então eu sei o que é errado. Agora você vai dizer assim: “e você também da dizendo que vai abrir as salas de aula no dia 29 de março”. Vou abrir a sala de aula. Porque a sala de aula é diferente de uma vaquejada. A vaquejada eu vou trazer público de outras cidades, a minha sala de aula vai ser aberta pros alunos da minha cidade, onde tem um controle  sanitário, onde existe um controle da pandemia.

11 – IN: O que você pediria ao presidente Jair Messias Bolsonaro?

LRB: Se eu fosse pedir alguma coisa pro Jair Messias Bolsonaro, eu ia pedir recursos pra eu fazer 3 escolas no meu município, 3 escolas eu estava feliz. Eu queria 1 ginásio poliesportivo e eu queria 4 quilômetros de asfalto. Eu queria três desejos: 3 escolas, 1 ginásio poliesportivo e 4 quilômetros de asfalto. Aí eu transformava a minha cidade na coisa mais linda do mundo. Ela já é a cidade mais linda desse Maranhão. Mas com esse recurso, ah ia ficar lindo demais! Ia ficar lindo.