Desafios do Jornalismo na Pandemia: Entrevista com a repórter e ex-aluna da UFMA Leiliane de Araújo

Repórter: Paulo Maciel

Foto1- Francisco Paiva / Foto 2- Arquivo Pessoal

 

O jornalismo faz parte das atividades que não pararam durante a Pandemia da Covid-19. Expostos ao risco de contrair o vírus, os profissionais da comunicação estão diariamente na linha de frente no combate a doença, seja registrando o que acontece nos hospitais, compartilhando os números de contaminados, de mortes ou mostrando formas de proteção e cuidados contra o vírus. Nossa entrevistada, a Jornalista Leiliane de Araújo, é formada pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e atualmente é repórter na TV Difusora Sul, afiliada da emissora SBT.

Leiliane de Araújo iniciou sua carreira na profissão de jornalista no ano da pandemia, o que para ela foi um desafio gigantesco. Nessa entrevista ela relata os momentos de insegurança, incertezas, os desafios que teve que enfrentar durante a pandemia como profissional da comunicação e como ela analisa a importância do jornalista e o seu papel fundamental para ajudar a população diante desse cenário trágico de tantas contaminações e mortes pela Covid-19.

Segundo dados da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), 169 profissionais da área da comunicação morreram no Brasil por causa da Covid-19. Além do risco maior que é a morte, outros problemas como ansiedade, precarização do trabalho, desgaste físico e mental, baixo rendimento, afetaram a vida dos profissionais durante a pandemia. Mesmo diante de todas essas dificuldades, nossa entrevistada Leiliane de Araújo acredita que é possível fazer um jornalismo de qualidade e com responsabilidade na informação dos fatos. Confira na entrevista a seguir:

 

Imperatriz Notícias: Qual o papel do jornalismo diante dessa pandemia?

Leiliane de Araújo: A missão do jornalismo, seja diante de uma pandemia ou não, é e sempre será levar informação de qualidade, informação verídica.  Claro que nossa realidade pede um olhar ainda mais apurado. Temos um vírus que está matando milhões de pessoas mundo a fora, além disso, existe o vírus da fake news que acaba prejudicando muita gente, é aí que o trabalho jornalístico responsável e comprometido se faz necessário, vivemos uma guerra de muitas batalhas a serem vencidas.

 

IN: Como você disse, além da pandemia da Covid-19, o Brasil vive uma epidemia de desinformação causada pelas FakeNews. Como combater essa desinformação e levar informação relevante e de qualidade para o público? 

LA: Fake news é um vírus que circula pelo mundo desde antes da pandemia, mas nesse cenário se tornou também responsável por essa crise e por muitas mortes. Com os bombardeios de informações falsas o processo de filtragem e checagem se tornou ainda mais necessário, uma vez que só se combate uma notícia falsa com notícia verdadeira, com informações verídicas, e esse é o papel que o jornalismo deve desempenhar mesmo diante de tantos desafios.

 

IN: Falando em desafios, durante a pandemia um conflito muito presente foi entre o Presidente e a imprensa. Por diversas vezes, Bolsonaro desrespeitou os jornalistas e já chegou a deslegitimar a pandemia da Covid-19, que atualmente matou mais de 370 mil pessoas só no Brasil. Qual análise você faz da relação do Presidente com a Imprensa e como essa relação afeta o trabalho dos jornalistas?

LA: A relação entre Presidente e Imprensa é ácida, nitidamente.  É necessário assumirmos que temos um grande problema nessa relação de ódio e rancor, que se arrasta por toda a carreira política do nosso representante maior. Ignorar a gravidade da pandemia é só uma das formas de desrespeitar a população brasileira. O desrespeito aos jornalistas é uma forma de mostrar a falta de inteligência. Quando você não tem capacidade de argumentar, você grita, agride. E essa relação acaba que desvalorizando os jornalistas, infelizmente.

 

IN: De 2020 a 2021, 169 profissionais da área da comunicação morreram por causa da Covid-19. De acordo com sua realidade, houve irresponsabilidade dos veículos de comunicação com relação a exposição dos profissionais?

LA: Comecei a trabalhar na TV em meio a essa crise que já não é somente sanitária. Os cuidados são responsabilidade de todos, empresa e funcionários. No meu local de trabalho tem uma pia logo na entrada, então a higiene começa dali. Ao bater o ponto tem álcool em gel bem do lado. Higienizo minha mesa todos os dias e ando com dois tipos de álcool pra todo lado. Mesmo com tanto cuidado testei positivo para covid-19 em fevereiro e graças a Deus foi leve. Foi a primeira vez que tive contato com o vírus desde que iniciei na TV, há oito meses, e a segunda desde que tudo isso começou. Estamos expostos todos os dias, mas costumo dizer que sou um soldado que se preparou pra guerra e não posso fugir no momento de lutar.

“Comecei a trabalhar na TV em meio a essa crise que já não é somente sanitária. Os cuidados são responsabilidade de todos, empresa e funcionários”

IN: Por conta do isolamento social e a distância, a comunicação focada mais no online exige ainda mais responsabilidade para manter o nível de qualidade na apuração e apresentação dos fatos. Qual sua opinião sobre o Home Office? O jornalismo ganha ou perde com esse novo formato de fazer jornalismo em casa?

LA: O jornalismo perde, e muito. Apesar de ter iniciado minha caminhada no jornalismo em meio a pandemia, sempre acompanhei alguns repórteres que hoje são meus colegas de trabalho. A forma de transmitir a informação teve suas mudanças, mas a de “correr atrás dela” ainda se mantém. Os repórteres são a linha de frente do jornal. Eles enfrentam os perigos da externa. Ir no local sempre se fez necessário, principalmente para a TV. Os repórteres são os olhos do telespectador, então com medo ou sem medo do Coronavírus, a matéria precisa ir ao ar, mas claro que da maneira mais segura possível, então se for preciso, vai ser de casa mesmo. Por sorte, as mudanças também chegaram na forma de participação das fontes. Eles podem gravar de casa e todo mundo fica mais protegido dos perigos externos. O lado negativo é que a fonte vai falar o que quiser, sem a naturalidade de uma pergunta surpresa do repórter.

 

IN: Quais dificuldades encontrou no seu trabalho durante a pandemia?

LA: A dificuldade maior é fechar a matéria. Relatar sobre os casos de dengue, por exemplo, é bem desafiador em tempos de pandemia. Aquela velha imagem da dona de casa cuidando das plantas, virando garrafas, mantendo tudo organizado para evitar o mosquito nem sempre dá pra fazer. O receio de ir no ambiente alheio é muito grande e nos freia muitas vezes. Nós nos preocupamos. Para mim as fontes são especiais. Não posso ameaçar a segurança delas e nem elas a minha. Tenho essa dificuldade, de me aproximar das pessoas exatamente porque muitas delas não usam máscara.

 

IN: Quais medos você teve em exercer seu trabalho durante a pandemia?

LA: Eu tive medo de sair pra rua e conversar com as pessoas, tenho medo de ser infectada por uma terceira vez e trazer o vírus pra casa. Tenho medo de colocar as fontes em risco. Tenho muitos medos, na rua as pessoas não querem usar máscara, isso é horrível pra gente que precisa entrevista-las.

 

IN: Quais impactos a pandemia teve com relação as suas habilidades profissionais?

LA: Por estar iniciando minha caminhada na TV já no período de pandemia, todas as minhas habilidades estão sendo descobertas agora. Vou ter dificuldades é depois que não tivermos mais que usar máscara, por exemplo, (Risos).

 

IN: Com relação a produção e desenvolvimento das pautas, com a pandemia e o tema saúde em alta, existe uma pressão para se produzir e executar muitas pautas de saúde?  Como funciona esse processo?

LA: Não é que existe uma pressão para produzir matérias sobre saúde, é que o tema bate na porta da redação todos os dias. Estamos vivendo a maior crise sanitária da história, todo dia tem um recorde de mortes, todo dia tem uma remessa de vacinas, efeitos colaterais, filas de vacinação, ocupação de leitos, e por aí vai. A realidade é essa, infelizmente temos que estar noticiando isso. Particularmente é cansativo demais falar do assunto quase sempre.

 

IN: Com relação aos cuidados contra a Covid-19, você considera seu ambiente de trabalho um local seguro? por quê?

LA: Por mais cuidados que tenhamos nenhum local é seguro. Nenhum. Estamos lutando contra algo invisível que de modifica e ganha força constantemente. Não tem como dizer que é seguro.