“Cabelo bom é cabelo volumoso”: entrevista com a proprietária do salão Crioullo’s

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Texto e fotos de Érika Nogueira

Demorei um pouco até encontrar o único salão especializado para cabelos cacheados, crespos e afro de Imperatriz. Não havia uma faixada grande e chamativa como vemos normalmente em todos os salões. Passei três vezes pela mesma rua, até encontrá-lo. Quando enfim cheguei à porta, lá estava ela, Jacilene Alves Viana, vestia-se de um sorriso enorme e uma ‘coroa’ na cabeça, como ela mesma intitula seu turbante. Percebi o quanto que a simplicidade nos faz sentir em casa. Não havia todos aqueles produtos, chapinhas ou secadores encontrados nos salões de beleza comuns. Química? Nem pensar. Definitivamente eu não estava em salão normal.

Sentei ao lado de Jaci que demonstrou ser muito simpática e atenciosa.  Solteira, mãe de três filhos, formada em magistério e soldadora por profissão, foram os cuidados de Jaci com o seu cabelo que motivou a negra de cabelos crespos a abrir seu próprio negócio.

O Salão Crioullo´s é visto pelas cacheadas de Imperatriz como símbolo de resistência. A proprietária conta em entrevista que já sofreu muito preconceito por causa de sua estética, e que já renegou as suas raízes crespas por não se enquadrar aos ‘padrões’ da sociedade. Porém, a microempresária orgulha-se de sua cor e de suas origens, que faz de sua luta a sua história.

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Em algum momento da sua vida você chegou a alisar o seu cabelo?

Sim, a educação que temos desde criança é essa, que para sermos aceita, na escola ou em outros lugares, não podemos assumir nossas raízes crespas. O que ouvimos é que o cabelo é feio e que o liso é o padrão. Isso vem até mesmo de nossa mãe e não queremos ficar de fora, então somos sujeitos a aceitar, por não possuirmos voz, pois quem decide se o cabelo vai ser liso ou não, é a mãe.

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Jacilene assumiu seus cachos, fez disso sua profissão e hoje é símbolo de resistência

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Como você se libertou da ditadura do liso?

Com as frustrações. A química nunca corresponde à expectativa, por nosso cabelo não ter como aceitar, nossa fibra não resiste a tantos processos. Eu sempre trouxe isso comigo de ser uma negra, negra, quando pude respirar o meu próprio oxigênio de sair de mãe e pai, foi quando decidi. Não tinha o que fazer, se alisa cai, se você passa uma selagem cai. Sempre busquei a minha história, e nunca esqueci que meu pé está na senzala, isso nos dá um pouco mais de confiança, e só então conseguimos resistir.

Quando você se ‘auto-reconheceu’ como mulher negra?

Isso sempre andou comigo, eu nunca quis embranquecer a minha alma até nos grupos de amigos, sempre me achei diferente, em relação a isso de ser negra e de me assumir, de não aceitar brincadeirinhas que detonem ou que venha denegrir a minha imagem e a dos meus antepassados.

Você se sente satisfeita com sua aparência?

Eu amo de paixão. Na minha casa, só eu sou negra, meu avô era negro e meu bisavô era escravo. Essa é a marca de minha luta, você ser feliz consigo mesmo, ser feliz com seu black, seu cacheado, seu crespo. Somos lindos demais, nossa raça é linda demais, e a negra que quer ser lisa ela vai ser, a negra que quer ser loira ela vai ser, mas ela sabe que o pé dela está na África, e sabe que o lugar dela é na luta.

Você já sofreu preconceito por conta disso?

Sim, essa é uma parte que tem no currículo de todo negro, tanto do homem, da mulher e da criança. O Brasil é o país mais preconceituoso do mundo, pois tem lugar que sabemos que as pessoas não gostam de negros, e eles deixam isso bem escancarado, você pode até ir, mas sabe que ali, estará sendo julgado. O Brasil não, eles fazem de conta que gostam, mas no fundo não é assim. Então na sua frente diz de um jeito, não é de falar, mas conseguimos perceber em um olhar, em um gesto, não precisam nem mesmo dizer algo. Tem situações que nos deparamos que sentimos dentro do coração, que tem algo de errado. Eu já usei tranças, tipo dread. Uma vez, fui a uma farmácia, e eu percebi que por ter entrado lá, me olharam de forma diferente, uma moça ficou me acompanhando o tempo todo, nunca tive muita preocupação de andar com roupas combinadas e como eu tinha o cabelo afro, já assumido, não havia como não levantar uma “suspeita”. A família negra sofre isso, todo mundo tem um pé atrás, quando se trata de um negro, principalmente quando se trata de um negro com dread ou uma crespa, você quase nunca é bem recebido.

No geral a mídia impõe um padrão de beleza a ser seguido. Até pouco tempo a beleza afro não era evidente como agora. Você sente que sua mudança é decorrente da mídia?

Não, para algumas pessoas isso é moda, mas para nós isso é resistência, de brigar pelo nosso espaço, e ter que nos assumir, não precisa gostar, mas tem que respeitar, então não é moda é a nossa luta. Mas isso acontece porque o balde encheu e derramou, não temos mais que seguirmos um padrão para sermos aceito.  Então vamos entrar em uma multinacional, em uma igreja, em um restaurante chique, com o cabelo lá no alto e iremos ser muito bem tratados, o garçom vai ter que vir e perguntar o que a gente quer, não tem essa mais não, fico revoltada quando escuto que essa reação é moda, de que o turbante é um acessório de ultima tendência, de que um cordão grande é ultima tendência, não, isso é uma marca dos escravos, faz parte da nossa história.

Você faz do seu salão a sua bandeira?

Faço, eu sempre falo que a mulher negra tem que se cuidar, tem que ser abusada, no bom sentido, tem que estar bem, esteticamente, e isso é muito importante. Não fugimos de nossa luta nem queremos nos embranquecer em nenhum momento, queremos sempre estar com um cordão grande, um brinco grande o cabelo alto, sabendo que não estamos roubando nada de ninguém, só pegando o que é nosso, em busca de direitos iguais. Eu acredito, e sempre bato na mesma tecla, podemos dizer que a mulher negra é uma mulher solitária, porque até do próprio parceiro negro, ela sofre racismo e preconceito. O homem negro ele quer uma companheira branca, para dar status a ele, ele não quer uma negra ao seu lado, então, quando se trata de mulher solitária nós estamos no topo. Quando uma cliente vem nos procurar ela não está com o cabelo feio, ela está com a alma ferida. Ela vem em busca de consolo, e fazemos isso, porque quando você se aceita, quando se empodera da sua pele, da sua história, do seu cabelo ai não tem mais importância a opinião de a, b ou c.

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“A química nunca corresponde à expectativa, por nosso cabelo não ter como aceitar, nossa fibra não resiste a tantos processos”

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Brancas e loiras costumam frequentar seu salão?

O salão é bem frequentado por mulheres brancas sim, mas elas buscam na maioria das vezes, tranças. Mas há procura também de dreads, que combina muito com a pele branca, geralmente quando uma loira ou lisa procura o Crioullo`s, é porque ela admira a beleza afro, e deseja ser empoderada como a mulher negra. Mas sabemos que não são só as negras possuem cachos, então há este lado também, para fugir da química, é bem mais fácil começar com as tranças, porque o processo da transição é demorado, e eu percebo nas minhas clientes, o medo principalmente do volume, elas sentem vontade de possuir um cabelo livre da química, mas ficam preocupadas com a opinião de terceiros,   mas temos que aceitar que cabelo bom é cabelo volumoso.

O que é ser empoderada?

Ser empoderada é ser uma negra, uma mulher que não tem vergonha de sua história, sabendo que ela honra cada irmão negro que sofreu, cada negro que foi jogado de um navio para chegar ao Brasil, é não ter vergonha de dizer, eu sou negra mesmo e dai? . Meu sangue é igual a qualquer outro sangue, não desrespeitando os brancos, porque o que queremos, é dizer que somos iguais, não tem o bom ou ruim, o empoderamento é isso. Se eu te chamar de negra na rua e você dizer ‘eu não sou negra, sou morena’. Que cor é essa? Que raça é essa? Costumo dizer que ser negro é um presente tão bom, que cheira, todos sabem que nossa pele aguenta trancos e barrancos, se pudéssemos colocar em nosso rosto e em nossa pele o tanto que a gente já sofreu, realmente era pra sumir do mundo.

O que as mulheres buscam em seu salão?

Primeiramente é autoestima, um cabelo bem chocante, que possa definir o bem estar delas, elas sabem que hoje o seu cabelo é símbolo de resistência, é isso que elas buscam, além da estética, desejam igualdade, querem ser aceitas em qualquer ambiente, sem ser julgada por sua cor, ou por seu penteado. Então posso dizer que desejamos liberdade.

O que não se pode fazer em cachos de jeito nenhum?

Selagem, porque é uma química muito agressiva e em nenhum momento corresponde à textura dos fios de nossos cabelos. Há vários tipos de selagem, mas todas possuem certa quantidade de formol, dizer que selagem baixa o volume e hidrata o cabelo sem prejudicar, é mito. Então nenhum tipo de química deve ser usado em cabelo cacheado, em nosso salão procuramos usar sempre produtos orgânicos, às vezes usamos cremes, mas sempre acrescentamos óleos, para nutrir e hidratar o cabelo.

Qual é sua inspiração?

Minha inspiração é a vontade de ser livre, vontade de conseguir ter uma identidade negra. Conscientizar as negras de serem negras, de resistência de luta, de não baixar a cabeça para nenhuma situação, e mostrar que elas são lindas.

Muitas mulheres têm medo de assumir ou aceitar seu cabelo, que dicas você daria?

Eu digo que primeiro, trabalhe seu coração, porque não é algo de fora para dentro é de dentro para fora, você ouve dos seus pais que seu cabelo é ruim, eu ouvi isso da minha mãe, que meu cabelo era ruim, menina do cabelo de fuá. Muitas mulheres vêm aqui se assumir, mas dizem que não querem um cabelo com volume, quer um cabelo cacheado mais não quer volume, mas como querer e não querer? , tem sempre aquela indecisão, existe a vontade, mas, está com medo  do que seu amigo vai dizer do seu cabelo, eu acho assim, é um processo doloroso a transição é dolorosa, tem que se ter personalidade, de dizer chega, está bom não quero mais ser assim, não é um processo rápido você sente quando te olham, as vezes você pensa, o que eu vou fazer com esse cabelo, mas a paciência é o segredo. Tem muita mulher que tem vontade de ter, mas não tem coragem ou acha que está muito longe, mas não é assim.

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