Quadrilhas de bairro saem das ruas e dominam os palcos

Moradores de locais como Maranhão Novo e Juçara lembram das origens das juninas

Luísa Cruz    

Vestido de chita, calça rasgada, brincantes, comidas típicas… assim é lembrada uma das maiores heranças de Imperatriz. A cidade é reconhecida pelas diversas festas juninas que compõem a sua cultura. No coração dos bairros Maranhão Novo e Juçara, essa tradição tem raízes que atravessam décadas.

Segundo Adriana Vidal, uma das pioneiras dessas festanças, tudo começou na rua Rio de Janeiro, na década de 1990, com crianças e adolescentes do bairro Maranhão Novo. “Todo mundo estudava na mesma escola, como nessa época não tinha na escola, foram realizadas as festas na rua mesmo”, conta.

A prática também contava com a ajuda dos adultos e pais dos integrantes das quadrilhas. “Os pais eram ativos, eles mesmo produziam as roupas das crianças e todo mundo participava e ajudava financeiramente para realizar a festinha, que era uma forma de tá controlando os filhos”. Adriana também afirma que as festas movimentavam a economia do bairro, já que os responsáveis da organização vendiam comidas típicas para arrecadar dinheiro e reembolsar os investimentos feitos.

No entanto, moradores do bairro lamentam o apagamento desse hábito com o decorrer dos anos. “Faz falta essa cultura de raiz”, queixa-se Maria de Nazaré Salazar da Silva, a Nazinha, integrante da comunidade. Ela recorda, por exemplo, como eram feitas as roupas. “Era uma coisa mais raiz, aquele vestidinho de chita, a gente comprava aquele pano e fazia”, descreve.

Natal Salazar da Silva, filho de Dona Nazinha, ex-integrante das quadrilhas do bairro e da junina Arrasta-Pé, também se lastima. “Hoje em dia não tem mais isso não, o pessoal não tem mais interesse em ver o pessoal fazendo macacada”, comenta. Natal compartilha sua participação na Junina Arrasta-Pé, que atualmente tem Mark Rell como presidente. “A gente tava dançando na Maçonaria, na escola Leôncio Pires Dourado, e o Markinho apareceu, aí perguntou se a turma não queria dançar, fazer uma coisa mais profissional, e deu nisso, na Arrasta-Pé”.    

 O ex-integrante permaneceu por quatro anos na Arrasta-Pé, na qual participava de competições desde o início dos anos 2000. Após sua saída, Natal montou uma quadrilha na igreja Santa Clara, localizada no bairro Maranhão Novo, enriquecendo ainda mais a cultura local.

Origem

Originada em 1999, na escola Leôncio Pires Dourado, no bairro Juçara, a junina Arrasta-Pé vem crescendo cada vez mais. A princípio era apenas uma quadrilha de bairro, misturando inovação e tradição. Kelryane Lima, uma das fundadoras, fala sobre sua participação no grupo. “Dancei 22 anos como rainha e entreguei pra minha filha em 2022”. A fundadora explica que a junina teve início na escola, mas nos anos seguintes seguiram as atividades na rua Antônio de Miranda, no bairro Juçara. “Junto com outros brincantes da Guanabara e outros bairros”, acrescenta.

Kelryane Lima, melhor rainha do Maranhão, em 2018, na cidade de Caxias-MA (foto: acervo pessoal)

Com a chegada da Arrasta-Pé, o cenário junino foi revolucionado. As quadrilhas de rua já não são mais as mesmas, ou sequer ainda existem. As tradições mudaram e as heranças originais são esquecidas cada vez mais. A Arrasta-Pé sempre foi uma junina que buscou inovar, então se tornou a primeira quadrilha a aparecer estilizada, a ter tema e música própria. “Sempre lutamos pela evolução e hoje é reconhecida pelo Brasil inteiro. Na verdade, somos referência no mundo junino”, defende Kelryane.

Junina Arrasta-Pé no Arraiá da Mira 2025, quando obteve o tetracampeonato e também foi premiada como melhor quadrilha especial (foto: acervo pessoal)

Carnaval Junino

Janderson Wescley Farias Rodrigues, também conhecido como Kbeça, é organizador do Arraiá da Baxada, concentrado no bairro Maranhão Novo. O arraiá vem se consolidando como tradição há dez anos. “Desde novinho eu já dançava quadrilha, aí depois de dançar eu resolvi organizar o arraiá”.

Kbeça é ex-integrante da Arrasta-Pé e também esteve presente na formação da junina. “Hoje em dia as quadrilhas mudaram muito, é muita quadrilha de salão, parece teatro, é muito diferente daquelas quadrilhas de antigamente”, questiona. Assim como Kbeça, Natal divide a mesma opinião. “Ficou mais estilizado, mais profissional, parece mais carnaval do que quadrilha. Antigamente o pessoal se reunia, ia todo mundo rasgado”, opina. O organizador esclarece que o Arraiá da Baxada tenta ao máximo manter as raízes. “O que presta é as quadrilhas caipira, que é mais tradição de quadrilha junina”.

Arraiá da Baixada, que já faz parte da cultura do bairro, na sua 4ª edição, em 2016 (foto: acervo pessoal)

Apesar das evoluções culturais, as festas juninas seguem movimentado a população imperatrizense. É por meio da música, dança, encenação, maquiagem, culinária e muita emoção que essa cultura vive. Emocionado, Kbeça divide o sentimento de ser quadrilheiro. “A sensação é muito boa, dançar quadrilha caipira é muito bom, é muito divertido, muito alegre”. As tradições podem ter evoluído, mas ainda são as mesmas, com almas determinadas a mantê-las vivas e sangue junino correndo nas veias da majestosa Imperatriz.

Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz, desenvolvido em parceria com a disciplina Laboratório de Produção de Texto I (LPT), chamado “Meu canto tem histórias”. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar ideias para matérias jornalísticas em seus próprios bairros, em Imperatriz, ou cidades de origem. Essa é a primeira publicação oficial e individual de todas, todos e todes.