
Maria em seu ponto que foi conquistado após mais de 15 anos trabalhando na feira do Bom Sucesso (Foto: Luiza Cruz)
Por: Ana Oliveira
“Enquanto a gente pode, a gente tá lutando. Porque quando a gente se encosta, só piora.” A frase dita por Maria Souza Silva Nascimento, de 75 anos, ecoa com força nas manhãs movimentadas da Feira do Bom Sucesso, no bairro que carrega o mesmo nome. Localizado em Imperatriz, o Bom Sucesso é um bairro popular, marcado pela vida comunitária intensa e pela feira que movimenta a economia local. A feira, que se estende por várias ruas e tem seu coração pulsando na Rua do Peixe, é um dos principais pontos de encontro entre moradores, comerciantes e fregueses que buscam produtos frescos e preços acessíveis.
Nascida em Pernambuco e criada no interior maranhense, em São Domingos do Zé Feio (atualmente São Domingos do Maranhão), Maria chegou à Imperatriz em 1979 e se estabeleceu diretamente no bairro Santa Rita, vizinho ao Bom Sucesso. Desde então, construiu sua vida entre os dois bairros, com o trabalho como peixeira sendo seu elo mais forte com a comunidade. Há cerca de 30 anos, começou a vender peixe na Feira do Bom Sucesso, inicialmente em barracas improvisadas nos fins de semana. “A gente vendia ali no meio da feira, perto de uma farmácia que hoje nem existe mais. Era só nos finais de semana”, relembra.
Com o tempo, conseguiu alugar um ponto fixo na Rua do Peixe e passou a trabalhar diariamente, com exceção dos dias em que está doente ou precisa viajar. Hoje, a rua conta com cerca de nove pontos fixos durante a semana e cerca de 15 barracas móveis, número que ultrapassa 20 aos domingos, quando o movimento é mais intenso. A estrutura da feira se adapta ao ritmo dos dias: durante a semana, o comércio começa por volta das 6h e segue até as 18h, com menor fluxo de pessoas. Já aos domingos, a feira ganha vida logo ao amanhecer, com barracas de frutas, verduras, carnes e pescados ocupando cada canto disponível até o início da tarde.
A Rua do Peixe e o bairro Bom Sucesso
A história de Maria se entrelaça com a da Rua do Peixe, um dos trechos mais emblemáticos da Feira do Bom Sucesso. Quando ela começou, o comércio ainda era instável, mas com o tempo o local se consolidou como referência na venda de pescados. “Era mais movimentada e as vendas eram bem melhores. Hoje está mais fraco”, lamenta. Ela aponta a concorrência desleal de vendedores informais como um dos fatores que prejudicam os negócios. “Vai vender pra lá que fica mais barato pra eles. Aí divide os fregueses”, explica.
Segundo Maria, a feira já foi considerada a mais importante da cidade. “Era cheio de ponta a ponta! Da Rua do Jesus até lá em cima. Enchia pra lá, enchia pra cá. Não tem mais”, diz. Para ela, a crise econômica e a mudança de hábitos dos consumidores, que passaram a frequentar supermercados, contribuíram para o esvaziamento da feira.
Orgulho, tradição e tecnologia
Apesar de nunca ter sofrido preconceito explícito, Maria conta que, no início, sentia vergonha da profissão. “Quando eu via aqueles conhecidos, meus vizinhos, eu ficava com vergonha. Mas depois fui acabando com isso. Isso aqui é trabalho”, afirma. Hoje, sente orgulho da trajetória e da disposição que mantém. “Tem muitos que chegam e dizem: ‘Quantos anos a senhora tem?’ Eu digo: ‘75’. E ainda está nessa luta. Eu digo: ‘Enquanto Deus me der coragem, eu continuo.’”
A peixeira também trouxe o tema da tecnologia, que, de acordo com ela, vem atrapalhando as vendas. Maria não aderiu às novas formas de pagamento como PIX ou cartão. Quem resolve essas questões é o esposo ou o neto. Ela prefere manter os métodos tradicionais, confiando na força da conversa direta com o cliente. “Enquanto tiver um jeitinho de vender sem eu mexer no Pix, eu vou continuar.” Para ela, essa escolha é uma forma de preservar a relação construída ao longo dos anos com os fregueses.
Para Maria, a Feira do Bom Sucesso e a Rua do Peixe são mais do que espaços comerciais: são espaços de memória, cultura e resistência. Mesmo com a queda no movimento, Maria acredita que esses espaços ainda têm importância para o bairro. Mas teme que, em dez anos, possam desaparecer. “Parece que vai sumir. Está só diminuindo. A frequência está bem mais fraca.” A fala revela uma preocupação legítima com o futuro da feira e do bairro, que sempre foram parte essencial da vida de Maria e de tantos outros moradores da região.