Novos destinos do Telejornalismo: professora Marcelli Alves discute as modificações tecnológicas na profissão

Repórter: Danielle Luz e Maria Thatyele

Fotos: Acervo pessoal de Marcelli

Marcelli Alves da Silva, doutora em Comunicação (Jornalismo e Sociedade) pela Universidade de Brasília, UnB, fala nesta entrevista sobre a resistência do jornalismo brasileiro frente aos entraves existentes na profissão e as transformações ocorridas ao longo desse tempo. Só no telejornalismo, atuou por 18 anos, e na entrevista a seguir, discorre um paralelo entre o atual contexto do jornalismo televisivo e os antigos desdobramentos que permeavam a cultura profissional.

No início de sua carreira, ela comenta que não queria telejornalismo, entretanto acabou sendo um acaso do destino “muito apaixonante”, por sinal. Antes de se tornar professora, atualmente da Universidade Federal do Maranhão, ministrou aulas por 10 anos em universidades privadas nos cursos das áreas de comunicação, como jornalismo e publicidade e propaganda.

Durante esse período, ganhou vários prêmios não só na área de telejornalismo, mas também na área de Assessoria de Imprensa, ficando em 2° lugar no Intercom (Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação) em 2004, e em 1° lugar no prêmio de Agências de Notícias no ano seguinte.

Além disso, foi premiada com o 1° Lugar no I Concurso Nacional de Curtas de Responsabilidade Social, da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior), em 2008, chamado Silvio Tendler, prêmio voltado à questão do audiovisual, mostrando que de fato, esse era o lugar onde deveria estar: no universo do Telejornalismo.

Hoje, Marcelli desenvolve estudos na área do jornalismo televisivo, pois acredita que assim se sente mais próxima do telejornalismo que outrora atuava. Todavia, continua ganhando destaque. Recentemente, em 2020, foi premiada por sua pesquisa PIBIC realizada em conjunto com uma discente do grupo de pesquisa Gciber sobre “As reivindicações enviadas por maranhenses para o quadro “O Brasil que eu quero” e o cruzamento com os dados do IBGE”.

A seguir, as modificações e dificuldades do exercício jornalístico na atualidade, as deficiências da área e novas perspectivas da profissão. Confira:

 

I.N: Qual a melhor parte de se trabalhar com jornalismo televisivo?

M.A: Essa é uma resposta muito complicada, porque acho que a melhor parte está relacionada com a paixão, com amor. Então se você ama, se o telejornalismo conseguiu despertar uma paixão, é quase que um caminho sem volta. Rotinas exaustivas, plantões… O telejornalismo tem uma coisa, que é essa questão do imediatismo, tem muito disso. Então, para você colocar um telejornal no ar, é muita pressão, e não é todo mundo que se identifica com isso. Mas aquele que se identifica, se apaixona, e eu acho que foi o meu caso.

I.N: Qual experiência que mais marcou você?

M.A: Quando a gente gosta muito do que faz, cada lugar é muito importante. Mas quando eu fui editora executiva e fui uma das pessoas que implantou a TV Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul, foi uma grande realização profissional e pessoal, porque eu sempre trabalhei com marketing político, sempre gostei. Também, quando fui para Record, eu fiz um programa que nunca imaginava como que faria, o Balanço Geral, um programa nacional, não é telejornalismo. Mas é sensacionalista em sua essência.

“eu mesma tinha preconceito com o Balanço Geral. Eu entrei na Record para fazer jornalismo, e acabaram me colocando lá, e eu tinha resistência, mas fiquei 4 anos e no final, eu amava!”

I.N: E como é trabalhar nesse tipo de jornalismo sensacionalista, existe preconceito?

M.A: É uma coisa totalmente diferente, e, falando em preconceito, eu mesma tinha preconceito com o Balanço Geral. Eu entrei na Record para fazer jornalismo, e acabaram me colocando lá, e eu tinha resistência, mas fiquei 4 anos e no final, eu amava! Chorei horrores quando saí. Ele trabalha com informação e reportagem, porém, ela é tratada muitas vezes com uma linguagem extremamente sensacionalista. Esse também foi um grande desafio na minha vida. O programa era ao vivo, foi uma boa uma experiência.

I.N: Na sua visão, o telejornalismo mudou em que aspecto ao longo dos anos?

M.A: O telejornalismo ele é outro. O telejornal é outro. Aprendíamos que não devíamos fazer entrevista por telefone, só em últimos casos.  Sempre havia essa necessidade de estar dando entrevista olhando olho no olho. Trazendo para o telejornalismo, vemos que muitas formas de fazer a reportagem, mudaram hoje em dia. Além disso, a construção da notícia mudou de uma forma agressiva. Muito do que é pautado hoje, é baseado na do jornalismo colaborativo. Além, claro, da utilização de aplicativos o tempo todo, faz com que se tenha um novo formato na telerreportagem (essa presença do vídeo amador ou vídeo de celular), e é um novo formato na produção.

I.N: Por muito tempo foi dito sobre a questão da aparência para trabalhar com televisão. Esse padrão estético sofreu alterações no telejornalismo hoje?

M.A: Antes, se você parar para pensar, apresentadores como Cid Moreira, ou o próprio Sérgio Chapelin, eram muito robotizados. Eles não precisavam nem ser jornalistas. Eles precisavam ter uma boa aparência no sentido de estar sempre penteado, usando terno, que é algo ainda muito exigido. Tinham que ter uma entonação de voz bonita, muito robotizada. Hoje, você vê o apresentador entrar nesse ritmo de conversar com o telespectador. Principalmente ao sair do jornal nacional e entrar nas emissoras locais.

I.N: E quais padrões estéticos se mantiveram?

M.A: No telejornalismo você só é um mensageiro, então isso ainda não mudou. Tem algumas regras que não se pode violar. Não pode apresentar um jornal ou fazer uma reportagem com uma roupa que vai chamar mais a atenção do que a própria notícia. Colocar um brinco extremamente grande, usar uma roupa de alça ou transparente. Isso pode soar até como machismo, mas é porque realmente o corpo pode chamar mais atenção para a sensualidade ou simplesmente não ficar legal com aquilo. Então nem o bonito demais, nem o sensual, nem o feio. Deve-se ficar no meio termo para que ao entrar, se consiga prestar atenção na sua apresentação.

I.N: Qual o seu ponto de vista com relação as inovações tecnológicas que permeiam o telejornalismo?

M.A: Precisamos perceber que o jornalismo está em processo de transformação e o Telejornalismo está em processo de evolução. Quando falamos em Telejornalismo, a gente não precisa mais pensar apenas naquela emissora de TV ou naquele telejornal.  Hoje existem diversas possibilidades que a internet nos dá para fazer a produção audiovisual telejornalística, e ela não precisa estar inserida dentro de um telejornal, pode vir em outro modelo.

I.N: E quais possíveis futuros você vê para o telejornalismo?

M.A: Temos um mercado muito grande a ser desbravado.  Quem sabe daqui a 22 anos, jornalistas podem de repente, estar trabalhando dirigindo o trabalho dos YouTubers, para que produzam conteúdo Telejornalístico? É uma possibilidade. As lives que hoje estão tão na moda, há 10 anos a gente não pensava nisso! A tecnologia streaming.. Em 2003, quando era diretora da TV Assembleia, era uma dificuldade fazer o conteúdo da TV passar na internet. Ninguém assistia porque travava muito. Já em 2005 surgiu a maior rede de compartilhamento de vídeos, o YouTube, com lives que não travam em momento algum. Ensino síncrono EAD, por exemplo, Então, pensando tudo isso, as novas tecnologias vem trazendo uma mudança muito grande para a vida da gente. Eu ainda sou muito otimista que existe muitas possibilidades, as profissões como um todo, estão mudando a forma de se trabalhar, não necessariamente sendo extintas.

I.N- Sabendo que a senhora estuda TV, gostaríamos de saber qual sua visão sobre telejornalismo de imperatriz?

M.A: O telejornalismo de Imperatriz sofre com um problema muito sério que é relacionado ao telejornalismo de interior como um todo: a falta de investimento. Tem bons profissionais na área técnica e de Jornalismo, mas não tem investimento, e a gente como um bom jornalista, um bom editor, também não fazemos milagres, precisamos de bons equipamentos. A estrutura em Imperatriz falta isso. Esse é um problema de telejornalismo de interior.

I.N- Vivemos em um contexto social onde a liberdade de imprensa vem sofrendo diversos ataques do atual governo, como você definiria o profissional jornalista frente a essa crise de desvalorização e ataques?

M.A: É muito triste. Só que o que me consola nisso é a frase do Mario Quintana que diz: “Eles passarão… eu passarinho”. O jornalista tem que acreditar que ele passará. Eles passarão, nós passaremos. Então é um momento de resistência. A gente sabe que para você se manter no mercado não adianta apenas resistir, porque às vezes, eu resisto muito, e em consequência, sou demitido e eu preciso alimentar os meus filhos, tenho minhas contas para pagar…A gente precisa arrumar um meio termo. É um momento muito difícil, precisamos ter cautela, tem que resistir. Nós passaremos e ainda vamos contar muita história boa se Deus quiser.

 Bate – Bola

– Livro que mudou sua vida? Gosto muito de ler. Desde muito cedo. É difícil falar sobre um livro que tenha mudado a minha vida. Assim como a vida é feita de fases, etapas, ciclos, em cada fase um livro pode ser mais significativo do que outro. O importante é estar sempre lendo, aberta ao conhecimento.

– Livro que gostaria de ter escrito:  Gostaria de escrever algo mais voltado as questões sistêmicas da vida. Home, natureza, equilíbrio.

– Uma música para tocar na sua playlist? – “Construção” – Chico Buarque, porque mostra a brevidade da vida.

– Uma série que você indica? La casa de Papel

– Qual conselho você daria para quem pretende trabalhar no telejornalismo?

 Olha eu diria que é um conselho no jornalismo como um todo. Assim como em outras áreas, você tem que ter paixão, tem que ter expertise e ser bem-feito, é uma exigência do mercado no geral. O jornalismo em si está em processo de transformação, e o telejornalismo está em evolução, a gente tem aí diversas possibilidades que a internet nos dá de fazer a produção audiovisual telejornalística que pode estar inserida no telejornal.