Cristal Santos
Cultura e espiritualidade se misturam na madrugada de 28 para 29 de junho
“A energia de estar naquele lugar é única”, comenta a estudante Raquel Rocha, que acompanhou pela primeira vez este ano a celebração do bumba meu boi na capela de São Pedro, padroeiro dos pescadores, em São Luís, Maranhão. O local exala cultura e espiritualidade, arrastando multidões durante o São João. Na madrugada do dia 28 para 29 de junho, o bairro da Madre Deus é palco da hipnotizante festividade, tanto no local religioso, quanto em seus arredores. Organizada há 77 anos, atrai centenas de visitantes e moradores, promovendo movimentação na economia e a preservação das tradições locais.
Toadas, matracas, pandeirões, ancestralidade, brincadeiras e espiritualidade definem a noite. A concentração de pessoas começa a partir das 21h do dia 28 e se estende até a manhã do dia 29, proporcionando uma experiência imersiva para todos os presentes. Nascida e criada na baixada maranhense, Raquel disse que compareceu à festa por não ter tanto conhecimento sobre cultura das toadas cheias de histórias do povo preto, que são cantadas pelos vários mestres dos bois que passam ali.
Outro ponto do trajeto que leva à capela é a Casa das Minas, um dos terreiros mais antigos do Brasil. O local fica no caminho para a capela de São Pedro e muitas pessoas param para demonstrar sua fé diante do grande altar em uma das salas. Raquel afirma que depois de ter participado, compreendeu a importância da expressão cultural. “Meu pai sempre fala que entender de onde você vem te faz olhar melhor pra onde você vai. A capela de São Pedro é um lugar onde as pessoas cantam e dançam sobre sua resistência”, define Raquel.

“A cada ano que eu vou me sinto realizada, agradecida e fortalecida”, afirma Kelma Barbosa. Devota há mais de 15 anos. Muitas pessoas também visitam a Casa das Minas, que fica aberta durante a celebração e pedem proteção para as divindades. Assim, o sincretismo se manifesta tanto nas religiões de matriz africana quanto no catolicismo, sendo também um ponto de encontro de brincantes, fiéis e turistas.
Amanhecer Mágico
Se estendendo até de manhã, a atmosfera festiva se mantém intacta até a última pessoa sair da capela. Para alguns, o amanhecer é o ápice da celebração. Momento em que tudo parece estar conectado, os sons vindos da multidão, como um coral, dos passos de dança, das matracas batendo uma na outra, das várias batidas em grandes pandeiros, o balançar dos maracás, vibrando pelas ruas da ilha magnética. O cientista social e professor de sociologia, Bruno Leonardo, relata que participar dessa festividade não é algo que se possa descrever e, sim, vivenciar, é como um “renovador de energias”.

Ao longo das décadas, a celebração foi se modificando. O professor destaca que essas transformações servem para fortalecimento da cultura popular, e que a manutenção da autenticidade dessa tradição depende dos participantes. “As pessoas precisam ir nesse local, mostrar sua devoção a São Pedro, demonstrar sua cultura, vivenciar tudo isso, das mais diversas formas. Sabendo que isso faz parte dessa data”, recomenda Bruno.
Celebração mais aguardada durante o mês de junho, a noite de São Pedro é citada por muitos como aquela que só quem viveu pelo menos uma vez sabe que não tem palavras para descrever. “Você está ali, curtindo o boi com outras pessoas nesse mesmo dinamismo, é algo que é incrível para mim”, afirma Bruno. Já no dia 29, do bairro da Madre Deus, algumas pessoas seguem para o Cais da Praia Grande, localizado no Centro Histórico de São Luís, onde realizam uma procissão marítima com a imagem do santo, manifestando fé, emoção e gratidão.
Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz, chamado “Meu canto também tem histórias”. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar ideias para matérias jornalísticas em seus próprios bairros, em Imperatriz, ou cidades de origem. Essa é a primeira publicação oficial e individual de todas, todos e todes.