Texto e fotos: Ana Luiza Palmeira
Mais um dia no povoado Bela Vista (TO). A movimentação segue em rumo ao Porto da Balsa do rio Tocantins e, ao chegar lá, pode-se observar um grupo de pessoas deslocando-se para a cidade vizinha, Imperatriz no Maranhão. Esse é um trajeto diário feito por muitos: alguns vão estudar, outros trabalhar e resolver suas pendências no município maior. Porém, qual será a história de alguns moradores desse pequeno povoado de 2,2 mil habitantes, conhecido por suas praias, e como é a sua relação com o polo maranhense, de quase 260 mil?
Francisco da Rocha Silva, 79 anos, chegou a Bela Vista em 1962, quando tinha 19 e é um dos moradores mais antigos da região. Todos os dias é possível ver seu Chico ou Malaquias, como é conhecido, na porta de sua casa, vendendo o leite de vaca puro. Ele se recorda como era o povoado na época que chegou. “Só tinha a ruinha da beira do rio mesmo”. Conta, ainda, que quando se mudou não havia nem balsa. “Era motorzinho ou na canoa com reminho. Com muito tempo é que colocaram dois motores empareados e umas tábuas. Aí dava para atravessar um carrinho pequeno”.
Chico sempre se mudou muito com seus pais, mas diz que ao chegar em Bela Vista se instalou com sua família e ali permaneceu. Ainda jovem, seguiu rumo a Araguatins, mas, não demorou muito, voltou logo. “Era um lugar muito calmo nesse tempo, era calmo demais. Você podia dormir bem aí no meio da rua que ninguém mexia”, declara. Um dos motivos para permanecer no povoado foi a proximidade com Imperatriz, já que, se precisa resolver algo, basta se deslocar para a cidade vizinha. “É o mesmo que viver em Imperatriz”, afirma.
A enchente de 1964 foi um dos fatores, segundo Chico, que fez a região se expandir, pois as pessoas queriam sair da beira do rio Tocantins. A construção de duas usinas de arroz e uma de torrar café, que pertencia ao famoso Café Viana, fez também com que muitas pessoas se mudassem para o local.
Valéria Lima Carneiro, 52 anos, afirma que quando veio morar na Bela Vista aos 10, não havia energia, água encanada e nem asfalto. “Tudo a gente dependia do rio e da Imperatriz”. Valéria relata que sempre que o rio Tocantins enchia, a água ficava cheia de barro, então precisava atravessar diariamente para buscar o líquido mais potável no outro lado.
Explicou também que quando chegou, todas as casas eram de palha e situadas na rua Velha, onde o Porto da Balsa se localizava naquela época. “Tinha vez que a gente queria assistir uma televisão, era à bateria, tinha que ir para a casa do vizinho, lá no Torrão, na casa do finado Pedro Gago”, comenta.
Apesar de todo o trabalho, ela afirma que teve uma adolescência ótima. “Brincava no rio, na balsa, os funcionários brigavam comigo, diziam ser perigoso, mas eu era muito atentada, aproveitei muito”, declara. Valéria diz que gosta bastante da região, que considera muito tranquila. “Saí daqui algumas vezes, mas sempre tornei a voltar”.
A única desvantagem, para ela, é ter que pagar a balsa sempre que precisa ir para Imperatriz. Quando trabalhava na cidade vizinha, metade do seu salário era destinado a pagar a locomoção de um estado para o outro, o que não compensava.
“Acho que quem vive aqui nesse lugar deveria ter passe livre na balsa”, afirma Valéria Lima
Maria Clara Sousa, 19 anos, ressalta que apesar de ser bom morar em Bela Vista, acha difícil o fato de ter que se deslocar para Imperatriz sempre que precisa levar seu bebê de três meses ao médico. Para levar a criança na Unidade Básica de Saúde do povoado é preciso agendar e às vezes a espera pode durar um mês. Maria também sente falta de um local para o lazer, seja parquinho ou praça, onde possa ir com seu filho para passear.
Crescimento e comodidade
Já William Carneiro de Sousa, 26 anos gosta de morar em Bela Vista pela “praticidade de ir e vir” e também a pouca criminalidade. “Aqui que eu consegui começar o meu primeiro empreendimento”, relata. Apesar de ter que ir trabalhar em Imperatriz, não vê problema nisso, pois como possui transporte próprio, não depende muito da balsa para se deslocar até a cidade.
Willian afirma que distribuidoras e empresas maiores melhorariam muito a qualidade de vida da população e ajudariam em seu negócio, visto que os custos diminuiriam, aumentaria a geração de empregos no povoado e as pessoas não precisariam estar tão atrelados à cidade vizinha. “Nosso município tem potencial para não depender totalmente de Imperatriz”, comenta.
Alissa Mikaela, 14 anos, diz ser a tranquilidade que faz com que ela goste de morar em Bela Vista. Mas pondera que, apesar disso, o povoado precisa de uma estrutura melhor e de lugares para lazer para sair com os seus amigos. Outra questão é o fato de ter que se deslocar para Imperatriz para estudar. “Como virou rotina já não faz mais tanta diferença. Se fosse mais longe acho que não gostaria tanto”. Ela declara que não se mudaria do local, mesmo sentindo que faltam algumas coisas na região, já que gosta da tranquilidade e não sente necessidade da mudança. “É quase um bairro de lá”, define, referindo-se a Imperatriz.
Esta matéria faz parte do projeto “Meu canto também é notícia”, desenvolvido com os estudantes do 1º semestre do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz (MA). Eles e elas foram estimulados a procurar histórias no entorno onde vivem.