Maranhão discute crise climática na Cúpula dos Povos

MST mobilizou 200 delegados para debater a preservação da Amazônia em Belém do Pará, durante a COP30

Camilla Sousa

Maria Leal

Na contramão da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – COP30, Belém do Pará também é palco da Cúpula dos Povos, que tem buscado amplificar as vozes dos movimentos sociais nacionais e internacionais na defesa da Amazônia contra a crise climática.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) compareceu com uma delegação de 200 militantes maranhenses. Segundo Divina Lopes, integrante da coordenação nacional, o evento tem como objetivo disputar narrativas e apresentar-se como exemplo de mobilização social para mundo inteiro, visando internacionalizar as pautas e propostas de enfrentamento à crise ambiental.

Divina Lopes (no microfone) participa da mesa de debate “Territórios e Maretórios Vivos: Soberania Popular e Alimentar” (foto: Camilla Sousa)

“E é um momento também da gente fazer uma demarcação de força. Enquanto movimentos populares, o Maranhão não podia ficar de fora”, acrescenta Divina. Para a coordenadora, a presença maranhense é também um gesto político em um território pressionado pelo agronegócio. O estado convive com devastação crescente, especialmente nos biomas Amazônia e Cerrado, afetados pela expansão da soja e do eucalipto.

“O avanço do agronegócio provoca desmatamento e expulsa o nosso povo dos seus territórios. E o desmatamento é um dos principais responsáveis pela crise ambiental”, denuncia. Divina pontua que a reforma agrária popular se apresenta como alternativa concreta: “É um caminho real de enfrentamento à crise, produzindo alimento saudável, preservando a natureza e fortalecendo territórios de vida.”

Com relação ao Maranhão, Divina enfatiza os trabalhos com os territórios da reforma agrária, nos quais tem ocorrido uma discussão importante em defesa do meio ambiente. “Esse esforço de debater a produção de alimentos saudáveis, a preservação da natureza, os nossos territórios comuns, territórios de vida, onde as pessoas se sintam seguras, mas que também os direitos da natureza sejam respeitados”, frisa a liderança.

Ao refletir sobre o impacto das atividades da Cúpula dos Povos em seu cotidiano, Raimundo Moura, assentado no território do MST em Amarante-MA desde 1997, reforça que o encontro amplia o olhar das comunidades sobre temas ambientais e fortalece debates que precisam chegar às bases. “O que é mais intensificador hoje é a questão climática, do meio ambiente. A gente já volta levando isso na bagagem pra trabalhar com as comunidades”, afirma.

Raimundo Moura, no centro da foto, durante a Marcha Global pelo Clima (foto: Camilla Sousa)

Cúpula das Infâncias

A participação das crianças também ganha destaque nesta edição da Cúpula, na qual, pela primeira vez, estão sendo realizadas atividades direcionadas ao público infanto-juvenil, sob coordenação de educadoras de todo Brasil. Gardênia Almeida, acadêmica de Pedagogia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), integra voluntariamente a equipe da “Cúpula das Infâncias”. Crianças de diferentes idades elaboram, de forma coletiva, seus desejos para o planeta e para a Amazônia.

Gardênia em sua personagem, a boneca Fofolete, em sala com crianças de 4 a 6 anos (foto: Camilla Sousa)

“As atividades com as crianças unem diversão e reflexão. Elas vão construir a Carta das Infâncias, que também fará parte da cúpula”, explica Gardênia. O trabalho culminou na criação da história “Amazônia, a nossa casa”, desenvolvida pelas meninas e meninos,  guiadas por personagens como Curupira, Iara e Boitatá.

Gardênia comenta ainda sobre a relevância do evento para as famílias. “Um espaço voltado para as crianças com segurança, atividades lúdicas, e, principalmente, reflexivas. É muito importante, porque dá tranquilidade pra as mães poderem discutir que planeta vão deixar pra essas crianças”.

Apresentação na tenda da Cúpula das Infâncias (foto: Camilla Sousa)

Apesar da oportunidade do trabalho com a infância durante o evento, a educadora também fala sobre as pautas no dia a dia. “Nós precisamos ampliar essas discussões. Os debates ainda não estão chegando nas crianças”, elabora, antes de fazer uma crítica às práticas tradicionais e mecanizadas de se trabalhar a preservação da Amazônia. “Por enquanto, eu percebo que há muito de se falar sobre hortinha, sobre regar a plantinha. Mas quais outros elementos da natureza estão sendo prejudicados?”, reflete Gardênia.

Em fala voltada especificamente para as crianças imperatrizenses, Gardênia lamenta que realidades como a do rio Tocantins, que frequentemente é assoreado, não chegam até elas. “É algo que está ali perto de nós, mas que as crianças não percebem, não têm conhecimento de que isso prejudica a natureza, o futuro do rio e o futuro delas”.

Perspectivas dos movimentos sociais

A presença de jovens universitários também marcou o encontro. Namara Vitória, 20 anos, estudante de Pedagogia da UFMA, enxerga a experiência como parte essencial da formação. “Nós precisamos viver essas realidades diferentes, conhecer movimentos sociais que às vezes podem não ter na nossa cidade. Nós vamos estar aqui daqui a alguns anos, e com novos jovens.”

Gilson Marinho, 22 anos, colega do mesmo curso e assentado, reforça que o encontro amplia os olhares dentro e fora da universidade. “Eu vejo que é uma oportunidade de desenvolver um senso crítico maior que vai além da educação. A gente entrega aprendizado, mas também leva”.

Gilson e Namara partilham a experiência de participar pela primeira vez da Cúpula dos Povos (foto: Camilla Sousa)

Para ele, a faculdade funciona como ponte entre a juventude e a luta social “A universidade representou uma nova forma de saber como é que a gente chega a esses movimentos sociais. Fazer o movimento retornar pra dentro da comunidade de onde a gente veio”, explica Gilson.

As redes sociais e o contato entre jovens, na visão de ambos acadêmicos de Pedagogia, desempenham papel fundamental para aproximar os jovens das causas ambientais. “Foi pelas redes que eu soube da mobilização. Quanto mais publicações, mais jovens vão chegar”, relata Namara. Gilson complementa: “É importante falar diretamente com os jovens e dar espaço para eles se expressarem.”

Ao ressaltarem o que levam de experiencia deste encontro de movimentos, especialmente para a formação acadêmica, Namara relata: “ A gente aumenta o nosso conhecimento sobre os movimentos sociais, porque nós vamos lidar com pessoas que vivem essa realidade”.

Gilson, por sua vez, destaca que a  participação é essencial para manter os jovens engajados. “A comunidade, muitas vezes, no decorrer do tempo, ou por essa renovação da juventude, não tem um interesse pelos movimentos sociais. Então é uma forma de agregar a construir novos sentidos”.

*Trabalho de notícia alongada desenvolvido para a disciplina de Redação Jornalística. Como estavam participando da Cúpula dos Povos, durante a COP30 2025, em Belém, as futuras repórteres exercitaram a cobertura jornalística.