Lyandra Gomes
O jornalista Inácio França, fundador e editor do Marco Zero Conteúdo, em sua fala no 18º Simpósio de Comunicação da Região Tocantina (SIMCOM), trouxe um ponto pouco debatido, mas essencial para a sustentabilidade do jornalismo independente: a necessidade de compreender a gestão financeira e contábil dos veículos. Durante a mesa “Desafios da produção de conteúdo no jornalismo cultural e independente”, que aconteceu na noite do dia 11 de dezembro de 2024, ele destacou que, além da produção de conteúdo de qualidade, é fundamental que os jornalistas saibam captar, administrar e distribuir recursos para manter seus projetos vivos.
A fala de Inácio levanta um questionamento relevante: estaríamos vivendo uma era de escassez de jornalistas com expertise financeira? Em um cenário no qual o financiamento do jornalismo independente depende cada vez mais de editais, assinaturas e apoios institucionais, a falta de profissionais com conhecimento administrativo pode se tornar um obstáculo significativo.
Durante sua participação no SIMCOM, Inácio França ressaltou a importância de aproveitar oportunidades de financiamento, como editais públicos e privados, além de estruturar uma gestão financeira eficiente no contexto dos projetos jornalísticos. Para ele, não basta produzir um jornalismo de qualidade se não há um planejamento sustentável para garantir sua continuidade. “Abordei as dificuldades de financiamento do jornalismo independente como um todo, não só no aspecto cultural, mas também as dificuldades de acesso a fontes de recursos que mantenham o jornalismo ativo e sadio, e que ao mesmo tempo preservam sua independência”, detalhou.
A contradição apontada por Inácio — entre ter dinheiro e não ser independente, ou ser independente e não ter dinheiro — reflete um dilema central para muitos veículos alternativos. Sem um modelo de negócios sólido, esses projetos ficam vulneráveis à instabilidade financeira e à pressão de patrocinadores, podendo comprometer sua linha editorial.
O discurso de Inácio França evidencia um problema estrutural: a falta de preparo dos jornalistas para lidar com as questões financeiras da profissão. Muitos saem das universidades com excelente formação técnica para reportar fatos, mas sem conhecimento sobre captação de recursos, precificação de serviços, gestão de equipe e contabilidade.
No Marco Zero Conteúdo, por exemplo, a preocupação com essa lacuna levou a organização a investir na troca de experiências com estudantes e profissionais da área. Segundo Inácio, é fundamental que jornalistas compreendam desde cedo o funcionamento do mercado, para que possam atuar de forma independente, sem abrir mão da viabilidade econômica.
“É uma das tarefas que nos colocamos na Marco Zero: essa interação com as universidades e estudantes, porque acreditamos que temos um papel de formação também. Precisamos oferecer um pouco dos resultados da nossa vivência para que os estudantes saibam qual é o caminho que estão trilhando”, explicou.
O debate promovido no SIMCOM deixou claro que, para o jornalismo independente prosperar, é preciso enxergar a gestão financeira como parte do ofício. A busca por editais, a construção de modelos de financiamento recorrente e a organização contábil não podem ser tratadas como desafios secundários.
Se o mercado sofre com a falta de jornalistas preparados para lidar com essas questões, talvez seja hora de reformular currículos acadêmicos e fomentar a capacitação em gestão dentro das redações, conforme recomenda Inácio. Afinal, o jornalismo não pode ser refém da falta de dinheiro — e aprender a se financiar é, também, uma forma de garantir sua independência.
