Acidentes de trânsito vitimaram também 2.100 pessoas no ano passado; a embriagez tem gerado os casos mais graves
Por Ester Feitosa Nogueira, Gledson Diegues da Silva, Janethe Matos da Silva e Raimunda Tupinambá*
O médico ortopedista e traumatologista Daniel Fiim, coordenador do setor de traumatologia do Hospital Municipal de Imperatriz, diz, que do total de acidentes registrados no trânsito, a maioria está ligado ao uso de álcool. “A incidência é muito alta, tanto de acidentes relacionados à condução de veículo, quanto ao fato de o paciente ter ingerido bebida alcoólica, o que gera uma imprudência ainda maior e um risco mais alto de acidentes”, diz ele. O SAMU registrou 1.774 acidentes de trânsito, 2.100 vítimas e 13 mortes, entre janeiro e setembro de 2017. A faixa etária mais atingida está entre os 11 e os 40 anos de idade, 62% são do sexo masculino. Mais de 30% dos acidentes ocorrem no período da tarde e nos finais de semana, a influência do álcool é a causa de grande parte desses acidentes de trânsito.
A dependência química está entre os vícios mais comuns e o álcool entre as drogas mais usadas. Uma pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que 55% dos jovens em idade escolar, já ingeriram bebida alcoólica. O trânsito sofre diretamente os efeitos do consumo excessivo do álcool. Nos quase mil quilômetros fiscalizados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) na região Tocantina, de janeiro a outubro de 2017, foram realizados 8.828 testes de etilômetro, o conhecido “bafômetro”, 145 pessoas foram autuadas por constatação de que haviam ingerido bebida alcoólica, e destas, 52 foram presas pelo crime de dirigir sob a influência de álcool. No mesmo período foram registrados 442 acidentes e 26 deles a causa presumível foi a ingestão de álcool.
Para diminuir o problema e punir com mais rigor motoristas que dirigem embriagados, foi implantada em 2008 a Lei de nº 11.705, que ficou conhecida como “lei seca”. Em 2012 a lei passou a ser mais rígida, a multa passou de R$ 1.195,40 para R$ 2.931,70, esse valor pode ser aumentando em até 10 vezes caso haja reincidência, e mais 7 pontos na carteira.
A Policia Rodoviária Federal aqui na região Tocantina, fiscaliza quatro BR’s; a 010, 222, 226 e 230. São quase mil quilômetros de rodovias fiscalizadas por 3 unidades operacionais; uma em Açailândia, outra em Imperatriz e a terceira na cidade de Porto Franco, possuindo um bafômetro em cada unidade. O policial Igor Egídio lembra de dois casos que aconteceram na mesma semana e chamou bastante a atenção de todos no posto fiscal: um pai com uma criança de aproximadamente 5 anos de idade dirigia a noite, totalmente embriagado, e um caminhoneiro, motorista profissional de uma grande empresa de transporte, dirigia durante a semana sob efeito do álcool.
O policial da PRF afirma que campanhas são feitas para alertar, mas ainda falta conscientização dos motoristas:
O teste do bafômetro
Se a PRF consegue identificar os motoristas embriagados, o mesmo não acontecendo com a Polícia Militar. Em Imperatriz existe um bafômetro do Detran, que é usado nas operações em conjunto com a PM, mas o mesmo não está funcionado. Segundo o tenente Ernani Souza da Companhia de Rádio Patrulha do 3º BPM, quando acontece durante uma abordagem feita pela PM de o condutor apresentar sintomas de embriaguez, ele é levado até à PFR. “Na abordagem, quando a gente identifica aquele que estar alcoolizado, pede para ele fazer o quatro com as pernas, pede para ele andar na linha da pista, para observar a coordenação motora. A gente identifica, mas hoje como tudo tem que ser comprovado, quando não tem o bafômetro, a gente utiliza a PRF”, diz o tenente.
Ele destaca também que esse deslocamento da viatura até o posto da PRF demanda tempo, e termina prejudicando pois é menos uma viatura fazendo ronda na cidade. E que se tivesse uma companhia especializada nesse tipo de questão de trânsito ajudaria bastante.
O Hospital Municipal Socorrão atende todos os dias ocorrências onde o álcool está presente. Finais de semana e em feriados prolongados são os períodos de maior incidência, a motocicleta é o veículo que mais se envolve em acidentes desse tipo. De acordo com o médico Daniel Fiim, é muito alto o índice de acidentes envolvendo veículos, e é alto também o número dos que são provocados pela incidência de álcool no trânsito, esses tendem a gerar um risco de vida ainda maior pois costumam ser mais violentos. “O que nós observamos na prática, é que esses pacientes geralmente são os pacientes com traumas mais graves. Geralmente o acidente onde o álcool está envolvido, a fratura, a lesão que o paciente apresenta é mais grave do que acidentes onde o álcool não está presente”, diz ele.
O médico destaca ainda que a imprudência, a velocidade e os reflexos são alterados com o uso do álcool. O capacete também acaba sendo usado de forma inadequada ou até mesmo não utilizado, assim a proteção e os reflexos de defesa na hora da queda são alterados tornando o acidente ainda mais grave. Ele lembra que antigamente a maior parte dos acidentes era com condutores do sexo masculino, mas que hoje a diferença é bem pequena. “Se você for avaliar dez anos atrás, os homens se acidentavam mais, mas hoje não tem tanta diferença. Elevou muito o índice de acidentes com mulheres, a ingestão de bebida alcoólica e o manuseio de motos por mulheres também aumentou”, cometa.
Efeitos no organismo
Desde de 1967, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece o alcoolismo como uma enfermidade progressiva, incurável e fatal e cobra políticas públicas voltadas ao tratamento e a conscientização do problema. O uso excessivo e por vezes compulsivo do álcool causa desordens sociais, conflitos familiares e atos violentos. O álcool chega rapidamente ao sistema nervoso central, comprometendo o poder de raciocínio, além de funcionar como um anestésico causando sonolência, altera a visão e audição. Sob efeito do álcool o indivíduo torna-se mais autoconfiante e isso o leva a cometer ações impensadas. Esses efeitos são proporcionais à concentração da bebida no sangue.
A psicóloga Gizele Cerqueira, especialista em saúde mental e dependência química, destaca que a prevenção primária do abuso do consumo da bebida alcoólica deve fazer parte de políticas públicas, visando uma melhor qualidade de vida do indivíduo. O que pode ser feito, explica a psicóloga, são campanhas educativas e preventivas, O álcool por muito tempo foi tido como a droga lícita que abre as portas para outros tipos de drogas. Mas ela alerta que essa realidade deve ser olhada de forma diferenciada nos dias atuais.
Sonhos interrompidos
Ele foi ex-lateral esquerda do time do Cavalo de aço, canhoto, e muito ágil nas jogadas, daí o apelido ‘esquerdinha’. Jonas Viana da Silva Oliveira de 25 anos, sofreu um acidente de trânsito há cerca de 4 meses. Jonas estava cansado e havia dormido mal nas duas noites anteriores à noite do acidente. Ele saía da festa de aniversário de um amigo quando perdeu o controle do veículo, o acidente aconteceu no bairro Jardim São Luís, o socorro a Jonas demorou cerca de 40 minutos. O jovem jogador de futebol e cheio de sonhos perdeu o movimento das pernas e está se adaptando aos poucos a uma nova realidade.
O ex-jogador alerta para que as pessoas evitem dirigir no trânsito após o consumo de bebidas alcoólicas:
Ações preventivas
Segundo o assistente da Circunscrição Regional de Trânsito (CIRETRAN) Kallyl Aguiar, as medidas para segurança passam por três pilares: fiscalização, engenharia de tráfego e educação para o trânsito. Maio amarelo, Semana Nacional de Trânsito (SNT) e ações educativas são desenvolvidas em escolas e empresas com o intuito de despertar as pessoas para os perigos do trânsito como; embriaguez ao volante, falar ao celular enquanto dirige e alta velocidade em vias não permitidas. Ele lembra ainda que o órgão atua em ação conjunta com alguns parceiros para a realização das mesmas atividades, como PM e PRF, e com a implantação da “lei seca” houve alguns resultados positivos. No entanto, para Kallyl Aguiar, as multas pesadas são as que geram mais efeitos no comportamento do motorista. “Quando o condutor sente no bolso através das multas é que aprendem”, comenta.
Fotos/áudios: Ester Feitosa Nogueira, Gledson Diegues da Silva, Janethe Matos da Silva e Raimunda Tupinambá
*Reportagem especial produzida para a disciplina Técnicas de Reportagem (2017.2)