“Não é só um bar! É um local destinado às causas LGBT”: Entrevista com a proprietária do Fruta e Verdura

Repórter: Deglan Alves Lima, Helyh Oliveira Gomes

Fotos: Deglan Alves Lima, Helyh Oliveira Gomes

 

Jardeil Rabelo, empresária de 43 anos, é o nome por trás do bar Fruta e Verdura. Com 18 anos de experiência com produção de eventos, há três anos e meio começou o novo empreendimento.  Fruta e Verdura é o único bar imperatrizense completamente voltado para o público LGBTQIA+. E recebeu esse nome como uma forma de representar a diversidade e a fuga dos padrões que o estabelecimento representa.

Localizado na avenida Beira-Rio, o Fruta e Verdura funciona de quarta-feira a domingo. Conta com apresentações de artistas preferencialmente do meio LGBTQIA+ como cantores gays, Dj’s e DragsQueens. O espaço promove shows que acontecem na própria boate do bar nas sextas-feiras e sábados.

O “Frutas”, como é chamado, nasceu de uma parceria de Jardeil Rabelo e seu antigo sócio na época, Eurípedes Daniel. No local onde era o antigo bar Santo Shop, nasceu o projeto que tinha o objetivo de criar um espaço todo voltado para o público homoafetivo, um ambiente de acolhimento e lugar de fala. Por causa de divergências a sociedade se desfez, mas Jardeil decidiu montar sozinha o negócio.

Esse não foi o primeiro desafio de Jardeil, por ser homossexual, aos 17 anos foi expulsa de casa pelo pai após descobrir sua orientação sexual. Sem apoio, conquistou por meio de muito esforço uma casa própria para ela e sua parceira e investiu no paisagismo para sobreviver, tendo, hoje, um negócio paralelo de venda de objetos decorativos para jardim.

A empresária começou a investir na promoção de eventos GLS (Gays, Lésbicas e Simpatizantes) em Imperatriz, há aproximadamente 20 anos, o que a fez descobrir que tinha talento para o empreendedorismo. O trabalho nesse ramo lhe trouxe experiência necessária para conseguir fazer do bar um estabelecimento bem sucedido.

O bar recebe pelo menos 500 pessoas por mês, com eventos que chegaram a público de aproximadamente 450 pessoas. Durante a semana a entrada é liberada, apenas em eventos maiores, com público de 300 pessoas ou mais é cobrado a entrada no bar. Nessa entrevista, Jardeil Rabelo conta sua história e desafios como empresária LGBT. Perguntamos sobre o que o bar representa para a comunidade LGBTQIA+ de Imperatriz.

 

Imperatriz Notícias – Observando a falta de representatividade de empreendimentos para o público LGBTQIA+ em Imperatriz, o que o bar simboliza para toda a população homoafetiva?

Jardeil Rabelo – É realmente é a única referência nesse segmento de bar e boate. Somos os únicos direcionados, para eles. O único local de diversão e de apoio. A gente faz bingos, faz quando tem gente que precisa, então não é só um bar, ele é um local destinado às causas LGBTQIA+.

IN – Embora existam críticas, qual é a importância de um bar LGBTQIA+ em um discurso de resistência tão pautado nos dias atuais?

JR – A importância é que a gente precisa, a gente tem que ter vez na sociedade. Somos pessoas. A gente paga imposto, estuda, trabalha, tem família, então somos seres humanos como os héteros. Não tem que ter essa distinção. E a gente criou esse bar justamente para as pessoas ficarem mais à vontade, mais do que em bares héteros que não tem esse apoio.

IN – Você acha que nesse local de representatividade que é o bar, as pessoas se sentem mais a vontade que nos outros bares?

JR – Com certeza, por que existem muitos bares em Imperatriz que aceitam os clientes, até porque é crime não aceitar, mas se uma pessoa for ter um afeto maior, um abraço, um beijo, alguma coisa já é discriminado. Tem locais que expulsam o cliente. Lá não, o nosso bar é a vontade para ter um carinho que puder expressar um com o outro, independentemente de gênero.

IN – Você considera o Bar como um refúgio para essas pessoas? É um ambiente de libertação dos padrões da sociedade?

JR – Exatamente. Eu acredito que é. Acho que 80% do público que vai numa boate GLS é para questão de refúgio mesmo. Porque cerveja gelada existe em qualquer bar, som existe em qualquer lugar, atrações existem. A questão da preferência de um público para um bar direcionado é justamente essa liberdade que se tem quando está no ambiente.

IN – O Fruta e Verdura tem atrações de meio LGBTQIA+ como Dj’s DragQueens e cantores gays. Por que apostou nisso?

“É justamente para apoiar, dar lugar para que essas pessoas apareçam mais, que elas sejam mais vistas pela sociedade no geral, porque às vezes só boate GLS [Gays, lésbicas e simpatizantes] contrata”
JR – É justamente para apoiar, dar lugar para que essas pessoas apareçam mais, que elas sejam mais vistas pela sociedade no geral, porque às vezes só boate GLS [Gays, lésbicas e simpatizantes] contrata. Mas aí, com o tempo, passam a ser visto num todo, como Pablo Vittar e Gloria Groove, que são hoje Drags que estão na mídia geral, estão no Rock in Rio, na TVs, na internet. A gente apóia para chegar a esse nível.

IN – Atualmente o bar Fruta e Verdura é considerado LGBTQIA+ ou GLS?

JR – Bom, o termo GLS é um termo antigo, então hoje a sigla mudou é LGBTQIA+. Pode ser que com o tempo, daqui uns anos, ela possa mudar e agregar mais algumas letras, né? Porque cada ano vem aumentando. Então o termo GLS e LGBTQIA+ é praticamente a mesma coisa, a diferença é que a atualidade hoje o LGBTQIA+ e o Fruta e Verdura é justamente para esse tipo de público.

IN – É mais complicado para a pessoa homossexual conseguir emprego? Você passou por alguma dificuldade ao procurar trabalho antes de ter o bar?

JR – Eu tive uma experiência com carteira assinada, que quando o meu padrão descobriu, me demitiu. Então daí pra frente eu procurei trabalhar por conta própria. Mas eu acredito que muitas pessoas sofrem, sim, dependendo do tipo de trabalho não aceitos, quando o patrão sabe que é homossexual.

IN – Você optou por ser empresária por causa desse preconceito dentro do mercado de trabalho?

JR – Na verdade não. Eu já nasci com o dom para o empreendedorismo e esse preconceito que eu sofri no meu primeiro emprego como funcionária acho que acabou me impulsionando. Então eu acho que foram as duas coisas juntas.

IN – Você, por ter um relacionamento homoafetivo e as duas trabalharem no horário da noite, já se sentiram ameaçadas?

Antigamente era muito perigoso, não tinha a lei [Lei 7716/89- que criminaliza a homofobia] que existe hoje e ampara nós homossexuais. Hoje é mais tranquilo
JR – Hoje não mais. Antigamente, há uns 15 anos atrás, quando eu iniciei fazendo eventos GLS aqui em Imperatriz e não tinha um estabelecimento fixo, era mais complicado. O portão era trancado, só entrava quem a gente conhecia. Antigamente era muito perigoso, não tinha a lei [Lei 7716/89- que criminaliza a homofobia] que existe hoje e ampara nós homossexuais. Hoje é mais tranquilo, então, assim, medo disso, não.

IN – Você já sofreu algum preconceito no Bar?

JR – Bom, alguns policiais dão uma “criticadazinha”. A gente vê que eles abrem exceção para os outros bares e com o nosso sempre é muito rígida a fiscalização. Às vezes a gente pergunta o motivo para isso e eles distorcem, mas no fundo a gente sabe que a gente ouve uma coisinha aqui outra ali, que é por conta de preconceito, sim.   

IN – Então você acredita que já teve algum abuso de poder?

JR – Já! sempre! Por exemplo, a lei de Imperatriz, ela delimita que os bares funcionem até as duas da manhã; e o que acontece, às vezes tem um evento maior e a gente quando se dá conta passou meia hora, 20 minutos. Eles chegam impondo e às vezes tratando mau, como se a gente fosse bandido. Aí a gente fecha e os outros bares vizinhos estão abertos. Eu me pergunto: “por que?!”. Já fiz várias perguntas para eles e querer dizer que a gente está desacatando. Eu falei: “não, não estou desacatando, eu estou fazendo uma pergunta e eu queria que você me respondesse objetivamente. Por que o meu bar está fechado, mas o vizinho não fechou? o vizinho do lado, da esquerda, da direita”, aí a gente deduz o que? Homofobia!

IN – Você acredita que existe algum tipo de rivalidade entre os bares do meio LGBTQIA+ em Imperatriz?

JR – Se existe é de alguém comigo, mas o Fruta e Verdura não teve [briga com bares]. A gente é muito assim, de boa. Eu gosto de agradar os clientes, as pessoas. Eu não me preocupo, porque eu acho que a concorrência é válida, ela é importante para o comércio, digo como empreendedora. A concorrência, é bem-vinda, sim, por que? Porque com concorrência você melhora a qualidade de atendimento, você melhora tudo.

IN – O Fruta e Verdura é o único bar LGBTQIA+ auto intitulado em Imperatriz?

JR – Intitulado, sim. Porque existem outros que é aquela coisa, alternativa… Fica aquela coisa assim, por medo de sofrer preconceito, não tem a coragem como nós, que demos a cara a tapa, batemos no peito que somos um bar LGBT! E tem muitas pessoas que não intitula por medo de preconceito, aquela coisa toda.

IN – Com os simpatizantes do governo espalhando esses discursos, houve algum acontecimento de homofóbico no bar?

JR – O que eu acho é que os policiais tomaram mais fôlego, tiveram mais coragem porque o presidente da república é homofóbico. De certa forma os policiais hoje, eles não tem mais tanto cuidado em fazer uma abordagem. Mas é igual eu falo, a mídia está aí, tem os direitos humanos, o gay tem muitos direitos. Então eles [policiais] tem que ter cuidado. No geral não piorou, mas tem uma “influênciazinha’.