“Não deveria existir uma ditadura sobre tudo”, diz fotógrafo sobre o movimento sem gênero

Gabriel Henrique

Fotos: Divulgação

"O que eu quero mostrar para a sociedade, o ponto de partida, é a aceitação de como você é, independente daquilo que julgam ser o ideal para você"
“O que eu quero mostrar para a sociedade, o ponto de partida, é a aceitação de como você é, independente daquilo que julgam ser o ideal para você”

Fotógrafo em Imperatriz há quatro anos, Jefferson Carvalho Borges ingressou na fotografia como um hobby. Em 2016, após uma viagem de trabalho a São Paulo, observou que a capital paulista possuía muitos acervos/brechós para a produção de ensaios fotográficos, algo que ele não visualizava em Imperatriz. “O Acervo é algo que eu sentia muita falta na cidade, de você ter um lugar para alugar peças e ter alguém para ajudar a produzir ensaios. Pelo meu envolvimento com a moda associado à fotografia, eu resolvi iniciar um brechó”, conta o fotógrafo sobre quando surgiu a ideia do acervo Galeria do Mal.

O acervo, cuja divulgação se populariza com as fotos postadas nas redes sociais, nasceu em agosto de 2016 e atualmente conta com mais de 1.200 seguidores em sua conta no Instagram (www.instagram.com/galeriadomal). “Inicialmente eu queria um nome que chamasse atenção, que realmente trouxesse impacto. Então em uma reunião com amigos eu falei “galeria do mal” e o nome pegou de forma positiva”, diz.

Ao que parecia ser somente um empreendimento, acabou transformando-se em uma discussão social acerca de gênero na moda e a ditadura de padrões. O Galeria do Mal leva em sua significação o movimento genderless (sem gênero) que não classifica as roupas em masculinas ou femininas, defendendo a visão de que todos são livres para vestirem o que querem. Nesta entrevista Jefferson Carvalho fala dos os desafios e percepções sobre gênero na moda. Confira a entrevista.

 

Imperatriz Notícias: Se é tão comum vestuário masculino e feminino, por que você acredita que roupa tem gênero?

Jefferson Carvalho: Eu não acredito que uma roupa deva possuir um gênero em específico. Porém, a cultura de separação entre o que alguém pode ou não vestir já existe há tanto tempo, que torna-se difícil educar a sociedade de que o que realmente importa é a pessoa se vestir conforme sente vontade.

 

"o galeria do mal representa não só a comunidade LGBT, mas toda a comunidade que luta por respeito, aceitação e a liberdade de ser"
“o galeria do mal representa não só a comunidade LGBT, mas toda a comunidade que luta por respeito, aceitação e a liberdade de ser”

IN: Então vestir o que quer levanta questões que vão além da moda. O que, por exemplo?

JC: Com certeza, uma dessas questões é o preconceito. Quando a sociedade enxerga pessoas que são diferentes dos padrões, ela tende a olhar torto, julgar e considerar aquilo estranho. Quando um homem usa uma saia porque ele tem vontade, ou quando uma mulher usa roupas que são consideradas “masculinas” porque ela tem vontade, eles não estão dizendo “Olhem para mim eu sou melhor que vocês” mas sim “Ei, uma roupa não me faz diferente de você”.

IN: Falando em preconceito, você sofreu/sofre preconceito ao trabalhar com esses assuntos no Galeria do Mal?

JC: Sim. Hoje em dia eu me considero muito diferente dos padrões, tanto por causa do meu cabelo, roupa e tatuagens. Consequentemente isso gera certos comentários em relação ao meu trabalho, sejam eles positivos ou negativos, mas eu não levo em consideração a negatividade. Não há porque existir uma ditadura sobre tudo, isso não faz sentido.

IN: Você considera que há uma falta de informação sobre o movimento sem gênero em Imperatriz?  

JC: Sim, eu considero que ainda falta muita informação. Para falar a verdade, eu não identifiquei alguém ou um grupo que pautasse essa discussão dentro da cidade. É preocupante, porque quanto mais cedo a sociedade for educada sobre essas questões sociais, maior será o conhecimento, e consequentemente a aceitação, sobretudo o respeito.

IN: Atualmente, marcas como a C&A e Zara, lançaram campanhas que envolvem a moda sem gênero. Você visualiza que essas campanhas abrem espaço para todos os tipos de corpo ou ainda é algo padronizado?

JC: Eu ainda não vejo um apelo das marcas grandes no atendimento a todos os corpos, espero que isso mude em breve.

IN: E o seu movimento atende isso?

JC: A forma com que eu enxergo o meu movimento, visando aquilo que eu desejo crescer e criar futuramente, é para todas as pessoas, sem exceção. O que eu quero mostrar para a sociedade, o ponto de partida, é a aceitação de como você é, independente daquilo que julgam ser o ideal para você.

IN: Por que se associar à fotografia e à moda para fomentar a discussão de gênero na cidade?

JC: Essa foi a melhor forma que eu encontrei, por possuir envolvimento direto com essas duas áreas (fotografia e moda). Mas eu queria algo humanizado, com a colaboração de várias pessoas que partilhassem da mesma discussão para agregar ao movimento. Além disso, a fotografia é um reflexo visual que chama atenção, isso ajuda a levantar discussões.

IN: O Galeria do Mal possui uma relação de representatividade com a comunidade LGBT?

JC: Acredito que hoje, o galeria do mal não representa somente o movimento sem gênero, mas toda a minoria. Ele é feito para as pessoas que sofrem preconceito, para aqueles que buscam a auto aceitação, que travam essas lutas diárias dentro de uma sociedade com uma carga opressora muito forte. Então sim, o galeria do mal representa não só a comunidade LGBT, mas toda a comunidade que luta por respeito, aceitação e a liberdade de ser.

IN: Você pretende levar as discussões de gênero para fora do acervo?

JC: Eu costumo dizer que o galeria do mal é bagunça, eu quero que ele seja um brechó, um acervo, uma galeria, um lugar de discussões e questionamentos, literalmente uma bagunça. Pretendo juntar um movimento através do galeria do mal para debater sobre gênero, sobre a comunidade LGBT e sobre muitas outras questões. Eu acredito que esse trabalho vai ser uma forma de humanização e educação para a cidade, eu não me considero alguém totalmente informado, mas eu acredito que um trabalho em conjunto facilite essa educação. É fomentando uma troca de conhecimentos que se enriquece a informação a educação e assim, fazer desse movimento uma bagunça maior ainda.

 

Ela veste a roupa que quiser...
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Ele veste a roupa que quiser ...
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