Em carta aberta aos pais, Psicóloga Infantil, Andressa, aponta problemas e soluções no isolamento social das crianças

Fotos: Acervo Pessoal

Repórteres: Eduarda Figueredo e Kennedy Mendes

Mestra em Psicologia Infantil, Andressa Cury, 30 anos, graduou-se e se tornou mestre pela Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPAR), antiga UFPI – Campus Parnaíba. Além da atividade clínica, hoje trabalha no CRAS – Centro de Referência de Assistência Social. A profissional admite que as crianças têm curiosidade sobre seu trabalho, se ela gosta de crianças ou se é mãe…” Andressa não tem filhos, mas desde nova sonhava em trabalhar na área.

A psicóloga conta que a paixão pela área infantil começou em 2015, quando a universidade estava em greve e conseguiu uma vaga de estágio na Casa do Acolhimento de crianças em situação de violência. Ela fala que o coração pulsa por esse lado desde o contato que teve com a violência infantil, por isso a importância da escuta é uma questão presente no seu discurso.

Após concluir o mestrado, Andressa começou uma especialização em Gestalt Terapia com crianças e adolescentes, um modelo psicoterápico com foco na responsabilidade de si mesmo, na experiência individual do momento atual, espécie de terapia que induz à autorreflexão, à descoberta independente da própria cura. O foco também é na área infantil e ela faz de forma remota.

Em entrevista cedida ao Imperatriz Notícias, a psicóloga chama atenção para os novos entendimentos de convivência familiar e a adaptação necessária para que pais e filhos não saiam do eixo. Ela esclarece as dificuldades dos afetados pela rotina pandêmica, expõe a melhor maneira de lidar com os problemas que surgem, com dicas e soluções que fazem toda a diferença na prática. Ela explica como as famílias podem usar o tempo ao seu favor e de que forma as novas configurações se alteram, como as pessoas podem melhorar aspectos pessoais e superar desafios quando essas relações estão unidas à resiliência e uma boa comunicação.

 

Imperatriz Notícias – Não deixar as crianças expostas a qualquer tipo de conteúdo é uma estratégia válida para evitar uma série de problemas psicológicos. Você recomenda que os pais devem fazer esse controle frente às notícias relacionadas à Covid-19?

 

Andressa Cury – A gente percebe que muitas crianças têm contato a mais com a internet devido às aulas remotas, é incrível o número de crianças hoje com celular, se antes era grande, hoje é ainda maior. Muitos pais perdem o controle da situação em relação ao conteúdo que o filho vê, muitas crianças, devido à mídia, acabam apresentando comportamento agressivo, por exemplo. Em relação à Covid-19, as notícias podem causar ansiedade e medo extremo na criança, mas acredito que ela deve ser informada por um responsável, pai ou educador, de uma forma compreensível, numa linguagem simples, sem expor notícias aterrorizantes ou alarmantes, num processo educativo.

“Andressa Cury – A gente percebe que muitas crianças têm contato a mais com a internet devido às aulas remotas, é incrível o número de crianças hoje com celular, se antes era grande, hoje é ainda maior. Muitos pais perdem o controle da situação em relação ao conteúdo que o filho vê, muitas crianças, devido à mídia, acabam apresentando comportamento agressivo, por exemplo.”

IN: Ser realista ou omitir os fatos? O que protege mais? Existe um meio termo?

AC: Ser realista é importante, mas temos que ver até que ponto a cognição da criança está preparada para uma informação, acredito que ela deve saber numa linguagem acessível, de um jeito que não as atinja emocional e psicologicamente. Tantas crianças apresentam ansiedade, é preciso ter esse olhar para amenizar as informações, o que é realmente necessário, se vai mudar algo na vida dela, qual a importância de saber certa notícia, é necessário fazer essa reflexão.

 

IN: Qual seria a forma mais eficiente de ser um bom ouvinte das dúvidas que podem surgir nas crianças? Por que escutar é uma prática tão importante no desenvolvimento infantil?

 AC: Não existe uma fórmula que nos faz ser bons ouvintes, mas acredito ser primordial empatia com as crianças e com o que elas vivem, elas não são ouvidas dentro de casa nem em diversos outros meios, e na Psicoterapia são acolhidas, os sentimentos e o que têm a falar são validados. A escuta leva à empatia, gera afeto, fortalece os vínculos, eleva a autoestima, elas começam a acreditar em si mesmas, tudo isso entra em ação a partir do momento em que a criança é ouvida.

 

IN: A interação social  na escola é muito importante para o aprendizado das crianças, um ano de pandemia se passou e as rotinas escolares sem previsão de voltarem à normalidade. De que maneira essa nova realidade afeta o psicológico e o convívio das crianças com a família?

 AC: Nós somos seres sociais, necessitamos estar em sociedade para aprendermos a falar, andar, se comportar, para o desenvolvimento das nossas habilidades sociais e emocionais. Quando se pensa como os pequenininhos estão vivendo nessa rotina totalmente diferente e mais remota é muito complicado falar o que afeta… questões de estresse, ansiedade, questionamentos – “quando isso vai acabar?”. Crianças acostumadas com aulas presenciais confinadas à distância por vezes não conseguem absorver o conteúdo, causa estresse e demanda dos pais mais atenção. Existe todo um contexto familiar e não só a criança é atingida, a mãe, por exemplo, que traz trabalho para dentro de casa, muitas vezes com a responsabilidade de cuidar da família, do lar e ter que assumir outras funções para além do que estava acostumada a exercer antes da pandemia.

 

IN: O comportamento dos pais é espelho para os filhos, eles absorvem com facilidade. Como os cuidados dos adultos podem ajudar as crianças na compreensão de toda essa situação?

 AC: De fato as crianças aprendem muito mais observando o comportamento dos pais do que ouvindo seus conselhos, logicamente a comunicação é primordial também. Caso um pai trabalhe pelo celular, ele deve comunicar à criança que precisa do aparelho para trabalhar, que o seu sustento depende disso, para dar um bom exemplo a ela. O comportamento dos pais deve ser compatível ao que eles querem que as crianças aprendam, não dá para ser diferente daquilo que preza.

“De fato as crianças aprendem muito mais observando o comportamento dos pais do que o ouvindo conselhos”

 

IN: Existem projetos que dão amparo para crianças que perderam familiares próximos para a Covid-19. Qual a forma ideal de lidar e dar assistência nessa situação?

 AC: Essas crianças devem entrar em atendimento psicológico para realmente lidar com a perda, na terapia a criança vai ter a possibilidade de se libertar de traumas, ser entendida, ter seus sentimentos aceitos para se compreender e se localizar dentro do contexto familiar.

 

IN: Home office para adultos e ensino à distância para crianças, como manter e proporcionar saúde mental para administrar o tempo, a disciplina e a eficácia desse ensino durante o isolamento social?

AC: A construção de um cronograma bem feito e bem realizado pode proporcionar controle, disciplina e satisfação. Precisa caber um momento de relaxamento para a família dentro de casa, fazer meditação ou uma comida favorita pode melhorar a saúde emocional. O cronograma é importante tanto para as crianças quanto para os pais, é interessante que incluam atividades físicas pelo YouTube, por exemplo, um momento de descarregar energia.

 

IN: Que resquícios psicológicos o isolamento social pode trazer para essa geração pós-pandêmica?

 AC: Existe uma divisão de mundo antes e depois da pandemia, a nossa forma de lidar, ver e perceber vai mudar ainda mais, vamos nos lamentar e nos alegrar, ter resiliência, vai chegar a ansiedade, causar medo e tudo bem. A psicologia está com o olhar acessível à população para mostrar a importância da psicoterapia, desconstruir tabus que ainda giram em torno disso, com a pandemia ela tem avançado e ganhado mais espaço nos lares, gerou um aumento de demanda clínica de crianças por conta desse novo contexto. Assim, é importante ter ajustamento criativo, tentar se reinventar e se sobressair para viver no mundo que agora imprime mudanças e todo cuidado.