Entre o corpo e a mente: a saúde mental dos universitários

Kalebe Carvalho

Kamila Tomich

Márcia Cardinot

Uma pesquisa realizada com estudantes da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e da Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (Uemasul), em Imperatriz (MA), revelou que a prática esportiva tem papel fundamental na saúde mental dos universitários. Os participantes do estudo eram de cursos variados, como Medicina, História, Engenharia de Alimentos, Pedagogia, entre outros, sendo que 57,1% tinham entre 21 e 25 anos, 66,7% eram homens e 61,9% estudantes da instituição.

Treino do time de futsal feminino da Uemasul. (foto: Kamila Tomich)

Os resultados mostraram que a prática esportiva universitária tem impacto extremamente positivo na saúde mental, atuando como ferramenta de regulação emocional, gestão do estresse acadêmico e até prevenção/tratamento informal de sintomas de ansiedade e depressão. A maioria dos entrevistados afirmou praticar atividade física regularmente e destacou o esporte como uma forma de aliviar a pressão diante dos estudos. “Minha jornada acadêmica é bastante puxada e, inevitavelmente, se torna estressante em muitos pontos, o esporte vem justamente como válvula de escape”, comenta o estudante de Medicina da UFMA, João Pedro Orsano Bastos.

Assim, com a prática esportiva, esses atletas dizem perceber melhora no humor, redução da ansiedade, diminuição do estresse, aumento da autoestima, maior concentração e melhora na qualidade do sono. “Você chega, desconta toda a raiva do mundo no esporte e sai outra pessoa dali. Melhora a sua vida e aí vai fazer os seus afazeres. Dá até um ânimo a mais”, destaca Marília Brandão, estudante da Uemasul.

Mayko Paz, também estudante da UFMA, comenta que o esporte é um dos principais meios para tornar a vida universitária um pouco mais leve. “Para mim, o esporte, hoje, é uma válvula de escape. Tem semanas difíceis, questões pessoais e questões universitárias. E quando tudo isso embola, eu só quero ir para um treino, poder esquecer de tudo isso e me exercitar, poder ver pessoas, rir, esquecer um pouco dessa rotina desgastante e me dedicar ao esporte”, relata ele.

Treino de basquete da Associação Atlética Acadêmica de Medicina Império (UFMA). (foto: Isidorio Bispo)

De acordo com a pesquisa, os principais sintomas relatados pelos atletas são ansiedade, estresse, tristeza e falta de ar. Tais sintomas podem ser resultado das dificuldades e da pressão da vida acadêmica, tornando os estudantes universitários mais vulneráveis às doenças psicossomáticas. “Fui diagnosticada com depressão em 2020 e, desde lá, venho, entre idas e vindas, treinando futsal, corrida e às vezes queimada, pois os esportes me ajudam a desacelerar os pensamentos intrusivos e a aliviar minha ansiedade”, relata uma das participantes da pesquisa.

Embora apenas 9,09% dos entrevistados tenham respondido que não sentem nenhum desses sintomas, poucos afirmaram já ter buscado ajuda profissional, mesmo com ambas as universidades oferecendo suporte psicológico. O campus da UFMA de Imperatriz conta com o Núcleo de Apoio Psicológico – NAPSI, que disponibiliza duas psicólogas (uma na Unidade Bom Jesus e outra na Unidade Centro) para o serviço de apoio psicológico. Já a Uemasul possui o Núcleo de Assistência Psicológica – NAP, com atendimentos presenciais e online para toda a comunidade acadêmica, incluindo alunos e prestadores de serviços.

“O esporte era a válvula de escape dele, mas não foi a solução. Mesmo assim, aqui (no treino) era o único momento que ele tinha. Ele extravasava. Por isso, quem o via em quadra, em campo e em competições, não imaginava o que ele estava passando”, relembra Marília Brandão. Ela se refere ao caso de um colega de time que tirou a própria vida no ano passado, vítima da depressão. Além disso, a estudante da Uemasul reafirma a importância da relação entre o esporte, a rotina acadêmica e o acompanhamento psicológico.

Treino do time de futsal da Uemasul. (foto: Kamila Tomich)

Pedras no caminho

“A quadra que nós temos no campus, se encontra na Unidade Bom Jesus, onde há bastante dificuldade de acesso, principalmente à noite, que é o momento em que a grande maioria dos estudantes têm tempo para se dedicar aos treinos, e se encontra abandonada”, relata Isidorio Bispo, estudante de Medicina na UFMA. Diante da pesquisa, os estudantes apontam que, apesar dos benefícios, ainda encontram barreiras que limitam a prática de esportes nas universidades públicas, como falta de recursos, apoio institucional, infraestrutura e até episódios de discriminação, que interferem na experiência esportiva plena. “Toda vez que jogamos futsal com times de fora, eu, por ser gay, escuto piadinhas”, conta um dos estudantes.

“Acho que incentivos financeiros, como o bolsa atleta, que já existem poderiam ser mais difundidos e terem mais vagas”, reitera Paz. Assim como Mayko, Isidorio concorda que o acesso ao auxílio do “Bolsa Atleta”, oferecido pelas universidades, não é bem difundido, tendo em vista a baixa quantidade de vagas e os extensos pré-requisitos para o recebimento do benefício. “Acho que a universidade poderia propiciar um acesso maior ao esporte, por meio de uma bolsa que não fosse individualizada, mas uma voltada para as Atléticas, que ajude a custear os gastos com os professores e com o aluguel de quadras”, sugere.

Já Marília diz que a Uemasul possui quadra própria e em bom estado, mas, mesmo assim, os atletas ainda encontram dificuldades para pagar os treinadores e materiais para os treinos. “Às vezes, a universidade não consegue proporcionar o professor, os alunos se mobilizam e pagam por fora. Eles poderiam fornecer material e incentivo para viagens e competições que a gente tem no âmbito universitário”, diz a estudante.

Além disso, na pesquisa, alguns participantes disseram sentir falta do esporte como forma de socialização, que promova a participação de todos, independentemente de suas habilidades ou necessidades específicas. “Sinto falta de inclusão de pessoas com deficiência nos esportes, como por exemplo na UFMA de São Luís, onde tem incentivo para basquete para cadeirantes”, afirma Orsano.

Além das quadras

Durante a pesquisa, observou-se que boa parte dos participantes vem de outras cidades. Muitos relataram que o esporte teve um papel fundamental não apenas na rotina acadêmica, mas também na adaptação à nova realidade longe de casa. “A prática esportiva acaba sendo esse laço. É um momento de união mais forte entre pessoas de vários períodos, de várias localidades, quando a gente se une para tirar o estresse, para se divertir e para rir”, afirma um dos estudantes.

Mayko (à direita) e o time de vôlei feminino da Atlética Império (Medicina UFMA) (foto: Isidorio Bispo)

“Eu sempre gostei de praticar esportes, me sentir vivo e ativo, mas aqui em Imperatriz foi uma necessidade, sabe? É um refúgio, foi onde eu encontrei meus melhores amigos, minha namorada e é onde eu encontro paz”, relata Mayko Paz. O estudante do 6° período veio de Fortaleza para Imperatriz e, atualmente, é o presidente da Atlética do curso de Medicina. Esse relato confirma que o envolvimento com as atividades esportivas proporcionou benefícios que vão além do desempenho em quadra: fortaleceu vínculos sociais, ajudou no enfrentamento da solidão e promoveu um sentimento de pertencimento.

O cenário revelado pela pesquisa sublinha a prática esportiva universitária como um pilar essencial, mas insuficientemente explorado, no bem-estar integral dos estudantes da UFMA e Uemasul. Embora atue como uma poderosa “válvula de escape” e ferramenta informal de saúde mental, seu potencial é barrado por desafios estruturais, como infraestrutura precária e falta de apoio institucional. A pesquisa reforça que o esporte é um auxílio vital, mas não substitui o suporte psicológico profissional, clamando por um aprimoramento urgente nas políticas de esporte e saúde mental para garantir um ambiente acadêmico mais saudável e inclusivo.

Produto desenvolvido por acadêmicos do curso de jornalismo da UFMA/Imperatriz na disciplina de Leitura e produção textual Il, coordenado pela professora Camila Viana.