Conheça Bruno Moraes, um dos únicos da cidade de Itinga ao entrar na Universidade Federal para estudar Medicina
Por: Eula Rebeca
“Pode parecer clichê falar isso mas eu sempre tive muita admiração pela área da saúde, pelos profissionais, a questão de poder cuidar das pessoas, então sim, sempre foi o meu sonho.” É assim que Bruno Morais de 19 anos, estudante de Medicina na Universidade Federal do Maranhão, responde quando perguntado qual foi a sua motivação para entrar no curso.
Apesar da fala ser comum entre os estudantes da área da saúde, a história dele não é nada clichê, vemos em toda temporada de vestibular vários relatos de alunos que dão tudo de si para conseguir tal feito, e com Bruno não foi diferente, mas ele é natural de Itinga do Maranhão, munícipio do interior do Maranhão e foi um dos poucos alunos na história da cidade a conseguir ingressar no curso de Medicina na Universidade Federal do Maranhão, na cidade de Imperatriz no ano de 2020, fato que teve muita repercussão entre os moradores do município, por ser algo tão inédito.
Vindo do interior, ele relata que sua maior dificuldade durante os anos de tentativa para o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), foi a falta de bagagem em conteúdo que ele obtinha.
“Só percebi o quanto o ensino no interior é defasado quando me dei de cara com essa realidade, eu cheguei em Imperatriz, era uma disparidade muito grande a realidade do ensino das escolas daqui com as escolas do Itinga, principalmente as escolas particulares que eram meus principais concorrentes”.
Bruno Moraes
O Exame Nacional é a porta de entrada para muitos alunos que desejam adentrar o Ensino Superior, ele utiliza o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), programa do governo federal que concede vagas nas universidades públicas a candidatos que prestaram o Enem. Para participar, é necessário realizar a edição mais recente do vestibular e alcançar uma nota maior que zero na redação. O curso de Medicina apresenta as maiores notas de corte em todo o país, em 2020 ela chegou a 916,92 em Imperatriz.
Bruno só pôde ser selecionado no Exame para o curso, por meio da cota racial e de escola pública “a cota racial é muito importante, mas a de escola pública pesou muito pra mim, de onde eu vim ela é capaz de minimizar essa desigualdade dentro da faculdade”, afirma.
Esse fato já é de conhecimento popular em um País tão desigual como o Brasil, já é uma tradição entre os alunos de escola pública saberem que para terem as mesmas oportunidades que os alunos de instituições privadas, irão ter que se esforçar três vezes mais para correr atrás do que falta por conta das condições de ensino de redes municipais e estaduais. Para tentar remediar a situação, a Lei 12.711/2012 garante que 50% das vagas nas Universidades Federais e nos Institutos Federais de Educação sejam destinados para alunos que fizeram o Ensino Médio em escolas públicas municipais, federais ou estaduais.
Educação é direito, mas no no interior é privilégio
Mas isso não quer dizer que para alunos onde o educação de base chegue com mais dificuldade, a Lei seja tão eficaz assim. Em um contexto de pandemia, as aulas online representam um empecilho ainda maior de alcançar o sonho do Ensino Superior, para os que não residem nos grandes centros urbanos e não tem condições de se matricular em faculdades privadas. Em uma pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estática (IBGE), somente 56,1% dos maranhenses tem acesso à internet. O estudante João Victor (nome fictício para preservar anonimato fonte), por exemplo, da rede de ensino do Estado do Maranhão de Itinga, confessa que o seu uso com a internet é limitado devido aos dados do seu celular, e que as aulas remotas dificultam a vida de quem não é acostumado com tecnologia. “A ideia é legal, mas eu acho que deveria ser pensado mais na gente de lugares mais afastados, lugares com mais dificuldades de ter acesso às redes sem fio para as realizações dessas atividades escolares”, lamenta.
A professora de Português do ensino médio da Rede Estadual de Itinga, Eronilde Alves, comenta que a medida de aulas online foi uma saída encontrada para que o calendário escolar não seja ainda mais afetado pela crise do COVID-19, porém, apesar do engajamento dos alunos que podem participar, a falta de acesso à internet de qualidade é um problema para que as aulas sigam com um bom aproveitamento. “Eles não conseguem entrar na sala e falam que é muito pesado, as aulas consomem muita internet e muitos usam dados móveis, pois não têm wi-fi em casa”.
A professora ainda ressalta que para os alunos do turno noturno as dificuldades são ainda maiores, e que recebe reclamações de todas as turmas. “Para os alunos da noite não está sendo proveitoso, nem 50% conseguem participar, são os meninos que trabalham informalmente, são as meninas que são mães, são os senhores do EJA”, completa. Ou seja para os estudantes pertencentes ao Ensino Médio, as chances de disputa entre os moradores de cidades maiores está ainda mais desproporcional.
Infelizmente ainda sendo uma exceção, Bruno acredita sim que sua história que pode uma fonte de inspiração para aqueles são do interior e tem o sonho de mudar a história das suas famílias através do Ensino Superior, ocupando as Universidade Federais, que afinal de contas um direito para todos. Aos conterrâneos da cidade natal ele deixa a conselho, “Pra quem tem o sonho, independente do curso não desista, apesar da sua condição, do que for, há sempre um jeito pra tudo, você tem que persistir e lutar”.