”O livro desperta a possibilidade de o leitor imaginar uma outra forma de realidade”, diz Sérgio Maggio

Escritor buscou um processo de aproximação respeitoso com as suas personagens

O jornalista baiano é autor do livro Conversas de Cafetinas, que ganhou o prêmio Jabuti em 2010

Texto: Andréia Liarte

Fotos: Divulgação

Para o jornalista e escritor baiano, Sérgio Maggio Sousa Santos, de 54 anos, natural de Salvador, formado em jornalismo pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e autor do livro premiado pelo Jabuti, Conversas de cafetinas, o universo do livro-reportagem dá mais liberdade para os repórteres do que outros meios jornalísticos, já que permitiria um exercício de mais profundidade na apuração. “Eu queria muito essa profundidade e me esbarrava na limitação e na superficialidade das reportagens”, afirma o jornalista.

Maggio pondera que a escolha do tema é importante na hora da elaboração do livro. “É a motivação, a paixão, o desejo de se instigar por aquele tema, isso é fundamental porque é algo desgastante”. No caso do livro Conversas de Cafetinas, o tempo entre apuração e escrita foi de quase dois anos. “O tema preferencialmente deve ser algo que está sendo pouco explorado, mas não impede de ser algo que já foi contado, tentar de alguma maneira mostrar outros ângulos”, explica o escritor.

Livro traz uma visão mais humanizada sobre as cafetinas do interior da Bahia

Humanização

”Eu acho que, pra mim, o que eu tinha era medo de não conseguir fazer o livro, porque eu lidava com fontes que estavam fora da lei. Então, conquistar a confiança dessas fontes, isso sim foi uma grande vitória”, relata Maggio. Ele acrescenta que durante o processo de contato com as cafetinas, passou muito tempo nos bastidores até aproximar-se das personagens e elas percebessem quais eram realmente as suas intenções como jornalista.

O autor diz que preza pela liberdade dos seus entrevistados. ”Não querer arrancar essa entrevista a qualquer custo. Tinha que ser espontânea, até porque eu estava trabalhando com o diálogo possível, no qual se estabelece uma relação de afeto, de encontro”, menciona o escritor, referindo-se aos estudos da pesquisadora Cremilda Medina. Maggio afirma que, na verdade, o seu principal dilema ético se deu após as entrevistas com as cafetinas: “Era ser de alguma maneira fiel às expectativas que elas tiveram comigo”.

Conscientização dos leitores

A principal intenção do escritor ao produzir Conversas de cafetinas era, segundo afirma, que essas mulheres se sentissem mais representadas. ”Eu tinha muitos leitores na minha cabeça, mas o principal era o leitor afetivo, que eram essas mulheres. Eu escrevi o livro para elas”, explica o jornalista. Em um segundo estágio, esse leitor seria o que tivesse acesso ao livro. “Eu queria fazer dele um leitor cúmplice. Como eu sei que é muito difícil você ficar diante de uma cafetina, eu queria que esse leitor estivesse comigo nessa conversa, fosse minha testemunha, que eu o levasse para dentro do lugar que eu estava com ela naquele momento”.

Maggio alerta sobre a importância do livro-reportagem na educação brasileira. ”Ele é muito lido em escolas, universidades e traz essa capacidade de perceber um mundo para além do que está nas linhas do jornal onde, enfim, só o crime ou só as condições dessas mulheres determinam qual é a narrativa da reportagem”.

Para o jornalista e escritor, livros-reportagem como o que ele escreveu podem ter o poder “muito profundo”, sem que necessariamente ele queira “catequizar ninguém”. “O livro desperta a possibilidade de o leitor imaginar uma outra forma de realidade. No meu caso, os meus leitores viram uma outra mulher, que não o estereótipo, que não é o clichê, né?”, acredita. Para Maggio, esse processo desperta, inclusive, a consciência crítica do leitor, porque no processo de leitura, ele pode ser capaz de perceber “outra forma de olhar o mundo, de ver essa resposta muito imediata sobre esses perfis.”

A entrevista original com o jornalista foi feita no contexto da pesquisa Jornalistas escritores de livros-reportagem no Nordeste, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Jornalismo de Fôlego, do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz, pela estudante e pesquisadora Viviane Reis Silva.