Apac apresenta estratégias para humanizar sistema prisional

Associação de Proteção e Assistência aos Condenados estimula a reintegração

Camila Souza

Trabalhando com a ressocialização de cerca de 87 pessoas, a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), localizada no bairro Beira Rio, é considerada aliada tanto da sociedade, quanto do sistema judiciário. O objetivo da instituição é promover a humanização dos presos, tornando-os aptos ao retorno à sociedade, sem perder de vista a finalidade punitiva da pena. Uma das formas de reintegração é a venda de artesanato produzido pelos próprios presidiários, como metodologia de reintegração.

Apac fica em prédio alugado localizado na avenida Beira-Rio (Crédito: Camila Souza)

Cerca de 37 recuperandos estudam na unidade, por meio da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), sendo separados em três turmas: uma vespertina e duas noturnas. A intenção, segundo Marcílio, é proporcionar às pessoas qualidade de ensino e formação profissional. O coordenador informa que muitos tiveram a oportunidade de obter graduação a partir das provas do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Enceja) e há cinco inscritos no Programa Universidade para Todos (Prouni), na modalidade de Ensino à Distância (EAD).

Outros 12 fazem cursos superiores na Apac, sendo a maioria particulares, e seis colarão grau em setembro. A instituição oferece, ainda, cursos profissionalizantes online. Nas práticas de leitura, todo mês cada detento recebe um livro e, ao final da leitura, são estimulados a produzir uma resenha.  

Marcílio Cortez é um dos responsáveis por aplicar a metodologia em Imperatriz. Sua equipe é composta por cinco pessoas, incluindo enfermeiras, psicólogo, assistente social, advogado, e um auxiliar administrativo. Formado em Serviço Social, Marcílio, além de dar o suporte aos demais profissionais, também coordena a agenda de programações do Centro de Reintegração.

Vida nova ou não

Índices mostram que cerca de 85% dos presos que saem da unidade prisional tradicional, reincidem e voltam ao local. Um dos principais motivos, segundo especialistas, é que o tratamento recebido nessas instituições que não investem em ressocialização não promove reflexões ou mudanças na mentalidade do detento, apenas o induz a voltar à vida do crime.

Segundo um dos profissionais da Apac, que preferiu não se identificar, isso ocorre por conta das crenças alimentadas em muitas prisões de que “Bandido bom, é bandido morto”, ditado que interfere na pacificação dos detentos. Na instituição de reintegração, os números são totalmente diferentes: 77% dos recuperandos não voltam para o mundo dos crimes e muito menos para as unidades prisionais.

Um dos entrevistados, que prefere manter o anonimato, afirma que o principal objetivo da Apac é promover a justiça restaurativa. “A gente socorre a sociedade, e quer promover um sentimento de segurança aos donos de estabelecimentos, donas de casa. Porque quando o indivíduo passa pela Apac, retorna à sociedade com outra visão de mundo. Ele diz que não vai mais praticar nenhum tipo de crime. É mais uma segurança que eu dou ao cidadão imperatrizense”, analisa.  

Humanização

De acordo com Marcílio Cortez, a principal diferença é a humanização. “O sistema prisional vê muito o indivíduo pelo crime que ele cometeu. Ele entra na prisão e é visto pera sua periculosidade, e é conhecido pelo artigo que ele responde pelo crime que cometeu”, comenta. Na instituição, por exemplo, eles recebem um crachá com seus nomes, uma forma de humanizá-los. Obviamente que na Apac nós não passamos a mão na cabeça deles, mas vemos eles pelo lado humano e pelo social”, pondera.

Marcílio ressalta a importância de manter a equipe multidisciplinar, atenta às questões jurídicas e também ao humano. Além disso, a primeira ação que o sistema prisional opera é “retirar a personalidade das pessoas”, como comenta Marcílio. Assim que chega na unidade, por exemplo, o prisioneiro já precisa vestir uniformes, fator de quebra da sua individualidade, na opinião do coordenador. Na Apac, por outro lado, cada um usa suas vestimentas de acordo com o estilo que mais aprecia. Outro ponto enfatizado é a não necessidade de agentes penitenciários, ou seja, não há segurança armada na instituição.

Existem três passos para seguir e avaliar se o detento está apto para a transferência do presídio à ressocialização, conforme explica Marcílio. O primeiro deles é saber se o indivíduo está sentenciado, ou seja, não são recebidos presos de custódia. O segundo e principal, na sua visão, é apurar se ele realmente quer se integrar às atividades da Apac.

Segundo outro entrevistado que deseja manter o anonimato, “o reeducando que deseja vir aqui para Apac está dizendo, em linhas gerais, que ele quer uma mudança de vida, que quer se restabelecer e voltar para a sociedade como um cidadão de bem”. O terceiro ponto é a entrevista com a pessoa, sendo que, na sequência, a pessoa é encaminhada para a vara de execuções penais. Lá, irá aguardar a autorização do juiz no veredito se o detento pode ou não ser transferido para a intituição.

Marcílio confirma que das 23 pessoas que foram selecionadas para a Apac recentemente, dois desistiram, já que acharam “pesada” a disciplina. “A Apac é para todos, porém, nem todos ainda estão para a Apac”, cita o assistente social.

Loja de artesanato direcionada à venda de trabalho dos presos (Crédito: Camila Souza)

Apac feminina

A Apac de Imperatriz ainda não disponibiliza um prédio para receber detentos do sexo feminino. A penitenciária de Imperatriz/Davinópolis abriga mulheres, mas a casa de ressocialização não conseguiu desenvolver uma edificação própria para alojá-las. Atualmente, no Brasil, existem cerca de nove Apacs femininas, inclusive uma unidade experimental em Viana (MA).

Marcílio pondera que o alojamento para mulheres detentas não está previsto em um futuro muito próximo, já que o espaço no bairro Beira-Rio é alugado. “O custo da Apac é bem menor em relação ao das penitenciárias, mas infelizmente ainda não somos autossustentáveis e não conseguimos parcerias das iniciativas privadas”, lamenta.  Para conseguir parcerias, seria preciso obter um espaço maior, o que não é o caso do prédio atual, informa um profissional que não deseja revelar a identidade.    

Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística, chamado Meu Canto Também é Notícia. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar histórias jornalísticas em seus próprios bairros. Essa é a primeira publicação oficial de todas, todos e todes.