“Um dos grandes desafios é fazer com que o jovem sonhe”

Lisandra Oliveira

Naldo Belone relata os obstáculos e experiências do projeto Batuk

A Vila Vitória, em Imperatriz (MA), bairro conhecido por sua falta de infraestrutura e alto índice de criminalidade, também abriga em suas fronteiras uma fonte de esperança. O projeto Batuk, fundado por Naldo Belone e sua esposa Ellen Ornelas, em 2012, oferece uma nova perspectiva para crianças e adultos ultrapassarem as barreiras da realidade que convivem.

O fundador da organização conta que veio à cidade a trabalho e, ao se hospedar na comunidade, conviveu com um cenário que o comoveu. Se deparar com diversas crianças com fome e seminuas, lhe despertou um incômodo profundo. “Se a gente não fica indignado, tem algo de errado com a gente”, pontua Belone sobre a situação. A partir desse momento, nasceu ali, na calçada do lugar onde ele teria vindo para ficar de forma temporária, o projeto ao qual ele dedica sua vida.

Origem

Naldo começou arrecadando roupas e alimentos. Procurou dar início, assim, a um trabalho de não só ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade, mas também devolver alegria ao público infantil. Foi o caso de Gustavo Silva, que relata uma profunda gratidão e ligação com o projeto. “O Belone tinha uma Kombi branca. Na época, ele ia nas casas das crianças buscando uma por uma, para nos levar para brincar. Sei que no começo ele pode ter tido dificuldades, mas éramos só crianças, nosso interesse estava em andar de skate, jogar bola ou brincar de pipa”. Para Gustavo, o projeto Batuk desempenhou um papel fundamental em sua vida desde a infância. “Hoje eu sou muito grato pelo o que ele fez por mim e por minha família. O projeto moldou meu senso de justiça”.

Naldo busca oferecer aos jovens uma oportunidade de crescer, mas expandir o senso de realidade deles não é uma tarefa fácil. “Um dos grandes desafios é fazer com que o jovem sonhe”, acredita. A ideia central do trabalho do fundador da organização é “ensinar a pescar”, ou seja, oferecer oportunidades que permitam aos jovens se tornarem independentes e protagonistas de suas histórias. Ele enfatiza que, embora compartilhar cestas básicas possa aliviar temporariamente a fome, não resolve as causas estruturais da pobreza e da desestrutura familiar.

A narrativa da organização que atua em prol de pessoas em situações de vulnerabilidade se desenrola em um cenário onde o tráfico de drogas e a violência se tornaram realidades cotidianas, especialmente entre os jovens. Naldo destaca a urgência de afastar jovens do tráfico, uma realidade sedutora e perigosa presente na comunidade. “A nossa missão é levar essa pessoa para um nível maior através do amor”, afirma.

Uma das principais ações do projeto de Naldo Belone (à esquerda) envolve artes marciais (foto: divulgação)

Principais desafios

Desde o início, o projeto enfrentou dificuldades em garantir os recursos financeiros necessários para suas operações. Encontrar pessoas dispostas a investir dinheiro e apoiar o Batuk de forma consistente é uma luta constante. “Os desafios são os mesmos de 12 anos atrás. Financeiro, pessoas que queiram investir em pessoas”, define o fundador da organização. A necessidade de financiamento está ligada diretamente à capacidade de implementar e manter as atividades e programas.

“Meu objetivo é gerar protagonistas, gerar nessas pessoas esperança, um desejo de transformação, através de quê? De uma qualificação profissional”, define Naldo. O projeto oferece cursos profissionalizantes e atividades esportivas, que são ferramentas para afastar jovens do ciclo do tráfico de drogas e da violência. A intenção é oferecer alternativas viáveis para um futuro melhor. Mas o trabalho de motivar e apoiar os indivíduos para que se tornem agentes ativos em suas próprias mudanças é complexo e contínuo.

A pandemia de Covid-19 trouxe novos percalços, como a diminuição significativa de doações e o fechamento temporário de atividades presenciais. Esse período de isolamento exacerbou as dificuldades enfrentadas pela comunidade, mas também revelou a resiliência da organização. Eles adaptaram suas abordagens, realizando atividades online e mantendo o contato com os jovens, mostrando que a solidariedade e a união são fundamentais em tempos de crise.

Projeto Batuk promove inclusão social de crianças e adolescentes (foto: divulgação)

O esporte desempenha um papel importante na vida das crianças e jovens do projeto Batuk. A prática esportiva ajuda a estruturar o tempo e as atividades dos participantes, ensinando-lhes a importância da regularidade, da responsabilidade e do autocontrole. Esses aspectos são fundamentais para afastar os jovens de caminhos perigosos, como o tráfico de drogas, e direcioná-los para um futuro mais estável. “Então, há necessidade, o esporte traz disciplina, o esporte traz o equilíbrio para essas crianças”, afirma Belone.

A prática esportiva também fortalece a capacidade de defesa e autonomia, principalmente para as garotas do projeto. Elas desenvolvem as habilidades necessárias para defender a si mesma em situações desafiadoras. Essa capacidade de se proteger e agir por conta própria é uma extensão do empoderamento que o esporte proporciona, preparando-a para enfrentar desafios reais com confiança e competência.

O esporte, combinado com cursos profissionalizantes, desempenha um papel importante na preparação dos jovens para o mercado de trabalho. A formação esportiva e profissional ajuda os participantes a adquirirem habilidades práticas e comportamentais que são valorizadas no ramo ocupacional. O objetivo é oferecer aos jovens uma alternativa viável ao envolvimento com atividades ilícitas, proporcionando-lhes uma base sólida para carreiras legítimas e estáveis. “Então, aqui, no tatame, é o lugar da pura pedagogia”.

Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz, chamado “Meu canto também tem histórias”. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar ideias para matérias jornalísticas em seus próprios bairros, em Imperatriz, ou cidades de origem. Essa é a primeira publicação oficial e individual de todas, todos e todes.