Déborah Barbosa
Moradores de longa data comentam sobre suas experiências no bairro imperatrizense
Em meio à movimentada cidade de Imperatriz, no Maranhão, o bairro Boca da Mata é um lugar de memórias e histórias profundas. Apesar de simples, as vidas dos moradores guardam uma riqueza especial, marcada por experiências que resistem ao tempo. Cada esquina e cada casa reflete as tradições e os costumes dessas pessoas, que têm em comum um forte amor pelo local. Nesse espaço, onde o passado encontra o presente, o espírito de comunidade cresce e as histórias se unem, formando a identidade da Boca da Mata.
“Aqui é muito tranquilo”, relata Maria de Jesus, 88 anos, que vive no bairro há mais de duas décadas. Para ela, apesar do local ser visto por parte da população imperatrizense como violento, Boca da Mata é um lugar onde reina a paz e a comunidade é unida. “Em todos esses anos, dificilmente tive problemas”, afirma, com a serenidade de quem já viu muita coisa na vida. Maria, agora aposentada, dedicou grande parte de sua trajetória à costura. Hoje, convive tranquila, ao lado de suas filhas e de seus animais de estimação, que incluem cinco cachorros e um periquito estrela. Guarda um carinho especial pela sua pinscher: “Ela é minha cheirosinha”.
Além do amor pelos bichos, ela cultiva uma paixão pelo artesanato. Suas mãos, que antes eram ocupadas com linhas e agulhas de costura, agora se dedicam à criação de flores de tricô, bonecas e outras decorações feitas com materiais recicláveis, como tampas de garrafas PET. “Eu amo e acho muito lindo”, diz, alegremente. A casa de Maria é um reflexo de sua criatividade, repleta de suas obras de arte, que dão cor e vida ao ambiente. Mesmo aos 88 anos, ela é uma pessoa incrivelmente ativa. “Não consigo ficar parada um minuto sequer”, comenta, sorrindo.
Nascida na cidade de Codó, no interior do Maranhão, Maria é mãe de 19 filhos e considera seus familiares a sua maior bênção. “Eu amo a minha família”, diz, com a voz carregada de emoção. Assim que chegou em Imperatriz, encontrou no bairro Boca da Mata um refúgio, um lugar onde, ao longo dos anos, viveu muitas experiências boas, especialmente na igreja onde congrega. Contudo, passou por um dos momento mais difíceis de sua vida, a perda de um dos filhos, que se afogou no rio Tocantins. Mesmo assim, Maria se considera uma pessoa alegre e agradecida pela vida que tem.
Para Maria, o bairro é um bom lugar para se viver, embora infelizmente seja esquecido pelo poder público, que segundo a aposentada, aparece apenas em períodos de eleições, prometendo uma maior implementação de infraestrutura nas ruas, mas nunca acontece. Por ser idosa e ter alguns problemas de saúde, a falta de asfalto nas ruas a afeta. “Por causa da poeira tenho dificuldade pra respirar”, relata, visivelmente preocupada.
O aposentado José Alves, 71 anos, conta que viu surgir cada casa do bairro, acompanhando todas as transformações, porém as ruas continuam da mesma forma. Morador na região há 36 anos, José é uma das pessoas mais antigas do local e agora desfruta da sua aposentadoria após anos de trabalho como pedreiro. “Comecei a trabalhar com 13 anos”.
José informa que o nome é Boca da Mata porque, antigamente, havia poucas casas e muita vegetação ao redor. “Até hoje, muita gente pensa que o bairro é só mato”, comenta. Algumas pessoas queriam se candidatar a vereador e mudar o nome para algo mais moderno, mas ele acredita que isso não faria muita diferença. “Podem até mudar o nome, mas o Boca da Mata nunca vai sair da boca do povo”, conclui.
Do período em que foi pedreiro, ele recorda, com orgulho, de sua participação na construção de uma das igrejas mais conhecidas do bairro, a Igreja Nova Vida. “O primeiro buraco e toda ferragem foi eu que fiz”, relembra alegremente. Hoje, a igreja que ele ajudou a erguer já soma 22 anos de existência, sendo um marco na comunidade.
Origens do bairro
José explica que no início era um pouco difícil, pois o bairro não contava com os serviços de água e energia, experiência essa também vivida por Odete Pereira Rodrigues, 70 anos. Ela mora na Boca da Mata há 43 anos e comenta que no início a dificuldade era maior. “A gente lavava as roupas no rio porque não tinha água”, conta Odete, relembrando um tempo em que as casas eram poucas e feitas de taipa e todos os vizinhos se conheciam e se ajudavam.
Odete era dona de vários terrenos na época, mas foi vendendo ao longo dos anos. Ela também se recorda das lamparinas, usadas em cada lar como fonte de luz antes da chegada da eletricidade. Hoje, aposentada após anos de trabalho em serviços gerais, Odete vive com seu marido e um de seus filhos, que perdeu a visão devido à diabetes. Apesar dos desafios enfrentados, ela se considera feliz e em paz. Suas experiências são boas, embora perceba alguns acontecimentos envolvendo a criminalidade, o bairro para ela é tranquilo. “É só andar no caminho certo”, aconselha.
Ao longo dessas mais de quatro décadas, Odete não apenas construiu uma casa, mas uma verdadeira história de vida e família na Boca da Mata. Considerada por muitos como uma das moradoras mais antigas e respeitadas da região, ela foi testemunha das inúmeras transformações que o bairro sofreu. Mesmo diante das mudanças e adversidades, Odete sempre buscou viver com serenidade. “Criei meus sete filhos aqui nesse pedaço de chão”, diz ela, com um sorriso no rosto.
Esta matéria faz parte do projeto da disciplina de Redação Jornalística do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz, chamado “Meu canto também tem histórias”. Os alunos e alunas foram incentivados a procurar ideias para matérias jornalísticas em seus próprios bairros, em Imperatriz, ou cidades de origem. Essa é a primeira publicação oficial e individual de todas, todos e todes.