Repórteres: Stephany Apolinario e Laécio Rodrigues
Fotos: Luiz Gustavo e Michaell Maicon
A trajetória de João Marcos dos Santos como escritor começou cedo e é marcada por um profundo envolvimento com suas raízes e com a literatura. A decisão de se tornar escritor surgiu durante a quinta série do Ensino Fundamental, quando uma atividade escolar despertou sua paixão pela escrita. “A professora pediu para eu fazer um texto sobre uma ilustração no quadro. Escrevi o texto, gostei muito da experiência e achei interessante e diferente. Foi um verdadeiro despertar”, relembra o autor. Com apenas 13 anos, ele já havia escrito um livro mais longo, embora não tenha a intenção de publicá-lo. Esse primeiro projeto foi uma introdução precoce ao mundo da prosa e à criação literária.
João Marcos nasceu em 1997, em Imperatriz, Maranhão, e atualmente reside em João Lisboa, cidade vizinha. Formado em Jornalismo e atualmente mestrando em Comunicação Social pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), João é também membro fundador da Academia de Ciências, Letras e Artes de João Lisboa (ACLAJOL).
Sua carreira literária começou a ganhar destaque com o livro-reportagem “À Sombra da Gameleira: histórias e memórias da cidade de João Lisboa”, que lhe conferiu a premiação da Lei Aldir Blanc em 2021. Para ele, essa obra não foi apenas um projeto profissional, mas uma forma de preservar e celebrar as memórias de sua comunidade.
Além do sucesso com o livro-reportagem, o escritor se aventurou no campo da ficção. Participou de antologias como “Arrependa-se” (2019) e “Prenúncio do Medo: Morte” (2020), e organizou “A Maldição do Tesouro” (2021) e “Contos da Lua Cheia” (2023). Em 2022, lançou “O Círculo de Fogo”, o primeiro livro de uma trilogia.
Recentemente, João Marcos firmou uma parceria com a Casa Projetos Literários, que agencia e oferece consultoria literária, auxiliando autores no processo de publicação e divulgação de suas obras. Além disso, João está lançando seu novo livro, ‘Curacanga’, pela Editora Flyve, marcando uma transição significativa em sua carreira, que agora conta com o suporte de uma editora tradicional.”
Além de sua atuação como escritor, ele é um ativo produtor de conteúdo digital no Instagram, onde promove debates sobre literatura, destacando seus próprios livros e temas relevantes ao mundo literário. Seu amor pela leitura o levou a criar o projeto “Ler Transforma”, uma iniciativa que distribui livros em escolas públicas do Maranhão, com o objetivo de inspirar jovens leitores e fortalecer o hábito da leitura nas comunidades, reunindo os livros por meio de doações.
Nesta edição, vamos explorar os bastidores do lançamento de seu novo livro, “Curacanga”, e sua primeira participação na 27ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo. É uma obra de fantasia que mergulha nas lendas e no imaginário do Brasil do século passado. Escrito em apenas seis meses em 2022, o livro aborda temáticas regionais de forma única, misturando o real e o fantástico.
Imperatriz Notícias: O seu novo livro “Curacanga” aborda temas históricos e a fantasia. O que te inspirou a escrever sobre esse tema?
João Marcos: O livro nasceu enquanto eu escrevia meu outro livro, “A Sombra da Gameleira”, em 2020. Durante as entrevistas para esse livro, visitei Vavalândia, um lugar remoto no interior do Itinga, onde conheci o senhor Geraldo. Ele me contou três histórias que se passavam em João Lisboa, senti que aquelas histórias tinham um potencial para uma obra de ficção, então as guardei. Pesquisando, me deparei com essas histórias, e comecei a refletir sobre a riqueza da identidade cultural e do imaginário da minha região. Isso me fez perceber que nossa oralidade é rica em fantasia, gótico, horror e ficção científica. Até então, eu consumia muita literatura estrangeira, mas ao ver o potencial da nossa cultura, senti a necessidade de criar uma fantasia que refletisse o nosso folclore. Assim, “Curacanga” nasceu, inspirado tanto pelas histórias que ouvi quanto pela vontade de valorizar nossa cultura.
IN: Você falou na questão da pesquisa, qual foi o maior desafio que encontrou?
JM: A pesquisa para “A Sombra da Gameleira” foi um desafio específico, porque tinha uma questão jornalística, cruzando relatos e conferindo fatos. Já em “Curacanga”, o desafio foi diferente: integrar realidade e fantasia. A inspiração surgiu ao ler um livro chamado “Repressão e Resistência em imperatriz” do Adalberto Franklin e Valdizar Lima, sobre um trabalhador da rodovia Belém-Brasília que se perdeu na mata e foi encontrado meses depois, me levando a refletir sobre os impactos dessa rodovia no Maranhão, desde o progresso até a destruição cultural e ambiental. Isso motivou uma pesquisa profunda, que inclui jornais antigos, fotos, vídeos, e livros regionais, como “Enciclopédia de Imperatriz”[de Edmilson Sanches] e um livro meio confessional do José Bonfim [A fama e a verdade de José Bonfim – Livaldo Fregona].
IN: O livro se chama Curacanga, que tem uma conexão com o folclore e os mitos locais. O título reflete uma relação direta com o conteúdo do livro, explorando o mito em si, ou foi escolhido apenas para trazer uma atmosfera fantástica à nossa região?
JM: Eu estava querendo escrever algo regional, uma história de fantasia, mas não sabia exatamente como começar. Na minha pesquisa, me deparei com um vídeo no Youtube chamado Curacanga, feito pelo canal Futura, e pensei: “Mas como assim? O que é isso? Nunca vi”. Fui assistir, e quando vi, senti um arrepio, uma coisa, e falei: “É isso aqui, não sei o que é, mas é isso aqui”. A Curacanga é uma lenda de uma mulher que tem o poder de separar a cabeça do corpo às sextas-feiras, e a cabeça dela vira uma bola de fogo que assombra as pessoas na cidade. Então, no mesmo dia, fui para o computador e escrevi o prefácio de uma história sobre três homens que sequestraram essa mulher que sabem do poder dela. Dentro do meu livro, Curacanga não significa apenas essa mulher; ela está presente na obra, mas eu criei um significado a mais para esse nome.
IN: Você terminou o livro em seis meses e concluiu em 2022. Por que levou tanto tempo para publicá-lo?
JM: Escrevi “Curancanga” entre abril e setembro de 2022. Demorei para publicá-lo porque preferi não apressar o processo. Quis receber feedback dos meus amigos e uma avaliação profissional, então contratei os serviços da “Casa Projetos Literários”, o dono da agência me deu uma contrapartida muito positiva de que talvez se a gente trabalhasse juntos, o livro poderia sair por uma editora tradicional, então buscamos a Editora Flyve.
IN: Agora que você citou a Editora Flyve, percebemos uma mudança significativa na sua trajetória. Antes, você publicava seus livros de forma independente, enquanto agora está trabalhando com uma editora tradicional. Como você vê as principais diferenças entre esses dois processos?
JM: Sim, há uma diferença. No começo, foi uma mistura dos dois processos. Quando fechei contrato com a Flyve, já tinha a capa e a diagramação prontas, pois estava preparado para publicar de forma independente. Além disso, antes, recebia os livros com antecedência. Desta vez, só verei na Bienal, pois tudo foi muito corrido e não deu tempo de receber uma cópia. E agora, não dependo só da minha agenda. Há colaboração entre a editora, a agência e eu, mas com liberdade criativa. Então a experiência tem sido interessante e fluida.
IN: Como foi o processo que levou você até a Bienal?
JM: Certo, a agência enviou um book proposal, uma apresentação do livro, para a editora, e eles gostaram muito. Então, conversamos sobre o meu desejo de participar da Bienal e encontramos um momento ideal para me encaixar, mesmo com o prazo apertado. Se fosse um pouco mais tarde, não teria dado tempo.
IN: Como você está se sentindo ao participar da Bienal, um grande evento para autores?
JM: Tudo será uma grande surpresa, o que acontecer é o que realmente é para acontecer. Então estou bem tranquilo com relação a isso, vou aproveitar a viagem ao máximo, aproveitar a Bienal e conhecer outros lugares de São Paulo que ainda não conheço ainda.
IN: Você mencionou que a capa do livro já estava pronta antes de fechar com a editora. Eles sugeriram outras opções?
JM: Não sugeriram, eu já tinha me antecipado. Contratei um capista chamado Marcos Pallas, incrível o trabalho dele, tinha tudo acertado com ele. Enviei o briefing e ele me entregou aquela capa. Já aprovei de cara, porque tem muito a ver. Tem a coruja, que é um elemento muito forte também dentro da narrativa. Não vou dizer o que é exatamente, nem na sinopse eu falo, mas a coruja é um elemento muito forte e muito marcante dentro da cultura maranhense.
IN: Qual a reflexão que você espera que o leitor tenha ao ler o livro?
JM: Essa é uma pergunta difícil. Não busco uma interpretação única para meus livros. Minhas histórias surgem de uma ideia ou imagem e permitem várias leituras. Esse meu novo livro pode ser sobre progresso, questões agrárias, ou até a pobreza em São Paulo nos anos 1950. Embora eu use a realidade como base, o que importa é que cada leitor tenha a sua visão daquilo que ele está lendo, sabe?
IN: Como você está planejando o lançamento do seu livro “Curacanga”?
JM: O pré-lançamento do meu livro será em São Paulo, na Bienal, para gerar um “buzz” inicial, e planejo fazer o lançamento físico em João Lisboa em novembro. Ainda não tenho datas exatas. Já tive experiências anteriores com lançamentos, e sei que momentos como janeiro, fevereiro e início de março não são bons por razões comerciais. Além disso, pretendo lançar o livro em formato físico primeiro, seguido pelo lançamento como e-book no Kindle, mas só depois do físico. A distribuição será feita pela loja online da editora, e o livro físico também estará disponível na Amazon e em outras livrarias parceiras. Ainda não fechei parcerias com livrarias locais em Imperatriz, mas estou trabalhando nisso para facilitar o acesso ao livro.