Moradores da rua José de Alencar se lembram dos “apertos” da “Rua da Grota”

Texto: Lenícia Trindade

Imagem do Google Maps

“Moro aqui na rua José de Alencar tem uns 30 anos. Quando era a grota a gente tinha muita dificuldade, principalmente para mim. Eu morava em uma casinha de tábua e entrava água quando chovia”. O relato é de Maria de Jesus, moradora da rua José de Alencar, conhecida por muitos como “Rua da Grota”, no bairro Bom Sucesso, em Imperatriz.

A situação mudou em no ano de 2014, quando foi feito um projeto de saneamento e pavimentação pelo então prefeito Sebastião Madeira, com parceria do governo do Estado. Mas o que mudou de lá para cá na opinião dos moradores?

Maria Ricardim, de 36 anos, moradora da rua, lembra que a região é “uma perna de um riacho”. Ela se refere ao Capivara. “Então esse percurso que esse rio fazia aqui, era o que repartia a rua”. Os antigos moradores, principalmente os mais velhos, dizem que, antes, as pessoas lavavam roupa nesse riacho, quando o bairro ainda não era bem populoso. Com o tempo, o lugar passou a ganhar mais população, construções e casas. “Aonde o ser humano chega, acaba destruindo um pouco”, detalha.

A moradora Maria de Jesus explica que do outro lado da rua as casas quase não alagavam, porque é um local mais alto. Mas, no ponto em que as moradias eram mais baixas, quando ela acordava seus pés já pisavam na água. Tentava procurar a sandália, que boiava e não tinha como evitar que os móveis se perdessem, eles acabavam descartados. “Já joguei muitos móveis fora, eu fazia era chorar, você acredita?”, complementa a dona de casa, se lembrando do período das enchentes.

“A gente não saía daquele local porque era a casa da gente.  Se fosse morar em outra casa ia ter que pagar aluguel”, defende Maria de Jesus. A pessoa, ao deixar a sua própria residência para morar em outra casa, pensa primeiramente que vai ter que pagar aluguel, ou, do contrário, será despejada pelo proprietário, que já tem a casa própria, como argumenta. “Era a única rua que a gente tinha para morar, que era onde estava as casas da gente”, lamenta Maria de Jesus.

Rua José de Alencar, hoje asfaltada, enfrentava muitos problemas de saneamento básico

Ageu Antônio Pereira Dias, de 20 anos, também morador da rua José de Alencar, conta que quando se juntava para brincar com seus amigos, muita das vezes alguns caíam na “grota” ou se cortavam nas pontes improvisadas, que facilitavam a passagem dos cidadãos.

Além do mau cheiro, ainda havia o risco de transmissão de doenças. Ele mora justamente no lado em que, quando a “grota” enchia, a casa alagava toda. “Ficava ainda mais complicado para mim, a rua ficava intrafegável. Como nós era criança no tempo, corria o risco de afogamento e tudo”, relembra.

Maria Ricardim recorda os acidentes que os cidadãos enfrentavam ao atravessarem as pontes. “Antes se passava muito em umas tabuazinhas, umas pontezinhas que era colocado e aí nisso muita gente caia na grota e tudo, virava até história de brincadeira”.

“Rua fedorenta, não sei como esse povo aguentava morar aqui”, Maria de Jesus descreve o descaso das pessoas que moram em vias com melhores condições em relação a quem convivia com as dificuldades na Rua da Grota. “Só porque mora em uma rua melhor, acha que tem o direito de desfazer da gente da rua”, reclama.

“Quando chovia a gente não conseguia passar, a rua ficava toda alagada, ficava difícil nós ir para a escola”, conta Ageu.  Ele se lembra que geralmente a tempestade chegava da noite para o dia. Ao amanhecer, as crianças não conseguiam ir à escola, pois só no final da tarde o riacho diminuía seu volume. As casas ficavam cheias de lama, era preciso limpar e organizar tudo, além de tomar cuidado ao desligar os eletrodomésticos para evitar o risco de choque. “Eu mesmo já peguei um choque,  eu fui ligar a televisão e peguei um choque e pipocou a tomada”, ressalta.

Maria Ricardim relembra dos moradores que desacreditaram por anos, mas ao observar o desenvolvimento da obra, na parte de cima da rua, tiveram esperança. “Foi bem gratificante, pois aqui as casas não tinham valores, eram muito baratas. Aqui era só para quem não tinha onde morar mesmo que morava aqui. Hoje temos aí, a nossa avenida José de Alencar, que dá entrada para a feira do Bom Sucesso”, orgulha-se.

Transformação

Ageu acrescenta que a rua mudou muito. “Agora é trafegável, carro e moto passa aqui, a infraestrutura é boa. Muitas das vezes abre um buraco aqui ou ali, mas o prefeito vem e conserta”. A opinião dos moradores é unânime de que as condições melhoraram. “Facilitou a vida de muitos que moravam na rua de cima e tinham que passar pela Rua da Grota, que era para ir para suas escolas”, conclui.

Ele conta do dia em que um menino estava uniformizado para ir pra escola, pisou em uma tábua em falso e caiu dentro da grota, tendo que voltar para casa. “Aí isso complicou muito para ele, né? Porque podia perder prova e tudo”.

Maria de Jesus lembra de um tempo feliz, mesmo com as adversidades da “grota”. “Era feliz e não sabia, brincando. Colocava a corda ali no barquinho, ficava em cima daquelas pontes e gritava. E o barquinho descia na água”. Maria de Jesus fala também sobre a importância das crianças brincarem nas ruas. Antigamente ela observava que, mesmo existindo dificuldades pela falta de infraestrutura, os jovens se divertiam mais. Hoje, na sua opinião, a internet diminuiu esse costume. “Não tem aquela motivação de brincar, as crianças hoje em dia só querem estar no celular”, alega.

Maria Ricardim observa que a cidade está toda cheia de buracos, diferente da rua José de Alencar. O tempo passa e não se vê o asfalto desintegrando, o que indica um bom acabamento. “Acredito que foi de qualidade sim, lógico que com o tempo, tudo acaba, tudo tem um prazo de validade, mas até um certo momento tem sido de ótima qualidade”, defende.

Esta matéria faz parte do projeto “Meu canto também é notícia”, desenvolvido com os estudantes do 1º semestre do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz (MA). Eles e elas foram estimulados a procurar histórias no entorno onde vivem.