“A Prefeitura nunca me convidou para grafitar o viaduto, isso foi uma atitude que nós tomamos”: entrevista com o grafiteiro Deysive Bezerra da Costa

Repórteres: Ana Karla de Sousa Silva e Matheus Campos Sousa

Fotos: Ana Karla de Sousa Silva

Mais conhecido como Deyves Brown, Deysive Bezerra da Silva nasceu e foi criado na cidade de Imperatriz. Nascido no ano de 1987, entrou no grafite aos 21 anos de idade, há 10 anos quando ia para Teresina, capital do Piauí, e lá se deparou com o grafite, segundo ele isso o deixou “muito encantado”.

Autônomo, coordenador do projeto Casa Hip Hop e grafiteiro, Deyves “milita” pela cultura do Hip Hop. Como coordenador do projeto social Casa do Hip Hop, ele cuida de 360 crianças e adolescentes dos bairros Recanto Universitário, Vila Fiquene e bairros adjacentes por meio de atividades esportivas e culturais. O projeto tem por objetivo a valorização das expressões artísticas, além da valorização da cultura local.

Desenvolvendo atividades como grafite, poesias, pintura, canto, dança e dentre outras coisas, o projeto também realiza palestras sobre prevenção às drogas e exploração sexual infantil, além de reunir grafiteiros do seu projeto que realizam trabalhos de grafitagem nos principais pontos turísticos de Imperatriz.

Muitos imperatrizenses e outras pessoas que estão de passagem pela cidade de Imperatriz, ao passar pela rodovia BR-010, no perímetro urbano, pelo Viaduto da cidade, já se depararam inúmeras vezes com o grafite de Deyves e sua equipe de grafiteiros do projeto Casa Hip Hop. O grafite feito nas paredes do Viaduto estampam a história da cidade, suas origens e a preservação da natureza.

Nesta entrevista exclusiva que trata sobre o “grafite”, o grafiteiro Deyves Brown conta um pouco da sua história com os desenhos, seu projeto Casa do Hip Hop e sobre o sua arte feita no Viaduto.

 

Imperatriz Notícias: Para você, o que é o grafite?

Deysive Bezerra da Silva: Guerreiro, o grafite é uma forma de você falar através dos desenhos. Os primeiros grafites nasceram nos Estados Unidos, lá pela década de 70/80 e aí os gangsteres colocavam os grafites deles nos muros como avisos, né, sobre o que eles faziam, o que estava acontecendo dentro do bairro e tal, e aí, quando nasceu a cultura Hip Hop, foi engajado o grafite junto. E hoje o grafite é uma forma de você falar através dos desenhos, através dessas pinturas, sabe! O grafite é uma arte urbana na qual você deixa em cada desenho um significado.

IN: O grafite é geralmente associado ao vandalismo pela sociedade. Diante disso, o que você achou da atitude da Prefeitura de lhe convidar para grafitar o viaduto da cidade?

DZ: Cara, deixa eu te falar, a prefeitura nunca me convidou para grafitar o viaduto, isso foi uma atitude que nós tomamos, fomos nós que tomamos essa atitude. A gente via o viaduto, é um abandono, né? Um monumento de Imperatriz jogado, abandonado. Então, a gente com nossas mãos, nossos materiais… A única coisa que a gente pediu foi a licença para grafitar, e até isso eles tomaram da gente, é por isso que a gente deixou de terminar o grafite, porque a gente não se associou ao pessoal do grupo político deles, né. Estava dando tanto ibope pra gente, o nosso nome estava ficando tão conhecido, que eles queriam que a gente ficasse com eles, no grupo político deles. Mas isso tudo aí é mérito nosso, não tem nada de prefeitura, não.

IN: Você é coordenador de um projeto que atende cerca de 360 crianças e adolescentes onde ensina o grafite, rap e ensinamentos bíblicos como forma de tirar e prevenir que essas crianças e adolescentes não se envolvam no mundo do crime. Em que você acha que o grafite contribui na vida dessas pessoas?

DZ: Mano, é o seguinte. O grafite o que ele contribui na sociedade, principalmente para crianças e adolescentes, é que, além do grafite ser uma arte, ele é uma profissão. Uma profissão que dá dinheiro, uma profissão que quem trabalha nisso, trabalha como amor, sabe! E isso vai tirar muitos jovens das drogas, entendeu? Você vê o Cobra aí, um dos maiores grafiteiros do nosso Brasil, está nos Estados Unidos, está na Europa direto. Você ver aí WG, de Teresina, está na França, está na Europa, tá na América Latina. Então é o seguinte, o grafite vai contribuir tirando eles do caminho do mal, do caminho errado. Então, o poder público tem que entender que a cultura do Hip Hop é a que mais resgatas jovens no Brasil. O grafite é um resgate irmão.

IN: Você tem o Cobra e WG como referências? 

“. Inclusive, a gente tá numa campanha agora “Doe um muro para que seja grafitado”

DZ: Sim.

IN: Como surgiu a imagem grafitada no viaduto?

DZ: Ali mesmo, foi para conscientizar as pessoas sobre os cuidados com a natureza.

IN: Como o grafite apareceu na sua vida?

DZ: Apareceu de uma forma que pode me trazer liberdade, os primeiros grafites que vi foram em São Paulo, Piracicaba, e me deixaram com vontade de aprender a fazer.

IN: Como eram os grafites que você viu em São Paulo e porque eles te chamaram atenção?

DZ: Mano, os grafites de São Paulo, eram grafites que mostravam a realidade, mostrava um pouco do cotidiano das pessoas que ali residem, na favela. E aí comecei a me inspirar por ali, né, vendo grafites que incentivavam pessoas a estudar, grafites que contavam história. Tipo, o rosto de Martin Luther King do lado do rosto de Mandela, e assim por diante, sabe! Muito massa, então isso me inspirou a também a querer fazer o grafite.

IN: Você gostaria de ser reconhecido como grafiteiro ou como coordenador de um projeto que ajuda crianças e adolescentes?

DZ: Preferia ser reconhecido como um coordenador do projeto, pois isso eu envolvo todos os elementos do Hip Hop, inclusive o grafite.

IN: Mesmo com o problema com a prefeitura por causa de partidos políticos, vocês pretendem continuar o projeto e grafitar os lugares que estavam previsto, como a Ponte Dom Felipe Gregory e o complexo esportivo Barjonas Lobão?

DZ: Então, a ponte talvez sim por causa do Estado, né, que a gente quer pedir apoio do Estado pra que a gente possa dar continuidade aos nossos grafites. Em relação à prefeitura, a gente não quer mais nenhuma ligação com eles. O que a gente tá fazendo nesse momento na cidade, a gente tá conversando com alguns empresários, aonde a gente tá pedindo doação de tinta para que a gente possa grafitar alguns muros, né, somente muros abandonados ou muros de pessoas que queiram nos doar. Inclusive, a gente tá numa campanha agora “Doe um muro para que seja grafitado”, né. E é isso aí.

IN: Legal. Última pergunta. Se você pudesse grafitar algo que mostrasse a situação política do Brasil atualmente, qual seria o desenho e porquê?

DZ: Eu desenharia, irmão, um livro, sabe! E dentro desse livro eu deixaria tudo em branco. E as pessoas iriam me perguntar “Por que você fez um livro desse tamanho, um livro tão bonito e não ter nada dentro?” Então, eu ia mostrar para as pessoas, do que adiantou aqueles políticos que um dia estudaram, se formaram em alguma coisa. Aprenderam a ler, a somar, multiplicar. Aprenderam alguma coisa boa na escola, na faculdade, mas não põe em prática. Então, a educação deles não é nada, entendeu? Então, não há o que mostrar dentro do livro. Porque a situação atual no nosso Brasil é essa, corrupção. Desenharia o livro, e do lado eu desenharia os Irmãos Metralha roubando todas as letras que tinha dentro do livro, e mostrando que os Irmãos Metralha são a corrupção que está acabando com a nossa juventude, com a nossa infância, infância das nossas crianças, tirando o nosso sossego. Acabando com a esperança que um dia esperamos um Brasil melhor.

IN: Impactante. Tem mais alguma coisa que você queira dizer que não disse antes?

DZ: A única coisa que eu quero deixar irmão, é que, resumindo tudo o que a gente conversou, é que, hoje eu milito pelo Hip Hop, eu dou minha vida por essa cultura que, graças a ela eu não fui para o lado do crime, foi por causa dessa cultura que eu nunca coloquei um cigarro na minha boca, que eu não uso drogas. E é por causa dessa cultura que eu tenho passado pra muitos jovens, tanto dentro das cadeias quanto na rua, que há um caminho e esse caminho é Jesus. Só ele pode salvar, só ele pode resgatar. E o Hip Hop não é nada mais, nada menos que um complemento de tudo isso. O Hip Hop é uma cultura que resgata. Uma cultura que busca, que renova. E pra te dizer melhor, Deus é tudo na minha vida, o Hip Hop é tudo na minha vida, Ele me fez ser quem eu sou. E hoje eu devo muito ao Hip Hop. O Hip Hop me incentivou a querer estudar, a ser uma pessoa boa, a ajudar outras pessoas. O Hip Hop me fez uma pessoa, essa pessoa que eu sou, entendeu? E é isso, mano.