Vale o transporte?: Vida de passageiro, alegrias e tristezas

Texto e foto: Williana Costa

João Alves: passageiro constante

Fatores como o valor da passagem e a falta de condução própria tornam o transporte público um dos meios mais utilizados por brasileiros diariamente para se locomover nas pequenas cidades e grandes metrópoles. Nos ônibus e vans seguem “juntas e misturadas”, todas as raças, cores, crenças e classes sociais. Em Imperatriz, três empresas são responsáveis pelo transporte legal de passageiros: a Metropolitana, a Zanchettur e a Aparecida. Sendo que ainda existem os veículos de transporte alternativo, que iniciaram as suas atividades em 2017.

Todos os dias eu utilizo o ônibus da rota Imperatriz/João Lisboa, um dos mais procurados. Segundo Josué Lima, gerente operacional da empresa Zanchettur, detentora da concessão da linha, são transportados mais de 15 mil passageiros por mês. Também faço parte dessa estatística. Durante uma semana, me lancei na missão de verificar as diversas situações que ocorrem com os usuários nesse trajeto, seja nos ônibus ou nas vans.  E confesso que foram dias bastante intensos.

Embora com um leque de opções, o usuário ainda encontra dificuldades para utilizar o transporte público, seja ele alternativo ou não. Um dos principais problemas é o valor da passagem, que muitos usuários consideram abusivo. E ainda o fato de ter que ficar em pé durante a maior parte do trajeto, que às vezes chega a ser mais de uma hora, dependendo do trânsito. Nem todos os veículos possuem ar-condicionado. Porém, alguns passageiros informaram que o calor é o que menos importa, pois o principal interesse é de estar no destino no horário desejado.

Rotina                          

Iniciei as observações a partir da avenida Pedro Neiva de Santana, nas proximidades da Secretaria Municipal de Trânsito (Setran). O ônibus já estava bastante lotado, inclusive com muitos passageiros em pé. A maioria era de pessoas indo para o trabalho e também um percentual considerável de estudantes. Todos os assentos destinados aos idosos e homens e mulheres com deficiência estavam ocupados.

Ao adentrar no ônibus, de imediato um fato me chamou atenção: o motorista exerce também a função de cobrador. Ao ser questionada a empresa diz que isso não é problema e que os cobradores foram dispensados para reduzir os custos. Assegura, ainda, que os condutores são orientados a não cobrar e dirigir ao mesmo tempo. A carga horária de trabalho varia de seis a oito horas por dia, o que também contribui para que não ocorra o estresse, segundo informação oficial. Já os condutores não quiseram se pronunciar sobre o assunto.

De acordo com o gerente operacional, será implantado até o meio do ano em Imperatriz o sistema de bilhetagem, que consistirá na aquisição de um cartão recarregável em que o usuário irá colocar o valor desejável, inclusive em uma plataforma online. O cadastramento será gratuito e a intenção é que o motorista deixe de cuidar do recebimento da passagem. Mas a realidade atual é diferente. Muitos usuários reclamam sobre a medida da empresa, de fazer com que o motorista, além de dirigir, também cobre a passagem. Vários deles afirmam que já presenciaram momentos em que o condutor fica bastante estressado, principalmente em horários de pico.

O ônibus era climatizado, possuindo três tomadas no lado superior esquerdo, com distância entre quatro fileiras de poltrona cada. Além de sete travas de emergência, uma lixeira pequena fixada na última cadeira, próximo à porta de saída e quatro caixas de som na parte do teto. Extremamente limpo e conservado.

Solidariedade e descaso

Durante esses sete dias aconteceram diversas cenas. Em uma das paradas localizadas no centro da cidade, mais precisamente na esquina da avenida Dorgival Pinheiro de Sousa com a rua Ceará, um senhor estendeu a mão solicitando parada.  Antes de subir, estava colocando suas caixas e sacolas de compra de supermercado no piso do ônibus, e olha que não eram poucas. O homem fazia isso sozinho. Foi quando o motorista, ao perceber que não havia quem o ajudasse, saiu do volante e desceu para auxiliar o passageiro. Presenciei este mesmo motorista repetir o ato em outras paradas. Confesso que aquele gesto de gentileza me tocou, pois não o vi em nenhum dos outros dias em que utilizei o transporte. Em outro momento, também observei um senhor descer do ônibus com dificuldades. Ele fazia uso de muletas e afirmou que nunca recebeu apoio de nenhum funcionário da empresa para subir, passar na catraca ou desembarcar em seu destino com segurança.

O passageiro João Alves Bezerra, um senhor de 98 anos, nascido em 16 de janeiro de 1920,  afirma ter sido maltratado por alguns motoristas. Comenta que já chegou, inclusive, a pagar passagem para outro idoso que não tinha dinheiro e que havia sido convidado a descer do ônibus. “Eles não podem fazer isso com um idoso.” João Alves é um homem lúcido e andava sozinho com sua bolsa de ferramentas, que utiliza em seu trabalho de fabricar lâminas de aço. Disse ainda que, pra ele, tanto faz andar em um ônibus com ou sem ar-condicionado. O que ele deseja é ser bem tratado, respeitado.  “O frio aqui dentro é bom, lá fora tá calor. Mas se for pra me pisar prefiro ir pra minha viagem no mormaço.”

Já Maria de Lourdes, também idosa, contou que uma única vez ocorreu de entrar no ônibus e o assento que lhe é reservado por direito estava ocupado por uma pessoa jovem. Mas, imediatamente o motorista pediu para que a moça se retirasse e lhe cedesse o lugar. A senhora comenta que ficou feliz ao ver que seu direito foi respeitado.

Concorrência

A pessoa que estava ao seu lado, chamada Marlene Lima, autônoma, fez o seguinte questionamento: “Essa sua pesquisa vai contribuir em algo bom pra nós? Vai haver uma reportagem? O preço da passagem está muito caro, R$ 4. Eu preciso ir e vir todos os dias. Não tenho passe. Então são quase R$ 10 por dia. No fim do mês essa conta pesa no meu orçamento”.

No decorrer da semana, a maior parte das pessoas também reclamou sobre o mesmo assunto.  Muitos alegam que o valor cobrado é muito alto e que, por isso, acabam optando pelo transporte alternativo. Sabem que muitos são ilegais, porém cobram mais barato. A preferência não é pelo tipo de veículo, mas, sim, pelo valor cobrado na passagem.

As paradas onde o transporte mais demora a sair são as da rua Luís Domingues, setor Mercadinho e a do setor da antiga rodoviária. Ali, muitos pequenos comerciantes fazem as compras para abastecer seus estabelecimentos e as embarcam no coletivo. Além do fato de as pessoas comuns também fazerem suas compras em Imperatriz e levá-las no busão lotado, são os próprios passageiros que ajudam a organizar as mercadorias. São bastante unidos nesses momentos.

Fica complicado pra se movimentar com tantas caixas e sacolas ali dentro. Já na parada final de João Lisboa, o motorista para durante cerca de dez minutos para conferir o caixa, anotar a quilometragem, a numeração registrada pela catraca e o horário de chegada. Tudo em um pequeno bloco timbrado.

Nos transportes alternativos é bastante diferente. São vans pequenas que logo ficam lotadas e as pessoas viajam em pé e imprensadas, não existe apoio para se segurar. Às vezes ocorrem freadas bruscas e os passageiros praticamente se debruçam sobre os outros. A passagem é mais barata, porém o transporte é ilegal. Ocorrem fiscalizações constantemente, mas logo que a “poeira abaixa” a rotina continua. Os proprietários desse tipo de veículo relataram sofrer perseguição e provocação dos motoristas da empresa Zanchettur no momento em que estão trabalhando. São fechadas e ultrapassagens perigosas nas ruas e avenidas da cidade, uma disputa acirrada por passageiros.

Ao serem indagadas, as pessoas respondem que não tem preferência e pegam o que passar primeiro. Tudo depende da necessidade de chegar ao destino no horário pretendido.  E mesmo nessa penúria, as pessoas riem. O bom humor está sempre ali. As pessoas estão sempre se ajudando. Pois afinal de contas, tudo na vida é “passageiro”.